sexta-feira, 27 de março de 2015

Laprovittola diz que talvez ainda não seja a hora de ir à Europa

Em 24 de março, Nico Laprovittola deu a entrevista abaixo para o jornalista argentino Francisco Acuña, do site "Gente de Basquet" (http://www.gentedebasquet.com.ar/mano-a-mano-con-nico-laprovittola/).

Já estávamos perto do horário combinado, num sofisticado shopping do Leblon, um dos balneários mais famosos da “Cidade Maravilhosa” para encontrar com Nicolás Laprovittola. O Nico, como é conhecido pelos fãs brasileiros do Flamengo, equipe que defende atualmente e que leva consigo nada mais nada menos que o título de Campeão Mundial de Clubes da FIBA, por ter vencido ao Maccabi, de Israel. Ele então vem chegando ao longe com um visual relaxado e informal, é possível notar-lhe a tranquilidade. Eis nossa entrevista:

Nico, desde que chegou aqui, o que o Rio de Janeiro te dá diferente de Buenos Aires?
Desde o primeiro dia eu quis vir para o Flamengo. Minha ideia ao vir ao Brasil era jogar no Flamengo, não queria vir para nenhum outro clube que não fosse este. Me chamava atenção o Rio de Janeiro como cidade, mesmo que conhecesse pouco ao país. Desde que cheguei, notei que a cidade tem um movimento constante, igual a Buenos Aires. Aqui tenho a tranquilidade de poder dar uma escapada à praia em tempos livres. Fico muito relaxado e me meter no mar, sair e o calor no ano todo, são coisas que te dão força. É uma cidade ótima para viver e tento aproveitar e desfrutar. Como não tenho carro, caminho bastante, sobretudo pelo Leblon, o bairro onde vivo. Estou muito cômodo. É uma cidade fascinante. Cada um que vem me visitar leva essa impressão, e a proximidade à Argentina facilita isso.

Você se sente mais livre jogando aqui?
Quando cheguei, houve lesões de alguns companheiros e as circunstâncias me levaram a tomar um papal de maior protagonismo. Fiquei meio dono do time e, apesar das lesões, as coisas ficaram bem. Eu estava num bom momento e me sentia bem. Depois, em janeiro (de 2014), quando voltaram todos, o time teve um crescimento enorme, com cada um cumprindo seu papel de uma forma clara, e assim podemos conseguir muitas coisas (Campeão da Liga Brasileira, da Liga das Américas e do Mundial).

Foi importante absorver bem essa pressão de ter uma liderança rápido assim que chegou. Te ajudou a crescer…
Era um desafio a mais, para dizer “vou jogar bem, vou colocar mais energia”. O Flamengo é um bom lugar para trabalhar e esta é minha primeira saída ao exterior. Queria passar uma boa imagem para a Argentina, para que vissem o que eu estava fazendo no exterior. Muitas vezes o que acontece aqui não tem muita repercussão na Argentina. Toda a repercussão que teve os títulos que conquistamos me motivou muito mais.

O Flamengo te fez mais versátil?
O Flamengo me ajudou muito. Me fez conhecer um outro basquete, talvez mais livre, talvez mais desorganizado ou menos tático. Mas é mais físico, com jogadores altos e fortes. Jogadores com outro porte físico. E neste sentido, a liga está bem e vai melhorando ano a ano o lado tático. Com equipes que jogam mais ordenadas que outras, ou equipes que jogam mais em transição que outras. Nós jogamos muito em transição, algo que no Lanús não se fazia, porque era um tipo de jogo mais parado e ordenado, onde cada um buscava o melhor arremesso. Aqui é mais vertiginoso. Agarrei o gosto pelo estilo, me senti cômodo com este ritmo, e tinha que aproveitá-lo. Temos um elenco grande, com boa rotação, que nos permite jogar num ritmo forte durante todo o jogo.

