Jogos Inesquecíveis: 27/07/2011 - Flamengo 5 x 4 Santos
Contra o Santos de Neymar, Paulo Henrique Ganso e Elano, então Campeão da Taça Libertadores da América, o Flamengo fez um jogo heróico na Vila Belmiro. Com 25 minutos do primeiro tempo, os santistas venciam por 3 a 0. Ronaldinho Gaúcho e Thiago Neves descontaram, Elano perdeu um pênalti e o Flamengo empatou com Deivid. Só no primeiro tempo, um histórico 3 a 3, com direito a um golaço antológico de Neymar.
Renato Abreu, Deivid, Ronaldinho Gaúcho e Thiago Neves
Foi a maior virada já conseguida pelo Flamengo na história! Um jogo épico que teve de tudo: roteiro inusitado, gol inacreditavelmente perdido, embaixadinhas de um goleiro, obras de arte de lado a lado - com direito a prêmio de gol mais bonito feito em todo o mundo no ano de 2011 -, pênalti perdido, e um duelo de genialidades entre aquele que era um ícone do que naquele momento era a velha geração, e um ícone que chegava como símbolo de uma nova geração do futebol brasileiro - Ronaldinho Gaúcho vs Neymar -. Um épico!
É um caso clássico que mostra que o futebol é tão mágico e espetacular que um jogo não precisa necessariamente definir um campeão, um título, ou uma conquista, para entrar para a história e ser relembrado diversas vezes por toda a eternidade como uma das maiores partidas de futebol já disputadas. O duelo entre Flamengo e Santos, válido pela 12ª rodada do Campeonato Brasileiro de 2011, é um destes grandes casos. Aquela noite em Santos foi a mais goleadora de Ronaldinho com a camisa rubro-negra, e também foi sua melhor exibição vestindo vermelho e preto.
Ficha Técnica
27/07/2011 - Flamengo 5 x 4 Santos
Local: Vila Belmiro, Santos (Público: 12.968 pagantes)
Gols: Borges (4'1T) e (16'1T), Neymar (26'1T), Ronaldinho Gaúcho (28'1T), Thiago Neves (31'1T), Deivid (43'1T), Neymar (5'2T), e Ronaldinho Gaúcho (22'2T) e (36'2T)
Fla: Felipe, Leonardo Moura, Welinton (David Bráz), Ronaldo Angelim e Júnior César; Willians, Luiz Antônio (Dario Bottinelli), Thiago Neves e Renato Abreu; Ronaldinho Gaúcho e Deivid (Jean).
Téc: Vanderlei Luxemburgo
Santos: Rafael Cabral, Pará, Edu Dracena, Durval e Léo; Arouca, Ibson, Elano (Alan Kardec) e Paulo Henrique Ganso; Neymar e Borges.
Téc: Muricy Ramalho
A História do Jogo
Uma vitória com placar elástico e uma chuva de gols. Não é todo dia que um resultado sinaliza 5 x 4 num jogo de futebol em seus tempos mais modernos. Uma vitória gigante, ainda mais com o Flamengo sendo o visitante, em plena Vila Belmiro, o campo de futebol que revelou Pelé para a história.
Apenas um mês havia se passado desde que aquele time do Santos havia obtido a conquista da Copa Libertadores da América daquele ano sobre o Peñarol, do Uruguai. Os santistas ainda estavam um tanto embebedados pela glória de ter levantado pela terceira vez em sua história a taça continental. E enfrentavam a um Flamengo que naquele momento sonhava com a conquista de mais um título brasileiro, pois estava invicto no Brasileirão após 11 rodadas disputadas, tendo vencido cinco e empatado seis partidas até então.
Embora já tivessem atuado lado a lado na Seleção Brasileira, aquela noite representava o primeiro duelo de forças, como adversários, entre o santista Neymar, que estava com 19 anos, e Ronaldinho Gaúcho, que já estava com 31 anos. À beira do campo, o duelo também marcava mais um dos tantos confrontos entre dois dos treinadores mais vitoriosos da história do futebol brasileiro: Muricy Ramalho, então técnico do Santos, e Vanderlei Luxemburgo, então treinador do Flamengo.
