Aquele dia teria sido o primeiro e único na história do futebol mundial no qual o time venceria por 5 a 0 e sua torcida teria saído arrasada, destruída, destroçada, do estádio. Voltaria para casa praticamente sob um luto daqueles que mordem as entranhas. Porém ...
"Quarenta dias de sonho, iniciados em 8 de novembro de 1981, com uma goleada de 6 a 0 no Botafogo, na qual o Flamengo vingava-se, definitivamente, da goleada sofrida em 15 de novembro de 1972. E com o mesmo placar. Por nove anos, em todos os clássicos entre Flamengo e Botafogo, lá estava pendurada, no lado destinado aos botafoguenses, uma faixa em alusão àqueles 6 a 0. Era um trauma... Quando o Mengo fez 5 a 0, se o sexto não tivesse saído, todos os rubro-negros, naquele dia, iriam para casa tristes. A torcida berrava “Queremos 6!” E foi dos pés de Andrade, o camisa 6 rubro-negro, que partiu o chute que estufou a rede a cinco minutos do fim do jogo. Seis!!!!!! O fantasma estava exorcizado!" (A NAÇÃO, pg. 131)
Ficha Técnica
08/11/1981 - Flamengo 6 x 0 Botafogo
Local: Maracanã, Rio de Janeiro (Público: 69.051 pagantes)
Gols: Nunes (7'1T), Zico (27'1T), Lico (33'1T), Adílio (40'1T), Zico (30'2T) e Andrade (42'2T)
Fla: Raul, Leandro, Figueiredo, Mozer e Júnior; Andrade, Adílio e Zico; Tita, Nunes e Lico.
Téc: Paulo César Carpegiani
Botafogo: Paulo Sérgio, Perivaldo, Gaúcho, Osvaldo e Jorge Luís; Rocha, Ademir Lobo e Mendonça; Édson Carpegiani (Jairzinho), Mirandinha e Ziza.
Téc: Paulinho de Almeida
A História do Jogo
Aquele Flamengo x Botafogo de 1981 foi uma forra histórica, que valeu e foi comemorado como se houvesse sido um título. Só os rubro-negros que passaram anos a fio aturando aquela pequena e desengonçada faixa exibida pela torcida do Botafogo - "6 x 0" - em todos os jogos contra o Flamengo, têm a mais plena consciência do que representou aquela goleada, a forra de uma igual sofrida nove anos antes materializada numa tarde cinzenta de domingo, 8 de novembro de 1981.
O time de General Severiano havia goleado por 6 a 0 em 15 de novembro de 1972, em jogo válido pelo Campeonato Brasileiro daquele ano, num resultado bastante surpreendente, porque os times eram tecnicamente bem equivalentes. Mas aconteceu. Daí em diante, entrava ano, saía ano, e lá estava a faixinha, esfarrapada nas pontas, com seus números meio tortos: 6x0. Depois acompanhada de uma outra, com os dizeres: "Nós gostamos de Vo6!". Aquilo doía na alma flamenguista.
O Flamengo, na prática, teve duas chances de devolver o placar. A primeira, em 19 de julho de 1975, quando fez 3 a 0 em 13 minutos e começou a diminuir o ritmo, levando a torcida ao desespero. Nem o quarto gol, no finzinho do 2º tempo, foi capaz de evitar os protestos contra os jogadores. Apesar da goleada, os rubro-negros não ficaram satisfeitos. A segunda chance surgiu em 18 de março de 1979, quando o Flamengo meteu 3 a 0 em 40 minutos e voltou para o segundo tempo apenas fazendo o tempo passar. A torcida rubro-negra, maioria esmagadora entre os 128.106 pagantes, mais uma vez deixou o Maracanã frustrada, pois gritou diversas vezes "queremos seis!", mas não foi atendida.
No dia 8 de novembro de 1981, o público era menor, quase a metade: 69.051. Chovia no Rio desde o sábado e o torcedor guardava o seu dinheiro para o primeiro jogo da decisão da Libertadores, previsto para cinco dias depois contra o Cobreloa.
Logo aos sete minutos, Nunes recebeu cruzamento pela direita de Adílio e na pequena área fuzilou para abrir o placar: Flamengo 1 a 0. No minuto 27, Adílio entrou pela área, enfileirou a defesa alvi-negra e passou para Zico ampliar o marcador: Flamengo 2 a 0. Aos 33, um gol de trabalho coletivo da equipe do Flamengo. Zico acionou Júnior pela esquerda, que devolveu para o Galinho de Quintino. Ele tocou na direção de Nunes, que fez o pivô para Lico ampliar para 3 a 0. Ainda na primeira etapa, saiu o quarto gol, marcado por Adílio. Zico cobrou falta e Paulo Sérgio defendeu parcialmente, só que o camisa 8 desviou de cabeça para o fundo da rede. A massa já não se continha mais e urrava: "Queremos seis! Queremos seis! Queremos seis!". Era ali, naquele dia, ou nunca mais!
Com o placar em 4 a 0, a esperança de uma goleada estava cristalina para a torcida do Flamengo e o medo, o pânico, tomava conta dos botafoguenses. O técnico Paulinho de Almeida resolveu colocar Jairzinho em campo, um dos carrascos dos 6 a 0 a favor do Botafogo em 1972. Jairzinho havia voltado ao Botafogo, já veterano, aos 37 anos de idade. Ao entrar em campo, naquele segundo tempo da partida de 81, acabou se tornando um símbolo da forra absolutamente formidável e inesquecível para todos os que passaram nove anos seguidos aturando a faixinha presa na grade do outro lado da arquibancada do Maracanã.
No segundo tempo, o Botafogo estava bem fechado, obviamente tentando dificultar um placar ainda mais elástico como queriam os flamenguistas. A missão de segurar o jogo estava sendo bem cumprida até os 30 minutos. A apreensão já tomava conta de todos os rubro-negros àquela altura do jogo. Então Adílio invadiu a área pela esquerda e foi derrubado por Rocha. Pênalti marcado! Zico cobrou e marcou o quinto gol rubro-negro.
A partir daquele momento o Maracanã entrou em êxtase. Ainda havia um bom tempo para que fosse marcado o gol que faltava. O coro das arquibancadas recomeçou - uníssono, forte e cada vez mais exigente -. Era ali ou nunca. Ninguém ficaria satisfeito com um 5 a 0, isto já estava claríssimo! Tinha que ser de seis! Era uma oportunidade que provavelmente jamais se repetiria. Ainda mais pela força daquele Flamengo, que ainda naquele ano de 1981, num intervalo do calendário, havia ido à Itália disputar um torneio no qual meteu 5 a 1 no Avelino e 5 a 0 no Napoli, no Estádio San Paolo lotado. Aquele time que ainda mostraria o melhor que estava por vir: num espaço de 21 dias, conquistou a Copa Libertadores da América, em 23 de novembro, o Estadual sobre o Vasco, em 6 de dezembro, e o Mundial Interclubes sobre o Liverpool, em 13 de dezembro.
O time rubro-negro, inflamado pelos gritos das arquibancadas, foi para a frente. Vários craques daquele esquadrão formidável tinham sido criados na Gávea, e sentiam o desejo de vingança como torcedores rubro-negros, também queriam a redenção! A pressão se tornou insuportável!
O placar mostrava 5 a 0 para o Flamengo e o Maracanã todo estava ansioso. E esta história teve seu capítulo final escrito curiosamente pelo jogador do Flamengo que usava a camisa 6. Aos 42 minutos, a zaga rebateu, e Andrade, que vinha na corrida, chutou forte, de primeira, sem chance para Paulo Sérgio, fuzilando a meta para fazer o sexto gol rubro-negro! Seis a zero! Sem choro nem vela!
As piadas em torno do jogo de 1972 e a famosa faixa nunca mais seriam exibidas, feitas e comemoradas. A alma flamenguista estava lavada e o placar que doía na mente e no sentimento rubro-negro estava devolvido de forma justa, sem acréscimos! Assim como não podia ter ficado em cinco, não podia ser feito o sétimo, muito menos ter sofrido gol. Todos os rubro-negros queriam a forra do 6 a 0. Ela aconteceu, e valeu como um título!
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