De cara veio o Mundial. Você esperava ser chamado? Trabalhava para isto?
Com certeza. Eu trabalhava para isto. Eu queria voltar à seleção e estar no Mundial. Tinha estado no Pré-Mundial, em Caracas. Queria fazer parte da equipe e tive que trabalhar e render muito para ter minha oportunidade, e quando um a vê, tenta agarrá-la. É dar um passo adiante e demonstrar que pode estar na seleção. Este é um momento em que qualquer um quer estar presente. A seleção é algo que para todos é especial.

Vamos passar ao Mundial. Depois de lutar por seu lugar, como é chegar num vestiário com jogadores que ganharam tudo? Imagino haver camaradagem com os mais jovens…
A verdade é que é um grupo fantástico. São pessoas muito simples, muito abertos e receptivos o tempo todo. Eles nos ajudaram a nos incorporar e somar para o grupo. Nisto são especialistas. Do nosso lado, dos mais jovens, tínhamos que deixar estas diferenças de lado e sermos iguais a eles. Há um capitão, há papéis bem definidos dentro da equipe, tínhamos que estar em igualdade de condições e estar 100% o tempo todo. Obviamente não se pode competir com um Prigioni em se dar o exemplo. Mas eu quero seu lugar e tenho que jogar contra ele em 100%. Para mim é uma grande motivação enfrentá-lo, mas não creio que ele necessite ainda alguém para motivá-lo. Se nós chegássemos "apequenados", ninguém poderia tem se destacado em nenhum jogo. Aí depende do caráter de cada jogador. Todos quisemos nossos lugares e os conquistamos dentro de quadra, e provamos a nós mesmos e aos companheiros que podíamos ter este lugar.

Eles necessitam se apoiar em vocês para seguir sendo importantes e competitivos, para continuar jogando e ganhando.
Assim se forma uma equipe vitoriosa, com jogadores com espírito vencedor e com um ambiente de trabalho onde todos dão tudo pela equipe, sem se importar com os nomes. Os 12 queríamos o melhor. E eles nos quiseram meter isto na cabeça, porque acreditavam nisto, e isto os levou a ganhar medalhas e a demonstrar como se trabalha, qual é a receita.

Qual lembrança ficará de sua estréia contra as Filipinas?
Lembro que foi um jogo estranho. Eu não tinha jogado as duas partidas anteriores contra Croácia e Porto Rico. Passei de um tempo de quadra de zero minutos para 30 minutos, e aproveitei minha oportunidade. Foi um jogo meio travado, mas soubemos reverter e vencer. As Filipinas vinham tendo uma boa efetividade. Eram jovens e tinham um jogo diferente mas que lhes era cômodo. Aí tivemos que começar a jogar como queríamos e não nos deixar levar pelo jogo deles. Desfrutei muito ter jogado ao lado do Pablo (Prigioni). Tinha muita vontade de entrar e ajudar. Aos poucos fui me soltando. O melhor de tudo foi que ganhamos. Isto me fez poder desfrutá-lo mais.

Jogar com jogadores deste calibre dá outro tipo de perspectiva, não?
É jogar com seus ídolos, com aqueles do poster. Scola é o ídolo de qualquer jogador de basquete argentino, o que o Chapu te contagia é incrível, Prigioni é um dos melhores armadores da história do basquete argentino. Também poder estar jogando com o Walter (Herrmann) aqui no Flamengo é lindo. Eu o vi ganhar a medalha de ouro e agora o tenho no vestiário ao meu lado, contando-me piadas. São coisas da minha carreira que vou desfrutando. Tenho 25 anos e me resta ainda um pouco mais.

Como você vê a escolha de Sérgio Hernández como técnico da Argentina? Temos uma parada difícil no México.
Vai ser complicado. Teremos que trabalhar muito para ganhar esta classificação. Com o Ovelha não falei muito ainda. Trabalhei com ele na pré-seleção de Londres, e o conheço de enfrentá-lo contra Peñarol. Me parece ser um treinador extraordinário, com muita experiência e a CABB viu que precisávamos disto na hora de uma parada difícil como a do México. Temos que confiar no seu trabalho e tentar fazer o melhor. Demonstrar que queremos voltar a estar no grupo. Não vejo a hora de voltar a treinar com a seleção, porque são momentos que desfruto. Sempre me chamou atenção seus times, tanto Peñarol como a seleção. Tenho vontade de trabalhar com ele.

