domingo, 1 de agosto de 2021

Futebol do Flamengo de 1945 a 1955: o palco que transforma a grandeza em mítica


HISTÓRIA DO FUTEBOL DO FLAMENGO


O NASCIMENTO DO MAIS QUERIDO 2ª Parte (1945 a 1955)
Surge um palco místico para transformar sua grandeza em algo mítico

Os diferenciais de grandeza que faziam a diferença da torcida do Flamengo frente a todas as outras já estavam semeados. Uma evidência é a fundação em 1941 da primeira torcida organizada do futebol, a Charanga Rubro-Negra, organizada por Jaime de Carvalho. Eis um registro extraído da Revista Esporte Ilustrado, edição de outubro de 1945, na coluna do jornalista Alberto Mendes após uma vitória de 6 a 1 do Flamengo sobre o São Cristóvão: "Prosseguem os rubro-negros na sua campanha do tetra e com fundadas razões. Apenas julgamos que a sua torcida organizada deve adaptar melhor as suas iniciativas ao espetáculo futebolístico. Domingo, por exemplo, tivemos uma música, misto de fanfarra e batucada, de todo inoportuna, pois não se calou um único momento durante os noventa minutos, enfadando todos. Por outro lado, achamos excelente a demonstração dessa torcida, que após o prélio desfilou pelo gramado, comemorando carnavalescamente a vitória retumbante. Para o futuro, sempre música após o jogo e nunca durante o mesmo".

Após o Primeiro Tri - em 1942-43-44 - o Flamengo entrou na temporada de 1945 sob a expectativa de conseguir o tetra. A base da equipe que havia sido campeã no ano anterior havia sido muito pouco modificada. Porém, o time estaria desfalcado do goleiro Jurandir, que se machucou durante o Torneio Municipal no primeiro semestre e ficou fora durante todo o Carioca. Só dois jogadores haviam saído do elenco, o zagueiro argentino reserva Coletta, que decidiu se aposentar do futebol e regressar a seu país, e Nilo, que foi contratado pelo Botafogo. Para repor a saída de Nilo, para reforçar ao ataque, foi contratado Adílson, do Fluminense (que viria a ser o artilheiro do time no campeonato). Outra novidade, foi que a partir de 1945, o Flamengo teve que dividir seu técnico com a Seleção Brasileira, tendo Flávio Costa assumido ao comando do escrete nacional, acumulando a função com a de treinador rubro-negro.

O clube decidiu também apostar numa nova leva importada de seus vizinhos sul-americanos, como vinha fazendo todos os anos desde 1937, chegando mais três nomes à Gávea. Aportaram no clube Humberto Buchelli, um jogador de dupla nacionalidade - argentino e uruguaio - ex-jogador do Peñarol, e com passagens pelo Pelotas, do Rio Grande do Sul, e pelo Botafogo (onde quase não atuou), e depois tendo jogado por Bonsucesso, Cruzeiro e em Portugal, onde encerrou a carreira de jogador e iniciou a de treinador, tendo trabalhado ainda no México na segunda metade dos Anos 60. Junto a ele, chegaram o argentino Alfredo De Terán, do Banfield, e o paraguaio Severo Rivas, do Cerro Porteño. Nenhum deles três vingou em vermelho e preto.

Era um elenco que parecia ter as mesmas qualidades do campeão em 1944. Porém, no 1º Turno o time já se afastou da briga pelo título sofrendo três derrotas em nove jogos, perdendo para América, Botafogo e Vasco. No returno, o time encaixou uma sequência de cinco vitórias seguidas nas primeiras rodadas, com direito a goleadas por 10 a 1 sobre o Bonsucesso e por 6 a 1 sobre o São Cristóvão. Ainda assim não conseguiu se aproximar do líder Vasco, que fazia uma campanha invicta (como fez até o final do campeonato). No returno, uma nova derrota para o Botafogo arruinou de vez qualquer possibilidade do tetra-campeonato, tendo o time terminado o campeonato tão só com um 4º lugar.

Flamengo no Carioca de 1945
Luiz Borracha, Norival e Newton Canegal; Biguá, Modesto Bria e Jayme de Almeida; Adílson, Zizinho, Pirilo, Perácio e Jarbas
Téc: Flávio Costa
Banco: Dolly, Severo Rivas, Tião, Vaguinho, Jervel e Vevé

O clube buscou enxugar o elenco para o Carioca de 46. O goleiro Jurandir saiu rumo ao Corinthians, e o veterano ponta-esquerda Jarbas decidiu por sua aposentadoria. Entre os estrangeiros do elenco, só os paraguaios Bria e Rivas foram mantidos, os argentinos Rafael Sanz e Alfredo De Terán foram para o Banfield, e Humberto Buchelli seguiu no Rio, passando a defender ao Bonsucesso. Um único reforço chegou à Gávea, o atacante Velau, do Bahia.

Estas escolhas marcaram uma mudança histórica de estratégia do clube. Entre 1937 e 1945 foram 18 jogadores da América do Sul jogando com a camisa do Flamengo: 16 argentinos (um deles com dupla nacionalidade, também uruguaio) e 2 paraguaios. Dentre estes, na primeira leva, em 1937, Luis Villa e Arcádio López chegaram a ser titulares, mas por pouco tempo. Só 4 destes jogadores conseguiram efetivamente se tornarem titulares por período mais longo: Volante, Valido, Alfredo González e Modesto Bria. Doze deles (dois terços) não fizeram mais do que alguns poucos jogos em vermelho e preto. O clube decidiu abandonar temporariamente a estratégia de contratar estrangeiros em todas as temporadas. Desde 1937, eram quatro ou cinco sul-americanos no elenco todos os anos. O clube só voltaria a investir num estrangeiro três anos depois, mas dando um tiro mais certeiro.

No Carioca de 46, o time arrancou muito bem no 1º turno, tendo terminado invicto, com 7 vitórias e 2 empates, ambos por 2 x 2, contra Vasco e Botafogo. A dupla de ataque formada por Pirilo e Perácio estava fazendo um poderoso estrago nos adversários: nas sete vitórias, a linha de frente rubro-negra marcou seis gols no América, no Canto do Rio e no Bonsucesso, meteu cinco no São Cristóvão e no Fluminense, e fez quatro gols sobre Bangu e Madureira. Porém, do outro lado, a defesa também andava tomando bastante gols. No 2º turno, o time já fez sua estreia metendo 7 a 1 no Bangu. A partir da 3ª rodada, no entanto, a fragilidade defensiva cobrou sua conta: três derrotas seguidas para São Cristóvão, América e Vasco. Ainda aplicaria uma impiedosa goleada de 10 a 0 sobre o Bonsucesso no Estádio da Rua Teixeira de Castro, mas na última rodada voltaria a perder, desta vez para o Fluminense, e pelos mesmos 5 x 2 que havia vencido no turno.

No campeonato daquele ano, os quatro melhores colocados avançavam para definir o título num quadrangular final em turno e returno, batizado de SuperCampeonato. Nele, o time venceu duas vezes ao América, mas perdeu duas vezes para o Botafogo. Contra o Fluminense, um empate e uma derrota. Assim, o time de Flávio Costa terminou em 3º lugar.

Como as coisas na Gávea nunca foram calmas após as derrotas - já naquele tempo não eram - uma enxurrada de críticas balançou as estruturas. Quem se aproveitou foi o Vasco, que sequer havia conseguido vaga no quadrangular final, e buscava se reformular, decidindo apostar no experiente Flávio Costa para arrumar sua casa. Ainda assim, só o tirou da Gávea porque lhe ofereceu o maior salário já pago até então a um treinador em todo o futebol brasileiro. O técnico da seleção estava no Flamengo desde o fim dos Anos 1920, primeiro como meio-campista e depois como treinador. Esteve ausente quando a diretoria rubro-negra apostou por importar ideias novas e contratou ao húngaro Dori Kurschner, que foi o responsável pela introdução do sistema tático WM no futebol brasileiro. Ainda que Flávio Costa tenha sido um ferrenho crítico do trabalho e das ideias do europeu, ele "bebeu de sua água", prestando bastante atenção aos conceitos revolucionários importados com o húngaro. Flávio adaptou o sistema de jogo WM, acoplando brasilidades do jeito de jogar futebol usado no país, e montando o sistema tático que ficou sendo chamado no Brasil de "Diagonais". Foi com esta organização de suas equipes que ele se sagrou quatro vezes campeão carioca com o Flamengo, em 1939, 1942, 1943 e 1944, e viria a ser três vezes campeão carioca com o Vasco, em 1947, 1949 e 1950, nos quatro anos que dirigiu ao cruzmaltino, arquitetando a equipe que ficou conhecida como "Expresso da Vitória". E com o mesmo esquema tático, levaria a Seleção Brasileira a chegar pela primeira vez a uma final de Copa do Mundo em 1950. Mas a derrota para o Uruguai no "Maracanazzo" não lhe daria qualquer louro de herói.

Flamengo no Carioca de 1946
Luiz Borracha, Norival e Newton Canegal; Biguá, Modesto Bria e Jayme de Almeida; Adílson, Tião, Pirilo, Perácio e Vevé
Téc: Flávio Costa
Banco: Dolly, Jacyr, Zizinho, Vaguinho e Velau

Quando o Flamengo perdeu seu treinador para o Vasco, foi buscar como substituto justamente o jovem treinador que havia comandado ao cruzmaltino na temporada anterior, o português Ernesto Santos. Ele havia tido uma carreira mediana como zagueiro, tendo vivido seu melhor momento nas duas temporadas que atuou com a camisa do Porto (1935-36 e 1936-37). Pouco depois chegou ao Rio de Janeiro, contratado pelo Fluminense para o Carioca de 1939, onde não teve sucesso. Antes de se aposentar, o zagueiro ainda atuou pelo São Cristóvão. Depois que parou, continuou erradicado no Rio, tentando a carreira de técnico, mas sem ter conseguido prosperar nela; seus trabalhos se restringiram ao Vasco em 1946 e ao Flamengo em 1947.

O time foi mantido e reforçado. A única baixa foi a saída da pouco aproveitado Severo Rivas, o paraguaio foi jogar em Belém, pelo Paysandu. Como principal reforço para a temporada, a investida foi sobre o principal destaque do Vasco, o ponta de lança Jair da Rosa Pinto, principal destaque da equipe que havia sido a Campeã Carioca de 1945. E ele chegou à Gávea colocando o craque do time rubro-negro, Zizinho, no banco de reservas.

O Vasco da Gama havia chegado ao futebol carioca "causando" nos Anos 1920. Nos tempos em que os times de futebol eram amadores e que não treinavam sequer diariamente, os comerciantes portugueses da Zona Portuária do Rio deram incentivos financeiros, recrutaram jogadores de vários times pequenos do futebol carioca e tendo os juntado a um grupo de trabalhadores de menor renda, colocando todos para treinar diariamente, em tempo integral, sob a tutela do treinador uruguaio Ramón Platero. O time, sobrando na preparação física, foi campeão da segunda divisão em 1922 e campeão carioca no seu ano de estreia, em 1923, com o time que ficou conhecido como "Os Camisas Negras". O feito levou a um racha no futebol da cidade, sob protestos de um rentismo que à visão da época era degradante para os valores do esporte. Assim, em 1924 houve dois campeonatos, com Fla, Flu, Botafogo e América de um lado, e o Vasco só do outro, no qual acabou bi-campeão. O clube entrou no futebol com uma força econômica pujante, tanto que já a partir de 1927 passou a ter o maior estádio da cidade.

O decênio 1935-1944 havia consolidado o Fla-Flu como o grande clássico do Rio. E foi só no período de 1945 a 1952 que o Vasco se consolidaria como uma das maiores forças do futebol da cidade. Desde que emergira no cenário do Rio, o Vasco havia conquistado 5 títulos em seus dois primeiros decênios - 1923, 1924, 1929, 1934 e 1936 (os dois últimos também num cenário de dois torneios separados) -. Entre 1945 e 1952, com a geração do "Expresso da Vitória" conquistou outros 5. Embora o episódio de 1923 no qual o Flamengo venceu e impediu o título invicto dos "Camisas Negras", num jogo que bateu todos os recordes de público do futebol até então e semeou a rivalidade entre os clubes, foi no fim dos Anos 1940 que a rivalidade se inflamaria e germinaria de vez, principalmente a partir da investida vascaína no técnico rubro-negro e da Seleção Brasileira, Flávio Costa, e da contra-investida para tirar Jair de São Januário.

A campanha no 1º turno foi boa, com 7 vitórias em 10 jogos, e com direito a uma goleada por 8 x 1 sobre o Bangu. Porém, o time não venceu aos jogos mais importantes, empatando com Botafogo e Fluminense, e perdendo para o Vasco. No 2º turno, o trabalho desandou. Logo nas duas primeiras rodadas, um empate contra o Bonsucesso e uma derrota para o Olaria afastariam o time das primeiras posições. Depois sofreu duas derrotas seguidas, de 4 x 2 para o Botafogo e de 5 x 2 para o Vasco dentro da Gávea, diante de quase 14 mil espectadores. A goleada para o rival causou a demissão do técnico português Ernesto Santos. Nas quatro últimas rodadas o time jogaria sem um treinador no banco, com a função ficando sob a responsabilidade do lateral-esquerdo Jayme de Almeida, jogador e técnico ao mesmo tempo. O time ainda empatou o Fla-Flu e perdeu para o América, terminando o campeonato num modesto 5º lugar.

Flamengo no Carioca de 1947
Luiz Borracha, Miguel (Norival) e Newton Canegal; Biguá, Modesto Bria e Jayme de Almeida; Tião, Jair da Rosa Pinto, Pirilo, Perácio e Vevé
Téc: Ernesto Santos
Banco: Tarzan, Quirino, Jacyr, Zizinho e Adílson

Adílson, Zizinho, Pirilo, Jair e Vevé

O Flamengo vivia um período de desconstrução da vitoriosa geração Tri-Campeã Carioca de 42-43-44. E desde a saída de Flávio Costa, demonstrava-se um tanto desnorteado em suas escolhas para seu futebol. No início de 1948, o Botafogo contratou ao centroavante Silvio Pirilo, tirando-o da Gávea. Quirino, Adílson e Perácio acabaram dispensados no fim da temporada de 47, sinalizando o quanto a diretoria estava disposta a reformular o elenco. E antes do Carioca de 48, após o fim do Torneio Municipal, deixaria o clube também o atacante Tião, que voltou ao Atlético Mineiro. Para repor as saídas, foram contratados três jogadores para reforçar ao elenco, mas nenhum de grande renome. O principal deles foi o centroavante Durval, do Madureira. Também chegaram à Gávea para reforçar à linha de ataque: o ponta-direita Luizinho, do Cruzeiro do Rio Grande do Sul, e o ponta-esquerda Gringo, do Vitória, da Bahia. A linha defensiva se manteve a mesma, com a criação dividida por Zizinho e Jair da Rosa Pinto.

A aposta para comandar o time do Flamengo no Carioca de 48 foi no técnico do Bangu, José Ferreira Lemos, o "Juca da Praia", um ex-jogador do Botafogo nos Anos 1920, que havia sido um dos mais destacados árbitros do futebol carioca no fim dos Anos 1930 e na primeira metade dos Anos 1940, tendo sido ele, por curiosidade, quem apitou ao histórico "Fla-Flu da Lagoa" na Gávea. O principal atributo elogiado em Juca era sua dita malandragem. Era uma escolha um tanto questionável, pois o trabalho a frente do Bangu em 1947 não havia sido positivo, tendo terminado em 9º e penúltimo lugar no Carioca, e sido goleado duas vezes nos dois confrontos contra o Flamengo, por 8 x 1 no 1º turno e por 4 x 0 no 2º turno, além de também ter sofrido goleadas para Fluminense, Vasco e Botafogo.

Antes do Campeonato Carioca começar, o marco do ano foi o primeiro duelo na história rubro-negra contra um clube europeu. O Southampton visitou o Rio de Janeiro, e o duelo amistoso contra o Flamengo mexeu com a cidade. A partida foi no Estádio de São Januário, que, abarrotado, recebeu segundo as estimativas da polícia, 40 mil espectadores para ver o confronto, que terminou numa vitória inglesa por 3 x 1.

No Estadual, a campanha foi quase uma repetição do que ocorrera no ano anterior. No 1º turno, o time venceu 7 dos seus 10 jogos, mas não venceu aos jogos mais importantes, empatando com o Fluminense e perdendo para Vasco e Botafogo. No 2º turno, o trabalho desandou. Logo na 1ª rodada, uma derrota para o Olaria na Rua Bariri. Depois foi derrotado pelo Vasco, e na 5ª rodada, após um empate frente ao Canto do Rio no Estádio Caio Martins, em Niterói, o técnico rubro-negro foi demitido. Nas cinco últimas rodadas o time foi comandado pelo técnico do time de basquete, Togo Renan Soares, o Kanela. Venceu quatro dos cinco duelos, incluindo o Fla-Flu, e perdeu para o Botafogo. Terminou o campeonato em 3º lugar.

Flamengo no Carioca de 1948
Luiz Borracha, Norival e Newton Canegal; Biguá, Modesto Bria e Jayme de Almeida; Luizinho, Zizinho, Durval, Jair da Rosa Pinto e Gringo
Téc: Juca da Praia, depois Kanela
Banco: Dolly, Beto, Vaguinho, Bodinho e Vevé

O Rio de Janeiro e o Brasil já viviam, em 1949, a expectativa pela realização da Copa do Mundo no país no ano seguinte. Desde agosto de 1948 havia sido iniciada a obra de construção do "Maior Estádio do Mundo". O Maracanã estava sendo erguido no terreno em que ficava o Jockey Clube, que seria transferido para o bairro do Jardim Botânico, na Zona Sul da cidade, literalmente em frente ao Estádio da Gávea, estando o campo rubro-negra e área das corridas de cavalo separadas apenas pelas duas pistas da Rua Mário Ribeiro.

Do outro lado do Túnel Rebouças, o colossal estádio que estava sendo construído para o Mundial de 1950 teria capacidade para 200 mil pessoas. Ele seria o "Grande Palco", que desde sua concepção, pela sua grandeza e enormidade impressionantes, já seria um local místico e folclórico, que viria a ser fundamental para transformar a grandeza da torcida rubro-negra numa coisa ainda mais mítica, não só em todos os rincões do Brasil, como transbordando as fronteiras nacionais e despertando interesse no mundo inteiro.

Foi curiosamente também por esta época que foi realizada a primeira medição estatística organizada pelo instituto de pesquisas IBOPE para dimensionar as maiores torcidas de futebol na cidade do Rio de Janeiro. O Flamengo aparecia em 1º lugar, com 42,5% dos corações da então capital federal, cidade-estado cosmopolita que recebia gente de todos os estados do Brasil e por onde circulavam visitantes de todo o mundo. Dentre seus rivais, o Fluminense tinha 23,5% da torcida, seguido por Vasco com 16%, Botafogo com 10% e América com 3%. E 5% declararam torcida por outros clubes, incluindo de outras cidades dos mais diversos pontos do país. Em todas as décadas seguintes iriam ser feitas pesquisas similares, e através do tempo, Vasco e Fluminense inverteriam de posição, e a vantagem rubro-negra a frente só viria a crescer dali em diante com o passar dos anos.

No dia a dia do clube, o principal desejo rubro-negro naquele momento para fortalecer a seu time era o de encontrar a um grande goleiro. Luiz Borracha havia perdido espaço na Gávea, acabou negociado para o Bangu. Foi então que o Flamengo voltou a recorrer ao mercado sul-americano para se fortalecer, coisa que não fazia havia alguns anos. Desta vez, porém, podendo fazer uma escolha avaliada com seus próprios olhos. O Campeonato Sul-Americano de 1949 foi jogado no Rio de Janeiro. Na última rodada, diante de 35 mil espectadores em São Januário, a Seleção Brasileira precisava somente de um empate contra o Paraguai para se sagrar campeã. Porém, o camisa 1 da Seleção Paraguaia, Sinforiano Garcia, estragou a festa, fechou o gol, e garantiu a vitória guarani por 2 a 1 que forçou à realização de um jogo extra dias depois para decidir o campeão. Naquele dia, o Flamengo decidiu que queria ao goleiro do Cerro Porteño para si, e conseguiu. Ainda que no jogo desempate o Brasil tenha aplicado uma impiedosa goleada de 7 x 0, conquistando seu terceiro título continental sobre o Paraguai, do técnico Manuel Fleitas Solich, cujo destino também se cruzaria com o rubro-negro alguns anos depois. O revés com goleada arrasadora não mudou as convicções rubro-negras, e após o fim da competição, Garcia se apresentou para defender vermelho e preto a partir de então. Chegava à Gávea para se juntar ao único estrangeiro que restava no elenco, seu conterrâneo Modesto Bria, titular absoluto desde que chegara ao clube.

No elenco rubro-negro, também saíram o zagueiro Norival, que foi para o Corinthians, e o ponta-direita Luizinho, que após rápida passagem pela Gávea, voltou ao Rio Grande do Sul, desta vez para defender ao Internacional. Buscando fortalecer ao elenco, chegaram mais quatro jogadores à Gávea, dois de fora do Rio - o zagueiro Juvenal, do Cruzeiro do Rio Grande do Sul, e o atacante Lero, do Atlético Mineiro - e dois de dentro da cidade - Válter Miraglia, do Olaria, e o ponta-esquerda Esquerdinha, do Madureira -. E desta vez as contratações foram mais acertadas, pois dos 5 reforços que aportaram no início de 1949, somente Lero não viria a escrever história no clube. Destaque para o zagueiro gaúcho Juvenal, que um ano depois seria titular na zaga da Seleção Brasileira, disputando todos os jogos da campanha canarinho na Copa do Mundo de 1950.

Em 1949, o ano foi mais uma vez marcado pelas badalações em torno da passagem de times europeus pelo Rio. E desta vez com o Flamengo se impondo e ganhando moral e auto-estima por vitórias marcantes. Especialmente a obtida sobre o Arsenal. O amistoso frente aos ingleses levou 26 mil espectadores ao estádio, que viram a vitória rubro-negra por 3 x 1 em São Januário. Pouco depois, o time venceria também ao Rapid Viena, da Áustria, e se encheria de esperanças para fazer uma boa campanha no Estadual.

Mas o desempenho no Carioca de 1949 foi um desastre. O time de futebol seguia dividindo seu técnico com o time de basquete. Logo na estreia, uma derrota para o América. Depois se seguiram goleadas por 6 a 0 sobre Canto do Rio e São Cristóvão, e vitórias sobre Bangu, Bonsucesso e Madureira. Na 7ª rodada, no entanto, o time rubro-negro foi goleado por 5 x 2 pelo Vasco em São Januário, e entrou em crise. O vilão escolhido foi Jair da Rosa Pinto, que naquela tarde fazia apenas sua terceira aparição no campeonato. Acusado de não ter suado a camisa, e de ser jogador sem fibra e sem raça, Jair foi expulso do clube. Ele acabou rumando para o Palmeiras, e foi enquanto vestia a camisa alvi-verde que foi titular da Seleção Brasileira no ano seguinte no time vice-campeão da Copa do Mundo de 1950.

Nas rodadas seguintes, seguiram-se derrotas para Botafogo e Fluminense, e um empate com o Olaria, e em meio à sequência ruim ocorreu a troca de treinador. O time passou a ser comandado por Gentil Cardoso, técnico que havia sido campeão carioca de 1946 a frente do Fluminense, e que em 1948 havia estado a frente do Corinthians.

No 2º turno, o Flamengo encaixou uma sequência de cinco vitórias consecutivas, interrompida por uma derrota para o Vasco na Gávea. Foi a única derrota no returno, que teve ainda empates contra Madureira e Fluminense. A reorganização tática e a recuperação técnica levou ao ganho de posições na tabela, com o time terminando o campeonato em 3º lugar.

Flamengo no Carioca de 1949
Garcia, Juvenal e Newton Canegal; Biguá, Modesto Bria e Válter Miraglia; Gringo, Zizinho, Durval, Lero e Esquerdinha
Téc: Kanela, depois Gentil Cardoso
Banco: Dolly, Job, Jayme de Almeida, Beto e Jorge de Castro

Com mais investimentos e incentivos no futebol brasileiro em decorrência da realização no país da Copa do Mundo de 1950, conseguiu-se enfim retirar do papel uma ideia antiga, que existia desde os Anos 1930, mas que nunca havia conseguido engrenar: a realização de uma competição futebolística reunindo aos clubes mais fortes do Rio de Janeiro e de São Paulo, as duas maiores economias regionais do país.

Pelas dimensões continentais do Brasil, o país era o único com a particularidade da realização de Campeonatos Estaduais e não Nacionais. As enormes distâncias geográficas impuseram custos logísticos que eram insuperáveis para um esporte ainda embrionário em sua capacidade de movimentar capital. Assim, o Rio-São Paulo veio a ser a primeira iniciativa, ainda embrionária, rumo à realização de uma competição nacional em solo brasileiro.

O Flamengo reforçou seu elenco. A principal contratação, no entanto, só chegou no decorrer da competição: João Ferreira, o "Bigode", zagueiro e lateral-esquerdo que atuava havia sete anos com a camisa tricolor. E jogador que seria titular na Seleção Brasileira que disputou a Copa do Mundo de 1950. Ele ficaria dois anos no Flamengo, e depois voltaria para as Laranjeiras, onde jogaria outros quatro anos. Também chegaram como reforços: o goleiro Cláudio, do Força e Luz, do Rio Grande do Sul, os pontas-direita Cidinho, do Bonsucesso, e Aloísio, do Sport de Juiz de Fora, além do zagueiro Osvaldo, do Olaria.

O time começou o torneio dando esperanças a seu torcedor, fazendo uma estreia com uma goleada por 6 a 2 sobre o Corinthians - que viria a ser o campeão da competição - com uma grande atuação em São Januário. Mas o bom desempenho ficou nisto, depois derrotas para Palmeiras, Portuguesa de Desportos e São Paulo, e empates com Vasco e Botafogo. O time só voltou a conseguir mais uma vitória, sobre o Fluminense. Num torneio de tiro curto, por pontos corridos e em turno único, e reunindo apenas oito clubes, a perda de pontos é fatal. A campanha rubro-negra levou o clube a uma modesta 5ª colocação no final.

Flamengo no Torneio Rio-São Paulo de 1950
Garcia, Juvenal e Bigode (Newton Canegal); Biguá, Modesto Bria (Beto) e Válter Miraglia; Cidinho, Zizinho, Durval, Gringo e Esquerdinha
Téc: Gentil Cardoso

Depois do Torneio Rio-São Paulo de 1950, a diretoria rubro-negra decidiu vender ao ídolo Zizinho para o Bangu. E foi enquanto vestia a camisa alvi-rubra que ele jogou como titular absoluto da Seleção Brasileira a Copa do Mundo de 1950. Também deixou ao elenco o lateral-esquerdo Jayme de Almeida, que vinha atuando pouco e decidiu pela aposentadoria. Também saíram os pontas-direita Cidinho, devolvido ao Bonsucesso após empréstimo, e Bodinho, vendido ao Nacional do Rio Grande do Sul, por onde teve uma breve passagem, tendo logo depois se transferido para o Internacional, onde jogaria por um longo tempo.

Para repor as perdas no elenco, o clube se reforçou para fortalecer sua linha ofensiva: chegaram Hermes, do Grêmio, e Washington, do Palmeiras. Mas quem mais brilharia em vermelho e preto, no entanto, seria a contratação menos badalada: o volante Dequinha, que chegava do América de Pernambuco para fazer sombra ao paraguaio Modesto Bria, que já havia muitos anos era o titular da posição na Gávea.

Desde a saída de Flávio Costa para o Vasco, o Flamengo havia tido três temporadas com troca de treinador durante o Carioca - em 1947, 1948 e 1949 - sob um ambiente constantemente turbulento. Para o Carioca de 1950, a diretoria quis ousar e tentar recuperar os tempos vanguardistas do clube, para isso fez uma aposta ousada: decidiu voltar a apostar na importação de um treinador da Europa. Aproveitou toda a presença de estrangeiros no Rio de Janeiro durante a realização da Copa do Mundo e fez contato com o renomado técnico português Cândido de Oliveira, que estava na cidade trabalhando para a imprensa de Portugal que cobria o Mundial.

Cândido de Oliveira havia sido jogador de futebol nos tempos do amadorismo, ao mesmo tempo que exercia a profissão de jornalista, tendo sido um dos fundadores do tradicional jornal esportivo "A Bola". Estudioso do campo tático num momento que o futebol começava a amadurecer suas estratégias de jogo, foi o técnico da Seleção de Portugal de 1926 a 1945, tendo tipo seu melhor momento nos Jogos Olímpicos de 1928, quando levou a equipe às quartas de final do principal torneio de futebol a nível mundial daqueles tempos pré-Copa do Mundo. Após deixar à Seleção Portuguesa, foi treinador do Sporting, de Lisboa, na temporada 1945-46. Na temporada 1946-47 mudou de função no clube e se tornou o Supervisor de Futebol. Voltou a ser o treinador nas temporadas 1947-48 e 1948-49. Com ele, o Sporting foi Tri-Campeão Português nas temporadas 1946-47, 1947-48 e 1948-49. Em 1950, ele aceitou o desafio de tentar revolucionar ao futebol do Flamengo.

Após o fim da Copa de 50, no entanto, ele teve que regressar a Portugal para tratar de todos os trâmites burocráticos para se mudar ao Brasil. Assim, só chegou ao Rio para treinar o time rubro-negro com o Campeonato Carioca já em andamento. E herdou uma situação bem ruim. O técnico interino nas quatro primeiras rodadas foi o recém aposentado Jayme de Almeida. Nas duas primeiras rodadas, o time perdeu para o Madureira e foi goleado por 6 a 0 pelo Bangu! E logo no primeiro jogo oficial do Flamengo no recém-inaugurado Estádio do Maracanã. Aquele dia também marcou o primeiro encontro de Zizinho como adversário da camisa rubro-negra, tendo ele marcado um dos seis gols na fatídica goleada. O time ainda empatou com o Olaria. Quando o técnico português chegou, a distância para os líderes da tabela já era considerável. E ele ainda tinha que, sob pressão, adaptar-se a um elenco que pouco conhecia, e à organização tática distinta daquela com a qual estava habituado. Não podia dar certo...


Na estreia, uma goleada por 4 a 0 no Canto do Rio. Depois, antes do fim do turno, um empate com o América, e derrotas para Vasco, Botafogo e Fluminense. Dos 10 jogos do turno, o Flamengo perdeu 5 e empatou 2. Só venceu a São Cristóvão, Canto do Rio e Bonsucesso.

No 2º turno, uma nova vitória sobre o Bonsucesso, seguida por uma sequência horrorosa, com um empate frente ao Canto do Rio, uma derrota para o Olaria, e goleadas sofridas para Vasco (1 x 4) e Botafogo (2 x 4). O português Cândido de Oliveira não resistiu! Acabava ali sua passagem pela Gávea, com Jayme de Almeida voltando a assumir o time até o fim do campeonato. Nas cinco últimas rodadas, três vitórias, incluindo uma goleada por 5 x 2 no Fla-Flu, e derrotas para América e Bangu. O time terminou com um horripilante 7º lugar entre 11 participantes.

Flamengo no Carioca de 1950
Cláudio, Osvaldo e Juvenal; Nélio (Biguá), Válter Miraglia e Bigode; Aloísio, Hermes, Durval, Lero e Esquerdinha
Téc: Cândido de Oliveira
Banco: Garcia, Modesto Bria, Dequinha, Beto e Harry

Indignada com a vexatória campanha no Carioca de 50, a diretoria rubro-negra decidiu apostar todas as suas fichas em voltar a ter Flávio Costa como treinador. E pagou caro para conseguir isto! O técnico havia conquistado o bi-campeonato carioca com o Vasco em 1949 e 1950. Nos quatro anos em que esteve em São Januário, foi três vezes campeão carioca e uma vez vice-campeão, perdendo polemicamente o título de 48 para o Botafogo. Enquanto, nestes quatro anos, a Gávea viveu em crise constante, e em todas as quatro edições de Carioca mudou seu treinador durante o campeonato.

O time mudou muito pouco frente ao que havia feito uma campanha horrorosa no Campeonato Carioca de 1950. O paraguaio Bria recuperou a posição de titular, desta vez, porém, jogando como quarto-zagueiro. E na linha de frente entrou o principal reforço rubro-negro para a temporada de 1951: Adãozinho, reserva da Seleção Brasileira na Copa do Mundo de 1950 enquanto era jogador do Internacional, e que no sul do Brasil fora apelidado de "Negrinho do Pastoreio". O Flamengo também apostou na contratação do ex-atacante do Vasco Nestor, que estava jogando no Palmeiras antes de sua chegada à Gávea, por onde passaria quase desapercebido, sendo vendido dois anos depois para o XV de Jaú, do interior de São Paulo.

Nas mãos de Flávio Costa, o time cresceu de produção. Assim como na primeira edição do Rio-São Paulo, o Flamengo começou a segunda edição goleando, meteu 5 a 2 na estreia contra a Portuguesa de Desportos no Maracanã. Depois, porém, tomou uma acachapante goleada de 7 a 1 do Palmeiras na 2ª rodada. Na sequência, uma derrota para o Bangu que dificultava bastante as chances de um título rubro-negro.  

Seguiram-se vitórias sobre América e São Paulo, e um empate contra o Vasco. Na última rodada, derrota para o Corinthians, e o término da competição ocupando a 4ª colocação na tabela de classificação.

Flamengo no Torneio Rio-São Paulo de 1951
Cláudio, Juvenal e Modesto Bria; Biguá, Válter Miraglia e Bigode; Aloísio, Hermes, Durval, Adãozinho e Esquerdinha
Téc: Flávio Costa

No fim do primeiro semestre, o clube realizou uma bem-sucedida excursão à Europa. Era a primeira vez que o vermelho e o preto atravessavam o Oceano Atlântico. E fez bonito: disputou 10 partidas, com 9 vitórias e 1 empate. Destaque para a goleada por 5 a 1 imposta ao Racing Paris no Parc des Prince, na capital francesa.


A preparação do elenco para o Carioca de 51 sofreu com o assédio dos clubes paulistas, com o Flamengo perdendo dois de seus principais jogadores: o zagueiro Juvenal foi para o Palmeiras, e o centroavante Durval para o São Paulo. Para repor as perdas, foram contratados o zagueiro Pavão, da Portuguesa Santista, e o meia Rubens, da Portuguesa de Desportos. O clube ainda tirou o ponta-direita Joel do Botafogo.

Aquela campanha vem a ter uma grande importância, uma vez que se começa a ser possível a visão de um esboço, formado por Flávio Costa, daquilo que viria a ser, dali a alguns anos, o próximo grande time da história rubro-negra, o do Segundo Tri. O paraguaio Garcia reconquistou a titularidade no gol, Pavão entrou para ser o xerife na zaga central, Dequinha assumiu a posição na cabeça de área, e no ataque Joel, Rubens, Índio e Esquerdinha começavam a dar forma a uma das mais eficientes linhas de frente da história do clube. Ao lado deles, naquele ano, ainda estavam os gaúchos Hermes e Adãozinho. Mas um garoto emergido das divisões de base, que vinha jogando desde 49, assumiria dali para frente a camisa 9, o centroavante Índio.

A campanha, no entanto, foi bastante instável. Sobretudo no 1º turno. Em 10 rodadas, o time sofreu 4 derrotas, para Botafogo, Bangu, Fluminense e Madureira. Terminou, no entanto, com o incômodo e longo jejum perante o Vasco, mas ainda perdeu pontos em empates com o Olaria e o São Cristóvão. No 2º turno melhorou, vencendo 7 das 10 partidas, empatou com o Madureira e perdeu para Fluminense e Botafogo. E voltando mais uma vez a vencer ao Vasco, num Maracanã que recebeu 53 mil pessoas. No final, um módico e incômodo 4º lugar.

Flamengo no Carioca de 1951
Garcia, Modesto Bria e Pavão; Biguá, Dequinha e Bigode; Joel, Rubens (Adãozinho), Índio, Hermes e Esquerdinha
Téc: Flávio Costa
Banco: Cláudio, Válter Miraglia, Newton Canegal, Nestor e Aloísio

O processo de formação do time que voltaria a dominar à cidade continuava em marcha. Após o Carioca de 51, o Flamengo contratou a um jovem lateral-esquerdo que despontava no São Cristóvão, Jordan, uma aposta para repor à saída do experiente Bigode, que voltou para o Fluminense. Na Gávea, o garoto passaria mais de uma década como o dono da posição.

Flávio Costa fechou o elenco, e durante todo o ano de 1952 somente uma outra contratação viria a ser feita. O Flamengo mais uma vez se voltaria para o mercado sul-americano, e mais uma vez contrataria a um paraguaio, que chegaria para ser o terceiro no elenco, ao lado do goleiro Garcia e do veterano Bria. O ponta de lança Jorge Benítez havia sido revelado pelo Nacional do Paraguai, e desde 1949, após jogar o Sul-Americano com sua seleção, havia sido contratado pelo Boca Juniors, da Argentina. Com a camisa do Boca, enfrentara o Flamengo num amistoso em 1951, e desde então os dirigentes rubro-negros ficaram de olho nele. Ele só foi contratado com o Rio-São Paulo em andamento, e jogou uma única vez naquela competição.

A campanha rubro-negra no Torneio Rio-São Paulo de 1952 foi horrenda! O time terminou como 10º e último lugar na competição. Na estreia, empate com o Bangu. Depois tomou uma goleada de 4 x 1 do Santos. Venceu à Portuguesa de Desportos, que viria a ser a campeã, e na sequência perdeu para Vasco, São Paulo, Corinthians e Fluminense. Empatou com o Botafogo. E na última rodada conseguiu sua segunda vitória, batendo o Palmeiras diante de mais de 31 mil torcedores no Maracanã.

Flamengo no Torneio Rio-São Paulo de 1952
Garcia, Modesto Bria e Pavão; Aristóbulo, Dequinha e Jordan; Joel, Rubens, Índio, Aloísio (Nestor) e Esquerdinha
Téc: Flávio Costa

Apresar do horripilante desempenho no Torneio Rio-São Paulo de 52, os dirigentes não mexeram em nada no elenco, mostrando a tamanha confiança que existia sobre Flávio Costa. A única saída, foi a do veterano Newton Canegal, que se aposentou após mais de uma década de serviços prestados à camisa vermelha e preta. Depois da competição, quem fez sua estreia no time profissional foi um jovem ponta-esquerda que havia sido contratado às divisões de base do América em 1950, e desde então atuava pela equipe sub-20 da Gávea, o garoto Zagallo, que subia aos profissionais para servir de suplente ao capitão do time, Esquerdinha. Junto a ele, também subindo da base, entrou no time o zagueiro Jadir, que havia chegado ao clube seis meses antes para experiência na base rubro-negra, oriundo do Atlético Brasil, pequeno clube da cidade de Paraguaçu Paulista, no interior de São Paulo. Eram os contornos finais da formação do time do Segundo Tri.

O time tropeçou logo na 3ª rodada do Carioca, perdendo por 2 a 1 para o Olaria no Maracanã. Na 6ª rodada, voltaria a perder, desta vez para o Vasco. Mas em 10 rodadas no 1º Turno, o time venceu 8 vezes, só tendo perdido outro ponto num empate frente ao América na última rodada. No 2º turno, repetiu o retrospecto: venceu 8 jogos, empatou com o Olaria, e perdeu para Vasco e América. Acabou com o vice-campeonato, fazendo uma campanha mais digna do que havia feito nas edições anteriores do Campeonato Carioca.

O Vasco, do ex-técnico rubro-negro Gentil Cardoso, voltou a ser o campeão carioca, repetindo o feito do Flamengo entre 1939 e 1944 ao ser, entre 1947 e 1952, quatro vezes campeão em seis anos. Apesar do título, a diretoria cruzmaltina não estava satisfeita, principalmente porque o desempenho nos dois anos após a saída de Flávio Costa para a Gávea havia decaído frente ao período em que ele esteve por lá. Decidiram assediá-lo para que voltasse. E a verdade é que o Flamengo já não faria tanto esforço para mantê-lo, pois nos dois anos desde sua volta à Gávea os resultados estavam longe de ser exuberantes, embora ele tivesse reordenado a bagunça. Gentil Cardoso, mesmo campeão, foi demitido, mas foi prontamente contratado pelo Botafogo. Flávio Costa assumiu ao Vasco. Cabia ao Flamengo correr atrás de um treinador para si a partir de 1953, e não podiam ser repetidos os erros que deixaram o clube um caos entre 1947 e 1950.

Flamengo no Carioca de 1952
Garcia, Pavão e Jadir; Leone, Dequinha e Beto; Joel, Rubens, Adãozinho, Benítez (Índio) e Esquerdinha
Téc: Flávio Costa
Banco: Antoninho, Biguá, Modesto Bria, Jordan e Zagallo


Com a base estruturada por Flávio Costa no Carioca de 51, e as últimas peças se encaixando ao longo de 1952, o Flamengo voltava a encontrar o encaixe de um grande time. Faltava, no entanto, fazer dele um time vencedor. Flávio voltou a trocar ao Flamengo pelo Vasco, e o time precisava encontrar um novo treinador.

Entre fevereiro e março de 1953, foi disputado o Campeonato Sul-Americano em Lima, no Peru. O Paraguai, que quatro anos antes já houvera sido vice-campeão, desta vez ficou com o título continental. No Flamengo estavam dois jogadores que haviam estado na campanha paraguaia de 1949, e que, portanto, conheciam muito bem ao treinador responsável por aqueles grandes feitos do futebol guarani. A diretoria decidiu então importar a Manuel Fleitas Solich, que com a faixa de campeão sul-americano ainda quente no peito, aterrissou na Gávea para assumir como novo técnico rubro-negro. Fez sua esteia a frente do time rubro-negro exatos 10 dias após o título sul-americano. Solich havia sido jogador do Nacional do Paraguai, e no futebol argentino havia vestido às camisas de Boca Juniors, Racing, Platense e Talleres. Como treinador, havia passado por Olimpia e Libertad, no Paraguai, e por Newell's Old Boys, Lanus e Qilmes, na Argentina. Desde 1947 era o treinador exclusivo da Seleção Paraguaia, com quem jogou duas finais de Sul-Americano e disputou a Copa do Mundo de 1950. Chegava ao Brasil sem falar nada de português. Mas o time rubro-negro tinha a Garcia, Bria e Benítez para auxiliá-lo. O idioma não seria problema. Estava montada a "República do Paraguai da Gávea".

O auxiliar Jayme de Almeida e o técnico Fleitas Solich no banco de reservas do Maracanã

O fim da temporada de 1952 havia marcado o adeus ao ídolo Biguá, que decidiu pela aposentadoria. O foco principal então passou a ser a contratação de um lateral-direito para repor sua saída. A única opção no elenco para a posição era o jovem Leone, que acabara de ser promovido das divisões de base. O Flamengo repatriou então a Marinho Rodrigues, ex-lateral do Botafogo que estava defendendo ao Atlético Júnior de Barranquilla, na Colômbia. Mas foi a outra contratação, menos badalada, que resultou em melhores frutos. O clube contratou a uma das revelações do Carioca de 52, o ponta de lança Evaristo de Macedo, do Madureira.

A campanha no Rio-São Paulo, no entanto, foi quase tão ruim quanto a do ano anterior. Após um empate frente ao Botafogo, e uma vitória sobre o Santos, na 3ª rodada colocou 99 mil pessoas no Maracanã num empate frente ao Vasco. A ducha de água fria veio na rodada seguinte, quando sofreu uma acachapante goleada de 6 x 0 para o Corinthians no Estádio do Pacaembu. Seguiram-se então quatro empates seguidos, contra Palmeiras, Fluminense, Portuguesa de Desportos e São Paulo, seguidos por uma derrota para o Bangu na última rodada. Em 9 jogos disputados, foram 6 empates. E só 1 vitória, terminando com um magro 8º lugar entre dez participantes.

Os resultados ainda estavam ruins. Felizmente, no entanto, a diretoria teve paciência para ver os frutos amadurecerem. E esta foi a decisão mais acertada entre todas as que podia ter tomado. Ao se dar tempo de trabalho a Fleitas Solich, ele provou que os grandes resultados com o Paraguai não haviam sido por acaso.

Flamengo no Torneio Rio-São Paulo de 1953
Garcia, Pavão e Jadir; Leone, Modesto Bria (Válter Miraglia) e Marinho (Jordan); Joel, Rubens, Adãozinho (Índio), Evaristo (Benítez) e Esquerdinha
Téc: Fleitas Solich

A principal contratação feita por Solich para o Carioca de 53 foi a do goleiro argentino Eusebio Chamorro, que havia trabalhado com ele em sua passagem pelo Newell's Old Boys, e estava jogando pelo Independiente Santa Fé, da Colômbia. O Flamengo contaria então com dois goleiros estrangeiros, o titular e o reserva. Quem aportou na Gávea também foi o zagueiro Servílio, que chegava do XV de Jaú. A diretoria rubro-negra desenvolvera bom relacionamento com o clube do interior de São Paulo, a quem havia cedido no fim de 1952 aos atacantes Hermes e Nestor, e para onde foi também o também atacante Adãozinho. O elenco perdeu também ao lateral-esquerdo Beto, jogador revelado nas divisões de base do clube, que aceitou oferta do Vasco e foi jogar em São Januário.

O time iniciou a campanha com cinco vitórias consecutivas, aplicando goleadas sobre Madureira, Bonsucesso e Bangu. Passou por uma instabilidade ao perder para o Fluminense e empatar com o São Cristóvão. Antes do fim do turno, ainda perdeu para o Botafogo e empatou com o Vasco. Iniciou o 2º turno com quatro vitórias consecutivas, incluindo uma goleada de 7 a 2 sobre o Bangu. O time estava na liderança, e sua torcida se empolgou, lotando o Maracanã. No empate frente ao Vasco, 100 mil pessoas no estádio. Seguiu-se um novo empate, desta vez contra o Botafogo. Mais quatro vitórias seguidas e na última rodada do returno, o time precisava da vitória para reassumir a ponta. O Fla-Flu pôs mais de 122 mil pessoas no Maracanã. O Brasil inteiro se impressionava com os relatos que chegavam pelas ondas do rádio, afinal eram inúmeros os municípios brasileiros que não tinham a esta quantidade de habitantes, e no Rio de Janeiro uma multidão deste tamanho se reunia para ver um jogo de futebol no maior estádio do mundo!

O Flamengo venceu por 2 x 1, com o gol da vitória marcado pelo meia Rubens, terminando o 2º turno na liderança, com 36 pontos, seguido por Fluminense e Botafogo com 35. Nas edições anteriores do Campeonato Carioca, teria gritado "é campeão!" naquele dia. No entanto, a regra do Carioca de 53 havia mudado, e ao final dos dois turnos em pontos corridos, os seis primeiros colocados disputariam um 3º turno, um hexagonal final com tudo recomeçando do zero, em tiro único e curto, com todas as partidas no Maracanã. Se o vencedor do 3º turno fosse outro, haveria uma final contra aquele que tivesse melhor pontuação na soma dos dois primeiros turnos. O Mengão venceu os cinco jogos! Começou fazendo de novo 2 x 1 no Fla-Flu, desta vez perante 100 mil espectadores. Depois bateu a América e a Bangu, ambas por 2 x 0. Empolgada com a campanha, a massa se moveu para o Maraca para ver o confronto contra o Vasco, no qual um imparável Benítez comandou a goleada rubro-negra por 4 x 1, assegurando o título com uma rodada de antecipação. Na última rodada, cumpriu tabela vencendo ao Botafogo por 1 x 0. Fleitas Solich havia provado o seu valor. Uma linha de frente impiedosa e goleadora, com o paraguaio Jorge Benítez como artilheiro, com 22 gols, seguido pelos 18 marcados pelo centroavante Índio e pelos 17 do meia Rubens. A cidade se vestia novamente de vermelho e preto.

Flamengo no Carioca de 1953
Garcia, Marinho, Pavão, Servílio e Jordan; Dequinha e Rubens; Joel, Índio, Benítez e Esquerdinha
Téc: Fleitas Solich
Banco: Chamorro, Leone, Jadir, Evaristo e Zagallo

O técnico Fleitas Solich e o presidente Gilberto Cardoso

Após o título carioca, o Flamengo fez duas contratações para a temporada de 1954, a principal delas foi o atacante Zezinho - Moisés Ferreira Alves - do Botafogo. O outro reforço foi para a defesa, Tomires, que estava na Portuguesa de Desportos. O grande destaque no reforço ao elenco, no entanto, foram as divisões de base, tendo emergido uma nova geração que entrou em campo pela primeira vez ao longo daquele ano em vermelho e preto, todos atacantes que vieram a brilhar. Eram os casos do alagoano Dida, do pernambucano Duca, do goleador Paulinho, e do ponta-esquerda pequenininho Babá.

E o clube desdenhou do Torneio Rio-São Paulo de 54, disputando-o com um "Time B", colocando a garotada da base para despontar. Fez uma campanha fraca, com 3 vitórias, 1 empate e 5 derrotas, terminando em 7º lugar. Deu total prioridade às possibilidades financeiras que se desenharam com um novo convite para excursionar pela Europa. Após uma pré-temporada caprichada, viajou para o Velho Continente, onde fez 12 jogos, mas sem um grande desempenho: 3 vitórias, 7 empates e 2 derrotas. Abriu o tour no Estádio San Siro, em Milão, num duelo contra um Combinado Milan-Internazionale que terminou 2 x 2. Da Itália foi à Alemanha, onde empatou com o Eintracht Frankfurt. Passou pela Hungria e pela Áustria, e voltou à Alemanha, onde empatou três vezes seguidas por 2 x 2, contra Nurenberg, Stuttgart e um Combinado Manhein-Ludwigshafen. Despediu-se do tour com uma bela goleada por 4 x 1 sobre o Werder Bremen. Aproveitou os contatos na Europa para marcar um amistoso que marcou o primeiro duelo contra um europeu no Maracanã, no qual voltou a aplicar uma goleada de 4 x 1, desta vez sobre o Deportivo La Coruña.

Flamengo no Torneio Rio-São Paulo de 1954
Garcia, Guta (Tomires), Tião, Jadir e Jorge David; Válter Miraglia e Paulinho; Duca, Maurício (Zezinho), Evaristo e Zagallo
Téc: Fleitas Solich

Joel, Evaristo, Índio, Benítez e Esquerdinha

A luta por um novo título seria com todo o plantel campeão em 1953 mantido, e rejuvenescido pela nova safra que emergiu da base. E o time começou o campeonato imparável, no mesmo ritmo em que havia terminado o Carioca de 53. Encaixou oito vitórias consecutivas, inflamando à torcida. A vitória sobre o Vasco no Maracanã, pela 8ª rodada, colocou 150 mil torcedores no estádio. Na rodada seguinte, 82 mil foram ver um empate sem gols no Fla-Flu. Na última rodada, um empate contra o Botafogo. No 2º turno, o time desacelerou um pouco o ritmo, tendo empatado com Olaria, América e Vasco, e perdido para Fluminense e Bangu. Ainda assim, terminou os dois turnos na liderança do campeonato, com 35 pontos, seguido pelo Bangu com 34 e o América com 33.

No 3º turno, só perdeu pontos num empate por 3 a 3 no Fla-Flu da 1ª rodada. Depois venceu em sequência a América, Botafogo e Vasco, numa vitória de virada por 2 a 1 que sacramentou matematicamente o título com uma rodada de antecipação. Fechou a brilhante campanha goleando ao Bangu por 5 x 1 no Maracanã. O time do "bruxo" Fleitas Solich estava jogando um futebol de altíssimo nível.

Flamengo no Carioca de 1954
Garcia, Tomires, Pavão, Jadir e Jordan; Dequinha e Rubens; Joel, Índio, Evaristo e Zagallo
Téc: Fleitas Solich
Banco: Chamorro, Servílio, Dida, Paulinho, Benítez e Babá

Para o Rio-São Paulo de 55, o elenco teve como única baixa a saída do lateral-direito reserva Marinho, que foi para o Londrina. Com Tomires e Leone para a posição, não houve reposição. A maior preocupação de Solich, no entanto, estava justamente na posição em que ele tinha dois homens de confiança que já haviam trabalhado com ele antes de sua chegada ao Flamengo, no gol. O paraguaio Garcia sentia o peso da idade, e já não tinha a mesma agilidade. O clube contratou então a dois goleiros: Ari, do Bonsucesso, e Aníbal, do Olaria. Entretanto, a aposta maior para fortalecimento do elenco continuava sendo nos jovens que emergiam da categoria sub-20. A aposta desta vez foi no centroavante mineiro Henrique Frade, que havia chegado ao clube dois anos antes.

O time fez uma boa estreia, goleando ao Santos por 5 x 1 no Maracanã. Depois, porém, perdeu para Fluminense e Palmeiras, e empatou com Portuguesa de Desportos e Botafogo. Venceu ao Vasco e perdeu para o América. Nas duas últimas rodadas, venceu a São Paulo e Corinthians, terminando em 4º lugar. Desde a criação do Torneio Rio-São Paulo, em 1950, o Flamengo ainda estava devendo uma bela campanha que o fizesse brigar pelo título. Nas seis primeiras edições, os melhores desempenhos levaram o clube a dois 4º lugares e a um 5º lugar.

Flamengo no Torneio Rio-São Paulo de 1955
Ari (Chamorro), Jorge David, Pavão, Jadir e Jordan; Luís Roberto e Rubens; Evaristo, Henrique Frade (Índio), Paulinho e Babá
Téc: Fleitas Solich

A base de Solich continuava muito pouco mexida. Antes do início do Carioca houve a saída para a aposentadoria de Válter Miraglia, e chegou como reforço, contratado ao Fluminense, o meia Milton Bororó.

Pavão, Chamorro e Tomires

O time começou bem, com 5 vitórias consecutivas, sobre Canto do Rio, Madureira, Bonsucesso, Portuguesa e Botafogo. Mas a insegurança de Solich com a meta rubro-negra seguia evidente. Ele usaria quatro goleiros diferentes durante aquela campanha. Nas primeiras rodadas o titular foi Ari, mas logo a vaga passou a ser do paraguaio Garcia. Na 6ª rodada, o time perdeu o Fla-Flu por 2 a 1 diante de 75 mil pessoas no Maracanã, e a partir do jogo seguinte o titular passou a ser Aníbal. Nas rodadas finais, vitórias sobre Olaria, América, São Cristóvão e Bangu, e uma derrota para o Vasco, que terminou o turno na liderança, mas com o rubro-negro na cola.

No 2º turno, o time arrancou com quatro vitórias consecutivas, mas tropeçou na 5ª rodada, perdendo por 3 a 2 para o Olaria no Maracanã. Recuperou-se na rodada seguinte com uma impiedosa goleada por 6 a 1 sobre o Fluminense, com três gols de Paulinho, que vinha sendo o principal nome da equipe, e viria a terminar o campeonato como o artilheiro rubro-negro. Na sequência, um empate com o Bangu. Na reta final do returno, o titular no gol passou a ser o argentino Chamorro. O time empatou com o Vasco, e encaixou vitórias sobre Portuguesa, Bonsucesso e Botafogo que o fizeram terminar a soma dos dois turnos na liderança do Carioca, tomando a ponta do Vasco na última rodada, quando os cruzmaltinos perderam de 3 x 1 do Fluminense (e também porque eles tinham sido goleados por 5 x 0 pelo Bangu na 5ª rodada). O Flamengo terminou com 36 pontos, seguido pelo Vasco com 35, o Fluminense em terceiro com 30 e o América em quarto com 29. Essa vantagem seria fundamental, porque colocava o Flamengo na final, em caso de não repetir o feito dos dois anos anteriores vencendo também ao 3º turno, o que de fato não aconteceu.

No hexagonal para definição do outro finalista, o time perdeu para América, Fluminense e Vasco, e só venceu a Bangu e Bonsucesso, fazendo tão só a 4ª melhor campanha. Quem venceu o turno foi o América, que obteve quatro vitórias, só empatando frente ao Vasco. Na soma dos três turnos, o Flamengo tinha 40 pontos e o América tinha 38. O Vasco somava 42. No entanto, o regulamento definia desde 1953 que a final, caso necessária, seria entre o vencedor da soma dos dois primeiros turnos contra o vencedor do hexagonal de 3º turno. Assim, Flamengo e América decidiriam o título.

Na final, a vitória no primeiro jogo foi rubro-negra, por 1 a 0, com gol de Evaristo. No segundo jogo, o time de Canário e do argentino Martin Alarcón aplicou uma impiedosa goleada de 5 x 1 sobre o Flamengo. Não havia critério de desempate, e o regulamento previa que com uma vitória para cada lado, haveria um terceiro e decisivo jogo para definir ao campeão. O favoritismo no terceiro jogo, pelo embalo do momento, era do time rubro. O jogo decisivo foi polêmico, pois houve muita reclamação após uma entrada do lateral-direito Tomires sobre Alarcón, que causou uma fratura na perna do argentino. Como nestes tempos não havia substituição, o América teve que seguir com um a menos em campo. O Flamengo se aproveitou, goleou por 4 a 1, em dia iluminado do garoto Dida, e se sagrou Tri-Campeão Carioca!    

Flamengo no Carioca de 1955
Chamorro, Tomires, Pavão, Jadir e Jordan; Dequinha e Paulinho; Joel, Índio, Evaristo (Dida) e Zagallo
Téc: Fleitas Solich
Banco: Aníbal (Garcia), Servílio, Rubens, Duca e Babá

Joel, Rubens, Índio, Dida e Babá

No período entre as conquistas dos dois tri-campeonatos, o Flamengo foi da turbulência e efervescência de ânimos que haviam deixado o clube uma zona, até a estabilidade e o crescimento de produção que o levou de volta ao topo. Era um Rio de Janeiro com um equilíbrio de forças no futebol bem marcado: entre 1945 e 1955, o Vasco foi campeão cinco vezes, o Flamengo três, o Fluminense duas e o Botafogo uma. Neste período que se estenderia até 1958, a dominância na cidade seria vascaína, que voltaria a ser campeão em 1956 e 1958. Se de 1936 a 1944, a maior rivalidade seria entre Fluminense e Flamengo, entre 1945 e 1958 seria entre Vasco e Flamengo. E no período seguinte, de 1959 a 1968 seria entre Botafogo e Flamengo. O vermelho e o preto sempre estariam no coração das grandes rivalidades, afinal já era inquestionável que mobilizava a maior paixão da cidade, e mesmo quando o rubro-negro não estava em suas melhores épocas, a rivalidade se concentrava contra a maioria. A diversão e emoção máxima dos rivais era silenciar a fatia mais cheia do Maracanã. O maior estádio do mundo dava uma dimensão ainda mais distinta a esta emoção.

A festa exagerada dos torcedores rubro-negros incomodava. As polêmicas entre os rivais passavam, ficavam esquecidas no tempo. Mas quando tinha o Flamengo no meio, ganhavam proporções histéricas e de frenesi, rendiam para a eternidade. Quanto maior a festa rubro-negra, maior a inquietação dos rivais, que se uniam em causa única para esbravejar sua impotência diante do delírio incontido da multidão rubro-negra. No Primeiro Tri, a choradeira era pela suposta falta cometida por Valido; no Segundo Tri, era por causa da lesão de Alarcón.

A grandeza da torcida do Flamengo já estava mais do que dada. O clube já havia conquistado à multidão, e de todas as classes sociais. Em 1954, o Jornal dos Sports voltou a encomendar uma pesquisa para o IBOPE para que fosse feita uma medição estatística do tamanho das torcidas na cidade do Rio de Janeiro. Desta vez, diferentemente do que havia sido feito em 1948, também foi estimada a quantidade de pessoas na cidade que não tinham time (não gostavam de futebol). O resultado apontou que 28% da população torcia para o Flamengo, e que 22% não torcia para ninguém. Igualando à medição de seis anos antes e considerando só aqueles que responderam ter um time de futebol, o Flamengo aparecia um 1º com 36% dos torcedores, seguido pelo Fluminense com 23%, o Vasco com 22%, o América com 7% e o Botafogo com 6%. A paixão rubro-negra seguia soberanamente a frente, e a torcida cruzmaltina havia crescido após a geração de conquistas com o "Expresso da Vitória" e encostado na do tricolor das Laranjeiras, e ultrapassaria numa nova pesquisa feita cinco anos depois, em 1959.


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