A partida teve início com o Santos confirmando o favoritismo e atropelando o Flamengo nos minutos iniciais de jogo. Logo com um minuto de partida, Neymar recebeu pela esquerda, tabelou com Ganso, e viu o camisa 10 santista sofrer falta. Era o sinal de como a defesa rubro-negra teria dificuldade para parar a linha de frente do alvi-negro praiano. Aos quatro minutos, Ronaldinho tentou um passe de calcanhar para Deivid, mas errou e originou um contra-ataque para o Santos. Neymar deu um "drible da vaca", jogando de um lado e pegando do outro, driblou mais um marcador, e tocou para Elano que, num lançamento primoroso, deixou o centroavante Borges cara a cara com o goleiro Felipe. Com extrema tranquilidade, ele deu um leve toque, o suficiente para tirar a bola do alcance do goleiro rubro-negro: Santos 1 a 0.
Após levar o gol, o Flamengo buscou reagir. Errando menos passes, criou oportunidades e equilibrou a partida. Tanto que Ronaldinho quase marcou em duas oportunidades. Aos onze minutos, ele avançou por alguns metros com a bola, fintou Durval e bateu rasteiro, com a bola desviando e passando à direita do gol de Rafael. Aos quinze minutos, Ronaldinho dominou dentro da grande área, cortou o marcador e bateu fraco, nas mãos de Rafael.
Apesar dos esforços rubro-negros, foi o Santos quem marcou. Após um erro de passe de Renato Abreu, Ganso deixou Neymar em ótima posição, ele tentou encobrir Felipe, que defendeu, mas a bola voltou para Neymar que, caído no chão e de costas para o gol, tocou com uma meia-bicicleta para Borges que, sozinho, não teve dificuldade para colocar 2 a 0 no placar.
Neymar estava em noite demoníaca. Aos vinte e um minutos, ele pedalou para cima de um, tabelou com Ganso, tocou de primeira para Léo, que devolveu para Ganso, Borges fez o pivô para o camisa 10, que quase ampliou. O time rubro-negro poderia ter diminuído, mas numa noite na qual aconteceu de tudo, o inacreditável também se manifestou. Após bela jogada de Luiz Antônio, o cruzamento diagonal passou pelo goleiro santista e encontrou Deivid sozinho na pequena área, ao lado da trave, sem marcação nenhuma. Mesmo com o gol aberto diante de si, ele conseguiu desperdiçar. A bola bateu na canela e saiu ao lado da trave, num lance que seria humilhante até numa partida amadora de várzea na terra batida, que dizer num jogo profissional, com atletas de remuneração milionária.
Impiedoso, o Santos seguia atropelando e o Flamengo dava sinais de que enfim a invencibilidade de onze jogos chegaria ao fim. Aos vinte e seis minutos da etapa inicial, uma obra de arte. Neymar arrancou pelo meio, jogou para Borges, que escorou e devolveu. Num drible improvável, o camisa 11 passou pela dupla de zaga rubro-negra Welinton e Ronaldo Angelim e ficou frente a frente com Felipe. O toque final foi leve, por baixo do goleiro. A Vila Belmiro aplaudiu de pé àquele gol que ganhou placa no estádio e foi laureado com o Prêmio Puskas pela FIFA no final daquela temporada. Aquele terceiro gol foi eleito pela FIFA como o mais bonito do ano entre todos os marcados no planeta. Um 3 a 0 inapelável, que deixava os rubro-negros atônitos a atordoados.
A festa alvi-negra estava armada. Parecia que caberia muito mais. Aliás, coube muito mais. Só que então por parte do Flamengo, que mostrou que também estava em campo. O jogo mudou de lado. O time rubro-negro não se intimidou com a vantagem adversária e continuou indo para cima, marcando dois gols rápidos, com Ronaldinho e Thiago Neves, e pressionando o Santos, que também apresentava falhas defensivas. Que jogo!
O Flamengo iniciou sua reação ainda no primeiro tempo: Ronaldinho, aos vinte e oito minutos, aproveitou uma falha do goleiro Rafael, que soltou a bola depois de cruzamento de Luiz Antônio, ela sobrou limpa para Ronaldinho, que só empurrou para as redes, diminuindo o placar na Vila Belmiro. Três minutos depois, o Flamengo imprimiu uma bela troca de passes, até a bola chegar a Deivid, que tocou para Léo Moura pelo lado direito, ele fez um belíssimo cruzamento, a defesa santista falhou, e Thiago Neves aproveitou para subir sozinho e, de cabeça, completar o belo cruzamento para dentro das redes. Em poucos minutos, a vantagem caiu para 3 a 2. Um futebol tecnicamente muito bem praticado, poucas faltas e dois gênios inspirados! Havia muito a ser jogado.