Tanto ele como o Lamas são treinadores que tem algo de docentes no que fazem.
Transmitem coisas, sim. São os melhores treinadores da Argentina e ganharam um monte de coisas. Os dois têm boa relação, trabalharam juntos e isto é bom para poder seguir a dinâmica de trabalho e a mesma linha filosófica.

O que significou para você os prêmios recebidos? Te motivam mais ou é indiferente? (Foi eleito melhor armador da Liga Brasileira 2013-14, fazendo parte do quinteto ideal)
Estar no “Jogo das Estrelas” não me chama tanto atenção. O que me interessa mais é a Liga das Américas, ou vencer a Bauru e Limeira aqui no Brasil. Óbvio que gosto de receber elogios ou prêmios, mas eu tento jogar para meu time da melhor maneira e ajudar em tudo que possa. Depois o resto vem sozinho. Não ficou louco por ser MVP. Acontecerá se tiver que acontecer.

Mas se mais de 60% dos treinadores, capitães e jornalistas te escolhem, você deve se sentir observado.
Se me olham é porque terei mais trabalho ano que vem (risos). Fico feliz, faz eu me sentir bem. Sinto que me respeitam e me tratam bem. É mais o que sinto do que o prêmio em si ou o destaque individual.

E as pessoas te fazem se sentir uma referência, um ídolo, um jogador querido? Vi muitas camisetas tuas na rua.
A torcida do Flamengo é bastante louca pelo clube e o basquete passa por um bom momento, a tal ponto que o dizem “Orgulho da Nação”. O basquete é muito querido aqui e se vê na rua, ainda que muitas vezes não pronunciem corretamente meu sobrenome (risos). As pessoas aqui me adotaram muito. O ano passado tive um momento de indecisão com o tema da renovação e houve um movimento nas redes sociais para que eu ficasse. Foi algo lindo e um gesto que me chamou muito a atenção. Só levava um ano aqui e as pessoas me fizeram me sentir muito querido. Não creio ser ídolo, mas sim querido. Tive ofertas, mas queria viver o que vinha: o jogo contra o Maccabi, a excursão à NBA, etc.

Como foi esta experiência na excursão à NBA?
Era uma pré-temporada NBA para nós. Chegamos a Phoenix muito agressivos. Vínhamos de ser campeões do mundo e queríamos jogar com este nível. Fizemos uma boa partida, até que no último quarto eles aceleraram e nos tiraram uma diferença. Creio que fizemos coisas muito boas nos três jogos. Talvez nossa maior dificuldade foi contra o Memphis, uma equipe que logo arrancou como primeiro lugar da Conferência Oeste. Foi muito positiva toda a excursão. Ver os ginásios, os vestiários, a iluminação, etc. Foi uma linda experiência. Enfrentar a Marc Gasol, Carter, Dragic, Bledsoe, Vucevic, foi uma experiência ótima, que creio que nos marcou a todos que não conhecíamos este mundo de perto. Hoje vejo de longe mas um sempre sonha. Há uma diferença enorme entre este basquete e o nosso.

Então você se sente mais perto, esportivamente falando, da Europa?
É algo que me tenta. É algo que sempre quis. É o próximo passo que tenho que dar para poder seguir crescendo. Mas creio que ainda me faltam coisas e ainda tenho muito a melhorar. Ver a Prigioni e a Manu Ginóbili, que seguem melhorando aos 30 e tanto. Qualquer jogador argentino sabe que são o exemplo de todos nós e cada vez jogam melhor. É algo que tenho vontade de fazer. Tomara que ocorra. Nunca se sabe. Por sorte, aqui no Rio encontrei um lugar muito bom e estou tranquilo, mas a Europa é um desafio que quero ter, destacar-me e jogar uma Euroliga. Mas agora tem sido um momento maravilhoso no Flamengo e por hora não quero pensar em outra coisa.

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