JÚNIOR: o Maestro de Pele Rubro-Negra
Carreira: 1974-1984 Flamengo; 1984-1987 Torino (Itália); 1987-1989 Pescara (Itália); 1989-1993 Flamengo
O jogador de futebol que mais vezes vestiu a camisa do Flamengo em toda a história! E títulos, foram vários: 6 vezes Campeão Carioca, 4 vezes Campeão Brasileiro, Campeão da Copa do Brasil, Campeão da Libertores da América e do Mundial Interclubes.
Como jogador do Flamengo, ele fez 876 jogos e marcou 73 gols. Como técnico do Flamengo foram outros 76 jogos. Entre jogador e técnico, somou, portanto, 952 partidas! Treinou ao Flamengo em 1993-94 (53 jogos) e em 1997 (23 jogos). Ainda foi Diretor de Futebol do clube em 2004.
Abaixo, a combinação de vários textos sobre a carreira do jogador, os principais deles foram os textos escritos por Leonardo Sacco no site "Calciopedia", o do site "Imortais do Futebol", e o escrito por Cláudio Sampaio para o site "Coluna do Fla":
Leovegildo Lins da Gama Júnior nasceu em João Pessoa, capital da Paraíba, no dia 29 de junho de 1954. Filho de um empresário, migrou para o Rio de Janeiro quando tinha entre 5 e 6 anos de idade porque o seu pai, dono de uma fábrica de mosaico (azulejos e pisos), decidiu tentar a sorte e explorar um mercado consumidor maior.
Testemunha Júnior: "saí muito pequeno de João Pessoa, guardo poucas lembranças de minha terra. Recordo-me, mais ou menos, da fazenda do Tio Américo, casado com a irmã de minha saudosa Avó Adiza. Naquela grande propriedade eram realizadas as tradicionais festas juninas, com fogueiras altas, quentões, milho assado". As lembranças de infância são mais vivas em Copacabana: "as lembranças são deveras muito mais claras, como as brincadeiras de rua: "polícia e ladrão", "pique-bandeira", "garrafão", "carniça" e, principalmente, as "peladas" na Rua Domingos Ferreira, na área interna do 32, bem espaçosa, aliás, para servir de nosso campinho".
A relação com o futebol começou a ganhar outra proporção nas areias da Praia de Copacabana. Lembra Júnior: "o meu irmão mais velho já ia à praia, jogava futebol de areia no Juventus (tradicional time da praia nos Anos 1970) e depois ele começou a jogar vôlei. Eu tinha 8 anos e ele tinha 10. Ele começou a jogar no mirim e eu fui atrás quando tinha idade. A praia representou para mim a descoberta da diversão. E quem mora perto da praia não tem como não se envolver com isso".
Depois, já entre os 13 e os 14 anos, ele jogou os primeiros torneios de futebol de areia pelo Juventus, desde a categoria mirim até ao primeiro time de adultos. Quando tinha 14 anos, jogou futebol de salão contra o time federado da Primeira Divisão do Campeonato Carioca de Futebol de Salão, o Clube Sírio e Libanês, do bairro de Botafogo. Diante de sua boa atuação, foi convidado ao final da partida para fazer parte do time infantil do clube. O futebol de salão no Sírio e Libanês, sob a orientação técnica do professor Orozimbo - um profundo conhecedor do assunto - exigia muita disciplina e empenho de todos os jogadores e foi muito importante. Pelas próprias palavras de Júnior: "obtive ali a base de quase toda minha técnica desenvolvida mais tarde no futebol de campo". Em seguida ele ainda passou pelo Centro Israelita Brasileiro. E paralelamente ao futebol de salão, ele nunca deixou de praticar também o futebol de praia no Juventus, esta sim a grande paixão de sua vida. Aos 16 anos, já jogava no time de adultos do Juventus e tinha alguns privilégios com o Tião e o Neném Prancha, que comandavam a equipe. Ao final dos treinos na praia, ganhava um sanduíche e um refrigerante. Nos dias de jogos, as beiras do campo na praia ficavam tomadas de gente. Era um grande evento popular nas areias.
Durante a sua adolescência, Júnior era torcedor fanático do Fluminense, ele não perdia uma única partida do clube. Do futebol de praia para o futebol de salão, e dos clubes de bairro, foi encaminhado para testes no Fluminense e no América, mas onde ficou mesmo durante um tempo foi no juvenil do Botafogo. Acabou dispensado e quase desistiu. Mas tanto o futebol de campo quanto o Flamengo entraram em sua vida meio que por acaso. Atleta amador de futebol de areia, seu sonho era mesmo ser veterinário. E só não se formou em administração por causa do futebol.
Conta Leovegildo Júnior: "na verdade, eu não gostava de jogar futebol de campo porque as chuteiras me machucavam os pés, joguei muito tempo futebol de salão e não estava nem mais querendo jogar futebol, eu estava fazendo vestibular. Foi quando um amigo do meu tio-avô, que era amigo do Bria do Flamengo, falou: 'pô vamos lá treinar'. Eu não estava muito a fim, eu fui mais para agradar aos dois coroas, eu já tinha 19 anos. Sempre é aquela história de um dia você querer jogar futebol. Eu desde muleque gostaria, mas em questão de tudo que vinha acontecendo, eu nunca viajei muito nesta história, sempre fui pés no chão, eu venho de uma família de uma classe diferente de tudo o que é jogador de futebol, sempre tive praticamente tudo o que eu quis, estudei em bons colégios, a minha mãe, a Dona Wilma, a única coisa que ela me disse foi o seguinte: 'tudo bem, você vai jogar, mas a escola é a prioridade'. Então eu nunca me deixei muito me levar por este entusiasmo, claro quando as coisas começaram a tomar uma dimensão e uma proporção que eu poderia me tornar e viver do futebol, aí a coisa passou a ser completamente diferente. Passei a me dedicar muito mais como se fosse um profissional, porque eu joguei só um ano de categoria de base, no outro ano eu fui para o profissional e em dezembro de 74 eu já era campeão carioca e a revelação, então a minha vida deu uma reviravolta praticamente em um ano e meio".
Júnior fez vestibular para veterinária e por muito pouco não se dedicou exclusivamente à universidade. Quando começou a jogar no Flamengo, mudou a carreira universitária e fez vestibular para administração de empresas, entrando na Faculdade Cândido Mendes, cursando até o segundo ano. Nas palavras do Maestro: "era o único curso que tinha condição de eu fazer, por eu estar jogando, qualquer outro curso que eu ia fazer era período integral; para jogar futebol eu tinha um certo limite de idade, pra estudar eu tinha a vida inteira".
O então técnico da base do Flamengo, o paraguaio Modesto Bria, observou ao ambidestro Júnior nos testes e o aprovou. A habilidade e a visão de jogo apuradas fizeram com que o lateral fosse aceito. Júnior começou a jogar como volante nos juvenis (sub-20) do Flamengo, mas lhe recomendaram a lateral, que era uma posição menos disputada. Ele topou.
Jogou apenas um ano nas categorias de base e teve sua primeira oportunidade entre os profissionais. Atuando como lateral-direito, estreou na equipe profissional em 1974 no empate em 2 a 2 contra o Operário de Campo Grande, entrando no lugar de Humberto Monteiro. Não demorou muito para o jovem de cabelão "black power" conseguir um lugar entre os titulares e ser um dos destaques do time na reta final do Campeonato Carioca daquele ano, principalmente depois de anotar dois gols na vitória sobre o América que valeu ao Flamengo o gás necessário para arrancar para o título: Campeão Carioca de 1974. Entre os companheiros, Júnior ganhou o apelido de "Capacete", exatamente em razão do corte de cabelo que usava.
Dois anos após sua profissionalização, uma mudança definitiva marcaria sua carreira. Após o Flamengo acertar a contratação de Toninho Baiano para a lateral-direita, o treinador Cláudio Coutinho improvisou Júnior na lateral-esquerda e nesta posição ele se mostrou um jogador muito mais útil ao time. Ambidestro e com uma técnica diferenciada, passou a ser um jogador muito mais útil ao time naquele lado do campo. A rápida adaptação à nova posição consagrou ao atleta como uma peça versátil, tornando-o - ainda jovem, com apenas 22 anos - um jogador essencial para o time. Júnior era um destro nato. Para se adaptar melhor à posição, passou a frequentar o paredão de madeira da Gávea, que servia para os jogadores aperfeiçoarem seus fundamentos. Nele, o jovem só chutava cruzamentos com a perna esquerda até ficar craque no assunto.
Um lateral que mostrava extrema facilidade de defender e apoiar, com bons passes e cruzamentos. A perna esquerda cobrava faltas impecáveis, realizava cruzamentos impressionantes e marcava gols estrondosos. Pela lateral-esquerda, tornou-se o melhor e mais completo jogador brasileiro na posição depois de Nilton Santos.
Já em 1976 seu desempenho o levou à sua primeira convocação para a Seleção Brasileira, nos Jogos Olímpicos de Montreal. Apesar da boa fase no Flamengo e da experiência adquirida nas Olimpíadas, Júnior não foi lembrado por Cláudio Coutinho para a Copa do Mundo de 1978. Foi só a partir de 1979 que Júnior começou a ser presença constante nas convocações da Seleção Brasileira principal. O craque já havia sido lembrado em convocações da equipe amadora em 1976, e em uma partida amistosa contra o Internacional no mesmo ano. Mas seria na década de 80 que o craque se transformaria, enfim, em um jogador incontestável. E vencedor. Com a camisa rubro-negra, ele estava prestes a iniciar uma fase espetacular: Tri-Campeão Carioca em 1978, 1979.I e 1979.II, Campeão Brasileiro de 1980, Campeão da Copa Libertadores da América e do Mundial Interclubes de 1981. Júnior vivia seu apogeu físico e técnico. Apesar de gostar muito de um samba e de apreciar uma cerveja gelada, o que sempre fez na hora adequada, ele era um profissional extremamente dedicado.
Em 1980, Júnior venceu o primeiro grande título de sua carreira e que serviu como trampolim para ele e o Flamengo iniciarem uma dinastia fenomenal: o Campeonato Brasileiro. Na decisão daquele ano, o time rubro-negro fez dois jogos alucinantes contra o fortíssimo Atlético Mineiro de Reinaldo, Luizinho, Toninho Cerezo e Éder. Na finalíssima, em um Maracanã lotado, venceu por 3 a 2 e ficou com a taça. Dali em diante, a equipe só colecionou títulos. Em 1981, três taças: o Carioca, a Libertadores e o Mundial.
Jogando muito, ganhou vários prêmios: incluindo um 3º lugar na eleição do jornal "El Mundo" de Melhor Jogador da América do Sul em 1981 - atrás apenas de Zico e Maradona, e a frente de Passarella, Falcão, Sócrates e Figueroa - e de maior lateral-esquerdo do planeta na época. Júnior virou uma unanimidade na Seleção Brasileira comandada por Telê Santana que era tida como favorita para a Copa do Mundo de 1982; ainda mais depois de bater a Inglaterra, França e Alemanha em uma excursão pelo Velho Continente. Campeão de tudo pelo Flamengo, só faltava mesmo um título com a camisa amarela para coroar de vez a carreira do craque.
Antes da Copa, Júnior - amante da música e do samba - lançou um disco compacto com músicas que refletiam a Seleção Brasileira. Uma delas era a canção "Voa Canarinho", que reuniu vários atletas cantando-a, e rapidamente se tornou o hino oficial daquele time no Mundial. O disco foi um dos mais tocados do ano e chegou a vender cerca de 200 mil cópias em seis meses. A música cujo título verdadeiro era "Povo Feliz", e acabou ficando conhecida como "Voa Canarinho", trazia na letra: "Voa, canarinho, voa / Mostra pra esse povo que és um rei / Voa, canarinho, voa / Mostra na Espanha o que eu já sei / Verde, amarelo, azul e branco / Forma o pavilhão do meu país / O verde toma conta do meu canto / O amarelo, azul e branco / Fazem o meu povo feliz / E o meu povo toma conta do cenário / Faz vibrar o meu canário / Enaltece o que ele faz / Bola rolando e o mundo se encantando / Com a galera delirando / Tô aí e quero mais / Quero mais / Quero mais".
Porém, todo aquele show não duraria muito. Após fazer partidas irresistíveis na primeira fase do Mundial e vencer à Argentina de Maradona por 3 a 1 já na segunda fase, com direito a gol e "sambadinha" de Júnior para a torcida, a Seleção Brasileira perdeu para a Itália de Paolo Rossi por 3 a 2 nas quartas de final, dando adeus ao sonho do título. Aquela foi uma enorme decepção para Júnior, que perdia a chance de ser campeão do mundo no auge de sua carreira, assim como seus colegas de Flamengo que integravam o time titular (Leandro e Zico) e os outros craques que compunham aquele timaço canarinho (Luizinho, Oscar, Falcão, Toninho Cerezo, Sócrates e Éder). Mesmo sem a taça, Júnior foi eleito pela FIFA o melhor lateral-esquerdo daquela Copa do Mundo. Reconhecido como um dos melhores times de futebol de todos os tempos mesmo com a inesquecível eliminação para a Itália de Paolo Rossi, o esquadrão canarinho tinha em Júnior uma arma fundamental para a troca de bola precisa e veloz que encantou ao planeta.
Para esquecer a decepção com a seleção, o Flamengo vivia sua Era de Ouro e não parava de conquistar títulos: Campeão Brasileiro em 1982 e em 1983. Além das taças, o que mais ficou marcado foi a qualidade do futebol apresentado pelo time, que entrou para a história com um dos maiores esquadrões de todos os tempos no futebol mundial.
A fama conquistada em campo, somada aos títulos cariocas, brasileiros e internacionais, chamou a atenção do mercado europeu e seus pagamentos muito maiores do que os vistos no Brasil. Foi assim que em 1984 Júnior deixou o Flamengo para tentar reproduzir na Europa o sucesso que obtivera no futebol brasileiro. Zico havia ido alguns meses antes, e Júnior havia passado a ocupar uma posição no meio de campo rubro-negro. No Mundialito de Clubes de 1983, contra Internazionale, Milan, Peñarol e Juventus, que acabou campeã, deixando o time rubro-negro - já sem o "Galinho de Quintino" - com o vice-campeonato.
Por aproximadamente 2 milhões de dólares, o Torino adquiriu o lateral brasileiro, de 30 anos, para ser a principal peça de seu time. Na campanha que rendeu ao time de Turim o vice-campeonato italiano – o scudetto daquela temporada iria para o Hellas Verona, que tinha como destaques ao alemão Briegel, ao dinamarquês Elkjaer e ao italiano Di Gennaro - o jogador pediu para ser deslocado para atuar mais avançado, preservando-se mais para poder continuar sua carreira por mais tempo.
Assim, Júnior – ou Léo Júnior, como era conhecido na Itália – começou sua trajetória no futebol italiano jogando como meio-campista. A mudança deu certo: aliando a velocidade para atuar pelas pontas, que os anos na lateral lhe deram, com sua visão de jogo acima do comum, Júnior foi eleito o melhor jogador da temporada granata. O brasileiro também marcou sete gols e foi, ao lado do meio-campista Giuseppe Dossena, o arquiteto do time treinado por Luigi Radice, que quase retomou as glórias de um clube que havia dominado o futebol italiano na década de 1940. Com a camisa 5, foi eleito o melhor jogador do campeonato numa época em que brilhavam astros como Maradona, Platini, Rummenigge, Falcão e Zico pelos gramados italianos. O time por pouco não faturou o scudetto. Em 30 partidas, o Torino obteve 14 vitórias, 11 empates e apenas 5 derrotas, quatro pontos a menos que o campeão Verona. Rapidamente, o craque virou ídolo da torcida do Torino.
O primeiro ano de Júnior na Itália, apesar da idolatria da torcida granata, teve também algumas turbulências sérias. O então meio-campista sofreu em duas oportunidades com o preconceito de torcidas rivais. O primeiro caso aconteceu em um duelo contra o Milan, no qual foi insultado pela torcida rival durante toda a partida no Estádio San Siro, sendo ainda alvo de mais xingamentos e cusparadas quando saía do estádio ao lado de seus familiares. Em outra ocasião, sofreu com torcedores da Juventus que levaram ao dérbi faixas ofensivas ao jogador, mencionando principalmente a cor de sua pele. Como resposta, a torcida do Torino tentou fazer sua parte e levou cartazes de apoio. Esses, porém, ainda continham um certo cunho racista nos dizeres "Melhor negro do que juventino". Preconceitos a parte, Júnior manteve seu futebol de alto nível em seu segundo ano na Itália, sendo a principal peça de um Torino que chegou ao quarto lugar da Serie A. A idade, porém, chegava, e começava a ser sentida.
O técnico da Seleção Brasileira Telê Santana o convocou para a Copa do Mundo de 1986, na qual levou ao México a geração de 1982 envelhecida e alguns reforços mais jovens. Assim como no Torino, Júnior foi escalado no meio por Telê. Voltou a cair com a equipe canarinho nas quartas de final, o algoz da vez foi a França de Platini, que eliminou ao Brasil nos pênaltis.
Após a Copa, voltou ao Belpaese para fazer aquela que seria sua última temporada pelos granata. A queda de rendimento do jogador, já com 32 anos, e os desentendimentos com o técnico Radice – a quem Júnior chamou de egoísta, por não reconhecer erros – foram essenciais para que ele não fosse mais utilizado com frequência em um Torino que terminou o campeonato daquele ano em uma modesta décima colocação. Júnior, porém, continuou na Itália. Saiu do Torino para se apresentar ao Pescara, equipe que, sob o comando do histórico técnico Giovanni Galeone, havia acabado de subir para a Serie A.
Os "golfinhos do Abruzzo" viam no jogador brasileiro a peça ideal para dar experiência necessária a um time que teria que lutar muito para se manter na Serie A. Capitão do Pescara, com todo o seu grande carisma, o brasileiro ainda mantinha um programa na TV local chamado "Brasi… Leo", onde falava de futebol, mas também de música, uma de suas grandes paixões. Ele foi o primeiro estrangeiro na história a vestir a camisa do Pescara. Atuando ainda como meio-campo, mas sem contar com a velocidade que lhe era característica, livrou os "azzurri" do rebaixamento apenas nas últimas rodadas, permanecendo no clube por mais uma temporada. Em seu último ano, não resistiu à falta de qualidade do time, que voltou à Serie B – por coincidência, a queda da equipe de Júnior aconteceu no mesmo ano em que o Torino foi rebaixado. No entanto, Júnior foi eleito o segundo melhor estrangeiro da Serie A, ficando à frente de nomes como Careca, Gullit, Rijkaard, Van Basten e Maradona, perdendo apenas para Lottar Matthaus, que levou a Internazionale a um scudetto cheio de recordes.
Apesar de plenamente adaptado à Europa, com ótimo salário e perspectivas de permanência, Júnior - sensível a um pedido de seu então pequeno filho Rodrigo (o Digo Gama, que nos Anos 2000 vestiu a camisa da Seleção Brasileira de Beach Soccer) que gostaria de vê-lo jogar no Maracanã - cedeu ao coração e retornou ao "Mais Querido do Brasil" em 1989 para jogar ao lado de Zico, que naquele mesmo ano decidiria por sua aposentadoria. Mas por uma última temporada, Zico e Júnior vestiram vermelho e preto juntos.
Com visíveis cabelos brancos, muitos duvidaram da capacidade de Júnior em sua volta ao Brasil. Vestiu vermelho e preto de 1989 a 1993. O recomeço em 89 foi difícil, tendo inclusive sido testado durante algumas partidas como zagueiro. Mas depois as coisas se arrumaram, e nesse período ele foi Campeão da Copa do Brasil de 1990, do Campeonato Carioca de 1991 e do Campeonato Brasileiro de 1992, o quarto de sua carreira e quinto da história do Flamengo. O agora veterano Júnior além de ter que ser decisivo dentro das quatro linhas, tinha que capitanear uma promissora geração de "bad boys" egressada das divisões de base, que tinha Júnior Baiano, Djalminha, Marcelinho Carioca, Nélio, Paulo Nunes, Fabinho, Fábio Augusto e Luís Antônio. Revelou então o traço que gravou definitivamente seu nome na história eterna do Mengão: a maestria. O outrora "Capacete", revelou-se um inspirado "Maestro", apelido que marcou a fase final de sua carreira nos gramados, na qual abusava de passes e gols decisivos.
Em 1990, Júnior comandou o Flamengo rumo ao título inédito e invicto da Copa do Brasil, conquistado após uma vitória (1 a 0) e um empate sem gols contra o Goiás de Túlio Maravilha na final. Em 1991, foi a vez de comemorar o título do Campeonato Carioca com direito a goleada por 4 a 2 sobre o Fluminense de Ézio na decisão, com o quarto gol marcado por Júnior, que havia anunciado na véspera do jogo que aquela provavelmente seria sua última partida no futebol. Poderia ter se despedido com uma taça e um gol. Mas decidiu ficar um ano mais.
Teve mais uma vez uma chance ideal para encerrar com chave de ouro sua brilhante carreira. Jogando praticamente num 4-5-1, só com o atacante Gaúcho na frente e Zinho e Júnior como principais maestros do meio de campo, o Flamengo superou um início regular no Brasileiro de 92 para dar a volta por cima e chegar até a final. Na primeira fase, a equipe terminou na quarta posição com oito vitórias, seis empates e cinco derrotas em 19 partidas. Júnior mostrou seu poder de decisão e brilho ao marcar vários gols, incluindo um golaço de fora da área no empate em 2 a 2 contra o Botafogo na 3ª rodada. Na segunda fase, o Flamengo seguiu com chances de classificação até a 4ª rodada, quando teve pela frente ao Vasco de Bismarck, Bebeto e um jovem Edmundo. E foi no "Clássico dos Milhões" que Júnior provou mais uma vez sua genialidade ao cobrar um escanteio cheio de veneno e marcar um gol olímpico. No finalzinho do jogo, Júnior deu um passe na medida para Nélio fazer o gol da vitória: 2 a 0. Após a derrota para o São Paulo por 2 a 0 na partida seguinte, o time se classificou para a final ao vencer o Santos por 3 a 1 num Maracanã lotado. A final foi contra o Botafogo, onde estava Renato Gaúcho. Uma vitória rubro-negra por 3 a 0, com Júnior abrindo o placar. Neste jogo, com dois dribles épicos que fizeram o falastrão atacante Renato Gaúcho sentar por duas vezes no gramado do Maracanã, o Maestro deu um show! Na sequência, no segundo jogo, o Maestro Júnior abriu o placar novamente, quando o time rubro-negro abriu 2 a 0; acabou cedendo o empate, mas se sagrou campeão nacional.
O Maestro Júnior, então com 38 anos de idade, ganhou a Bola de Ouro da Revista Placar, alusiva à condição de melhor jogador do certame nacional. O craque mostrou uma qualidade impressionante para sua idade e deu um banho de bola em muita molecada na época. Ademais, a reboque de suas brilhantes atuações na maturidade, retornou à Seleção Brasileira para mais algumas partidas.
Ele poderia ter se aposentado ali, mas decidiu ficar um ano mais, sonhando que poderia voltar a conquistar a Libertadores em 1993. Mas quando cruzou com o São Paulo de Telê Santana e Raí (que eliminou o rubro-negro do torneio nas quartas de final), o sonho naufragou. Entendeu então que era a hora da aposentadoria...
O Maestro Júnior chegou a ser convidado pelo técnico Telê Santana para integrar a equipe do São Paulo, a qual estava na iminência de sagrar-se campeã mundial de clubes, mas negou de modo enfático, afirmando que não tinha condições de, no Brasil, vestir outra camisa que não fosse a do Flamengo.
Em 1993, Júnior encerrou sua excepcional trajetória na Gávea como o atleta que mais vezes vestiu o Manto Sagrado, sempre o defendendo com fibra e mentalidade vencedora. Imediatamente foi convidado e aceitou o convite para se tornar técnico do Flamengo, repetingo Paulo César Carpegiani, que em 1981 assim que se aposentou como jogador, tornou-se técnico do time, quando Júnior passou de um de seus companheiros a um de seus comandados.
Depois que a primeira experiência como treinador não deu certo, decidiu se dedicar à sua maior paixão, o futebol de praia, e se envolveu num projeto de internacionalização da prática, organizando os primeiros campeonatos mundias de Beach Soccer, e jogando com a Seleção Brasileira de futebol de areia. Foi cinco vezes Campeão Mundial com a Seleção Brasileira de Beach Soccer, ajudando o esporte a ficar conhecido no mundo inteiro e a ganhar até a chancela da FIFA. Depois do brilho praiano, o Maestro Júnior se retirou de vez e seguiu uma bem-sucedida carreira de comentarista esportivo nas Organizações Globo, maior cadeia brasileira de televisão, trabalhando primeiro na TV fechada, no canal SporTv, e depois na TV aberta, comentando partidas na Rede Globo.
Fez duas breves interrupções na sua carreira na televisão: teve uma experiência frustrada como treinador do Corinthians, cargo que exerceu por apenas três partidas, que culminaram em três derrotas, e aceitou uma segunda passagem como técnico do Flamengo, assumindo o time em parceria com Leandro, que assumiu como seu assistente-técnico.
Duas frases emblemáticas do Maestro definem sua relação com o vermelho e o preto: "a camisa do Flamengo é como a minha segunda pele", e "quem não tiver uma profunda identificação com o Flamengo, profissional e sobretudo pessoal, não durará muito tempo no clube".
Com mais de 850 jogos disputados com a camisa rubro-negra, Júnior é o recordistas em partidas pelo clube e dificilmente será ultrapassado por algum atleta, ainda mais com a constante mudança de camisas que o futebol passou a ter. Por isso e pelos inúmeros títulos conquistados, o craque é uma lenda rubro-negra e presente em qualquer lista com os 11 maiores jogadores do Flamengo de todos os tempos. Acima de tudo, Júnior foi exemplo de jogador dentro e fora de campo, exímio profissional e esbanjou vitalidade em seus 20 anos de carreira. Se faltou uma Copa, não faltou talento, garra, técnica, golaços e atuações magistrais. Um craque imortal. Com o Flamengo, foi Campeão Carioca de 1974, 1978, 1979, 1979 especial, 1981 e 1991; Campeão da Taça Guanabara em 1978, 1979, 1980, 1981 e 1982; Campeão Brasileiro de 1980, 1982, 1983 e 1992, Campeão da Copa do Brasil de 1990; e Campeão da Copa Libertadores da América e do Copa Intercontinental em 1981. E conquistou o Troféu Bola de Prata da Revista Placar nas edições de 1980, 1983, 1984, 1991 e 1992, quando também foi premiado com o Troféu Bola de Ouro.
Com a Seleção Brasileira, disputou as Olimpíadas de 1976 em Montreal e as Copas do Mundo de 1982 na Espanha e de 1986 no México. No total com a camisa da Seleção Brasileira disputou 70 jogos e marcou 6 gols. Uma pena que Leogevildo Lins Gama Júnior não tenha levantado uma taça digna de seu futebol arte com a camisa da Seleção Brasileira. Ah, como ele merecia aquela Copa de 1982. Combinaria demais com seu carisma e sua energia a Taça FIFA reluzindo sob seus braços. Mesmo assim, Júnior se consagrou como um dos mais completos, brilhantes e talentosos jogadores de todos os tempos, e um dos maiores laterais que o mundo já viu. