domingo, 26 de maio de 2013

Gestão Azul: 100 dias no comando da Gávea

Segue abaixo um resumo de cinco textos de Wálter Monteiro e Jorge Farah publicados no site Magia Rubro-Negra. Um excelente balanço reflexivo dos 100 primeiros dias da gestão Bandeira de Mello.


O Flamengo caminhava a uma decadência que poderia roubar-lhe o protagonismo absoluto de maior clube do país (...) O processo eleitoral de 2012 resultou em ampla mobilização pela modernização do comando do clube. Passados os primeiros 100 dias da presidência de Eduardo Bandeira de Mello, a Nação foi brindada com relatórios específicos das intervenções realizadas por cada uma das VPs do clube. Uma prática saudável e inédita, que merece demorados aplausos.

Há, decerto, muitas coisas boas no Novo Flamengo, mas nenhuma delas supera a ótima surpresa que o acaso nos reservou: a liderança do Presidente Eduardo Bandeira de Mello.

Ser presidente de um clube de futebol potencializa a exposição de seu ocupante de forma inigualável. Mas ser presidente do Flamengo é estar permanentemente na mira da curiosidade pública. Querem ver? Um bom indicador é o número de páginas indexadas pelo Google: Graça Foster, presidente da maior empresa brasileira (Petrobras) e há mais de 1 ano no cargo (e antes já havia sido presidente da BR Distribuidora e diretora da empresa), retorna pouco mais de 1 milhão de resultados, Aldemir Bendine comanda, desde 2009, uma empresa com um patrimônio de mais de R$ 60 bi, a 4ª marca mais valiosa do país (Banco do Brasil), ele só é citado em 50 mil páginas na Internet; Fernando Haddad, prefeito de SP e ex-ministro da Educação , é citado em 963 mil páginas; Mario Gobbi, que volta e meia vai aos jornais dizer que seu clube é o mais valioso do Brasil (Corinthians) e com mais curtidores no Facebook, mais visualizações no You Tube e mais influência nas agências de publicidade, desde fevereiro de 2012 no cargo, retorna 1,45 milhão de resultados, incluindo os dos tempos em que era diretor de futebol. Pois Bandeira de Mello, com apenas 100 dias de gestão e um ilustre desconhecido até novembro passado, já retorna 1,62 milhão de resultados. Em se tratando de gente no exercício de suas funções, o Google registra poucas pessoas à frente de EBM, como a Presidenta Dilma Roussef e o presidente do Congresso, Renan Calheiros (sim, Joaquim Barbosa, mesmo com toda a fama do Mensalão, está atrás). Ele é um dos brasileiros mais vigiados do país e o que tem a maior relação entre menção em artigos x tempo no cargo.

Tudo isso deveria mexer com a cabeça do sujeito. É natural que a pessoa perca o eixo, fale mais que devia, se deslumbre com os holofotes, goste de aparecer. Sempre sereno, sempre equilibrado. Não fez uma promessa. Não disse uma bravata. Não foi arrogante, prepotente, belicoso. Realmente, parece viver em um mundo totalmente estranho ao que se vê com habitualidade no futebol.

A melhor demonstração pública da mudança de atitude no Departamento de Futebol vem do relatório de 100 dias apresentado por sua vice-presidência: sem rodeios, Wallim Vasconcellos admite que o desempenho recente do time foi “pífio e inaceitável”, prometendo que tomará medidas para que isso não volte a acontecer. O comportamento padrão do dirigente em tempos de insucesso é procurar bodes expiatórios que possam ser acusados pelo fracasso – como antecessores no cargo, arbitragem, gramado e afins. A sinceridade de Wallim sinaliza que os tempos realmente são outros. Aprender com os erros é a melhor forma de evoluir em busca de um êxito perene.

Dentre outros feitos, uma medida decisiva para o futuro do Flamengo: a montagem de uma área de acompanhamento de atletas e desempenho de adversários, a cargo de Rafael Vieira, que veio da CBF (e antes tinha passado por Corinthians e Grêmio, sempre acompanhando Mano Menezes). A partir de uma extensa base de dados digital, com informações sobre atletas do mundo inteiro, a decisão de contratar um jogador tende a ser mais “científica”. Em paralelo, o setor ainda municia a comissão técnica com informações sobre padrões de comportamento dos times adversários, para auxiliar no desenho tático de cada partida.

A parte mais crítica desses 100 dias tem a ver com a montagem do elenco. De um modo geral, a análise padrão tende a creditar o mau desempenho do time na 2ª metade do campeonato carioca a um esforço de contenção de despesas, que impediria a contratação de estrelas. Mas o Flamengo projetou um orçamento para o seu departamento de futebol de R$ 97 milhões – grosso modo, pouco mais de R$ 8 milhões por mês. Esse orçamento posiciona o time entre as 10 maiores folhas de pagamento do país.

Noves fora os dissabores recentes, o que realmente anima a torcida é a disposição dos novos comandantes em acertar e de não colocar suas vaidades e interesses pessoais acima das demandas do clube. A confiança da torcida de que tudo vai dar certo é quase irrestrita e isso ajuda bastante.

A área financeira talvez seja hoje a mais popular do clube. O descaso acumulado por sucessivas más-administrações se reflete essencialmente nessa área e muitos dos executivos que formam a nova diretoria são oriundos, não por acaso, de atividades ligadas ao mundo das finanças. A função básica de um administrador financeiro é a de analisar e garantir a solvência da instituição. Não foi à toa, que Rodrigo Tostes e sua equipe começaram o relato dos seus 100 dias à frente do Flamengo abordando a gestão do fluxo de caixa, que necessita de um controle eficaz. Não é algo simples. Apenas 15% do orçamento estariam livres, ou seja, 1,25% para cada mês para cumprir todos os compromissos do clube. Em uma situação assim ou se fecha as portas ou se arregaça as mangas e parte para negociar com credores privados e verificar o que precisa ser feito em relação às dívidas vencidas com o governo. É preciso priorizar pagamentos, mas as penhoras que estavam acontecendo faziam com que essa importante decisão fosse tomada pelo Poder Judiciário. Além do governo, seria preciso equacionar prazos das demais dívidas, enquadrando-os conforme o fluxo de caixa do clube. Também não é fácil, mas com credores privados é possível negociar. Conforme relatório, R$ 45 milhões foram renegociados com bancos. Segundo auditoria da Ernst & Young, a dívida está em R$ 750 milhões.

Para o futuro, esperamos que sejam criadas regras rígidas (de preferência por meio de modificação estatutária) que possam garantir o equilíbrio financeiro-orçamentário e frear impulsividade de dirigentes sem compromissos com a solvência financeira da instituição: fixação de uma meta de superávit primário e de um limite percentual da receita para gastos com folha de pagamento, implantação de mecanismos de controle e de alertas para desequilíbrios orçamentário, prestação de contas regular, periódica, transparente e amplamente divulgada no site do clube, e, por fim, proibição de obter empréstimos de longo prazo, incluindo antecipações de receita de forma direta ou indireta, para pagamento de despesas correntes.

Os 100 dias da nova equipe de finanças foram bastante promissores, com decisões difíceis sendo tomadas, cujos resultados poderão servir de alicerce para um clube financeiramente reestruturado, que poderá maximizar a satisfação de sócios e torcedores, fazendo do Flamengo uma instituição séria, sanada e com foco nos seus objetivos.

O maior salto dado pelo Flamengo nesses 100 dias vem da área de marketing, embora essa percepção não seja compartilhada por parte expressiva dos analistas, principalmente entre aqueles que olham a VP de Marketing como um vendedor de espaços publicitários, cuja medida do sucesso ou fracasso estaria na atração de patrocinadores. O Flamengo andou mal em variados setores na última gestão, mas nenhum deles tinha um grau de precariedade semelhante ao marketing, que falhou em todas as suas responsabilidades. Era natural, portanto, esperar uma mudança brusca em pouco tempo, como de fato ocorreu.

Há que se reconhecer que os ventos andam soprando a favor. O Flamengo poderia ter assinado o contrato com a Adidas no ano passado, mas em sábia decisão os conselheiros do clube evitaram que o polpudo sinal pago pela fornecedora fosse usado da forma então corriqueira, como contratar estrelas cadentes.

Em paralelo, a Caixa Econômica Federal tomou a decisão estratégica de ser o maior patrocinador do futebol brasileiro, mas o petrocínio ao Flamengo só se tornou possível depois da regularização fiscal (obtenção da Certidão Negativa de Débitos).

Independente desses agentes externos, o marketing do clube foi decisivo na elaboração de um plano de relacionamento – Nação Rubro-Negra – que pode representar uma geração de receitas constantes. A resposta dada pela torcida foi magnífica e em menos de 1 mês o clube já tinha associado ao Nação Rubro-Negra mais do que em todo o resto de sua história no seu quadro social convencional. A partir da base de dados do Nação Rubro-Negra, aliada a outra (que se espera maior), do Cadastro Rubro-Negro, iniciativa lançada pouco antes, a VP de Marketing tem a possibilidade de realizar intervenções específicas para nichos muito particulares de torcedores.

A área de Esportes Olímpicos chamou atenção da torcida e da mídia logo no início da gestão. Não por conquistas, mas por dispensas de atletas renomados (natação, ginástica artística e judô). Diante da grave crise financeira pela qual passa o clube, a decisão foi tomada sob a alegação de não mais desviar dinheiro do futebol. O caminho escolhido foi o de dar um passo atrás, para buscar o impulso e poder dar um salto adiante com sustentabilidade. Trouxeram um executivo com um histórico de sucesso (Marcelo Vido) e ainda criaram uma estrutura de marketing para planejar ações somente para os olímpicos, o que é essencial se formos analisar cada modalidade como um centro de custo autônomo, que precisará ser auto sustentável. A promessa é de dias melhores a partir da reestruturação que deverá perdurar ao longo deste ano. Assim, nestes primeiros 100 dias nossa única certeza é a de que um novo modelo de gestão de Esportes Olímpicos está nascendo.

A direção, claro, precisa evoluir, sobretudo aprendendo a lidar com a característica multifacetada da Nação, compreendendo que somos, antes de mais nada, um clube com sólida identificação popular, onde medidas com um tom elitizante precisam ser pensadas de forma a avaliar o impacto com os torcedores – não é razoável aumentar os ingressos para R$ 80,00 e logo em seguida declarar que eles ficarão ainda mais caros.

Um clube cidadão, financeiramente sustentável, resgatando sua imagem, atraindo novos contribuintes. Só falta voltar a ser vencedor. Esse dia chegará.




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