O Flamengo quase empatou aos trinta e oito minutos, quando Ronaldinho fez tabela rápida com Thiago Neves na entrada da área, com direito a toque de letra, e concluiu a gol, vendo Rafael Cabral evitar o terceiro gol rubro-negro. Um primeiro tempo de louco! Mas àquela altura ninguém era capaz de supor que a primeira etapa ainda apresentaria tantas emoções nos minutos finais.
O relógio marcava quarenta minutos quando, após mais uma bela jogada de Neymar, que fez fila, saindo do campo de defesa, driblando toda a ala-direita rubro-negra, e só parando na grande área, quando foi derrubado por Willians, que tomou cartão amarelo. Sem dar margem a dúvida, o árbitro assinou o pênalti. O cobrador oficial santista era Borges, mas foi o meia Elano quem pegou para bater. E ele decidiu bater de "cavadinha", esperando que o goleiro Felipe caísse para um dos cantos, deu um balão devagar no meio do gol. O goleiro rubro-negro não pulou e esperou a definição, parado no meio do gol, viu a bola ser recuada devagar para suas mãos. Incomodado com a cobrança do rival, Felipe encaixou uma sequência de embaixadinhas após fazer a defesa, antes de pegar a bola com as mãos e rapidamente repô-la em jogo. Como sempre disse Muricy Ramalho: "a bola pune". E puniu. Para piorar a situação já embaraçosa e desconcertante do meia santista, o Flamengo partiu em contra-ataque após a reposição de Felipe e obteve um escanteio a seu favor. Na cobrança, Ronaldinho cruzou na primeira trave, e Deivid desviou para o gol: 3 a 3!
Aconteceu de tudo naquela primeira metade de partida. Certamente, foi um dos melhores primeiros quarenta e cinco minutos de jogo da história do futebol mundial em todos os tempos! Mas naquele dia as emoções seguiriam eletrizantes durante o segundo tempo de jogo. Foi uma noite épica!
Nos 45 minutos finais, mais do que nos iniciais, a partida quase que se tornou um duelo de individualidades entre Ronaldinho e Neymar, e o que se viu em campo foi uma ópera de futebol no solo sagrado da Vila Belmiro, a grama onde germinou Pelé. De um lado, Neymar puxava contra-ataques e arrancava pela esquerda, sendo um tormento para a defesa rubro-negra. Logo no primeiro minuto, ele driblou três marcadores e bateu com força, cruzado, mas ninguém desviou. No minuto seguinte, num lance parecido, aplicou um drible desconcertante e finalizou cruzado, com a bola passando perto da trave de Felipe. Endiabrado, aos três minutos ele driblou dois no meio de campo e só foi parado com falta. E aos cinco minutos, após receber passe do lateral-esquerdo santista Léo, o camisa 11 alvi-negro se livrou de Deivid Bráz, que havia recém entrado no jogo, e tocou por cobertura na saída de Felipe. Mais um belo gol: Santos 4 x 3 Flamengo.
Mas Neymar não era o único protagonista em campo, e logo Ronaldinho Gaúcho iria mostrar como os craques sempre pensam a frente de todos os demais, sempre prontos para surpreender e improvisar. O jogo não parava, continuava eletrizante, com os dois times buscando o gol o tempo todo. Neymar não parava e quase marcou mais uma vez, mas foi parado por Felipe. Deivid respondeu com uma bela cabeçada, defendida pelo goleiro Rafael. O Flamengo cresceu no jogo. O Santos tentava não se expor, mas dava espaços quando o Flamengo saía para atacar. O relógio marcava dezenove, quase já vinte minutos, quando numa péssima saída de bola do Santos, Ronaldinho recuperou a posse de bola, fez linda jogada, deixando Edu Dracena no chão e tentando um elástico para cima de Léo, que fechou a marcação junto com Arouca, mas só tendo sido capazes de pará-lo com falta, na entrada da área. Adivinha quem ia bater? O camisa 10 da Gávea...
Eram dezenove metros de distância para o gol. Rafael Cabral armou a barreira, que quando Ronaldinho se aproximou da bola, pulou, para dificultar a perigosa curva que ela fazia nas cobranças do R10, que muitas vezes morriam dentro do gol. E então Ronaldinho mostrou mais uma vez que era daqueles gênios que mudam o jogo, deixando uma marca ao estilo antes e depois dele. Foi com a camisa do Barcelona que ele fez pela primeira vez gols cobrando faltas rasteiras, por baixo da barreira, quando esta pulava. Ele inventou esta cobrança, e depois dele, passou a ser frequente que os técnicos passassem a colocar um jogador deitado no chão, atrás da barreira, para evitar gols com cobranças de falta neste estilo.
Numa noite na qual já havia acontecido de tudo, a mágica da genialidade dos maiores craques do futebol ainda proporcionou mais um momento belíssimo e histórico. Ronaldinho surpreendeu a todos e mais uma vez executou sua cobrança por baixo da barreira. Rafael nem se mexeu! Um lance de gênio! De craque! Um golaço! Mais uma vez o Flamengo chegava ao empate: 4 a 4!
O jogo não parava, seguia eletrizante e continuava muito movimentado. O Santos contava com toda a genialidade de Neymar para criar oportunidades de gol. Aos vinte e quatro minutos, ele puxou contra-ataque pela direita, driblou Leonardo Moura e caiu dentro da área, pedindo pênalti, mas o árbitro marcou apenas escanteio. No minuto seguinte, ele fez fila em cinco flamenguistas, passou por mais um e sofreu a falta, que rendeu cartão amarelo para Renato Abreu. Aos vinte e oito, ele recebeu pela esquerda, dominou, cortou o marcador e bateu rasteiro, com a bola passando à direita do gol de Felipe. Aos vinte e nove, ele driblou dois, pedalou, deixou Léo Moura mais uma vez para trás, e na finalização bateu com força e no alto, mas a bola saiu pela linha de fundo. Eram incontáveis chances de gol criadas pelo garoto, porém foi o Flamengo quem foi mais objetivo.
Um jogo daquele merecia um vencedor. E ele se materializou aos trinta e seis minutos. Num erro de saída de bola de Paulo Henrique Ganso, Deivid rouba a bola e passou a Thiago Neves, que deu um bom passe na frente para Ronaldinho, que arrancou pela esquerda, invadiu a área, e bateu cruzado: Flamengo 5 a 4! Um jogo para a eternidade!
Mas ninguém se dava por vencido em campo. As emoções não se esgotavam. Aos quarenta minutos, Ronaldinho tabelou com Thiago Neves e deixou o companheiro na cara do gol para que, numa chance clara para marcar, fizesse o sexto e ampliasse o placar. Contudo, o chute passou rente à trave. Nervoso ao ver que a partida parecia perdida apesar de sua grande atuação, aos quarenta e cinco minutos Neymar perdeu a bola pelo lado direito e, descontrolado emocionalmente, acabou levando cartão amarelo.
Já nos acréscimos, Ronaldinho aplicou drible sobre Léo e sofreu a falta. Na cobrança, tocou para Thiago Neves segurar a bola pelo lado direito, próximo à linha de fundo, tendo, segundos depois, o árbitro apitado o término do magistral confronto. Vitória para o Flamengo e para Ronaldinho, que venceu o duelo particular contra Neymar e saiu de campo ovacionado. Vitória também para o futebol brasileiro, que viu um espetáculo de bola na Vila Belmiro.
A noite de 27 de julho de 2011 entrou para a história do futebol não só brasileiro como mundial, porque o que se viu nos gramados de futebol naquele dia não foi coisa que é comumente vista com frequência. Noite em que mesmo com suas deficiências defensivas, o Flamengo foi Flamengo! Noite na qual Ronaldinho ditou com os pés que Flamengo é Flamengo! Noite que os amantes e os deuses do futebol nunca vão deixar o tempo apagar! Noite em que um gênio se reafirmou e outro ressurgiu, mostrando que ainda tinha muito a oferecer! Um dia épico!!
Podia falar mais desse jogo, melhor jogo do séc XXI, está muito pobre o texto sobre ele, um jogo de grandes lances, jogadas desconsertantes de ambos os times, com direito a um gol que levou o prêmio Puskas, aquele magnífico gol do Neymar, enfim, um jogo que eu nunca vou esquecer.
ResponderExcluirDemorou seis anos... mas seu pedido foi atendido: matéria expandida e atualizada em 28 de outubro de 2021 :)
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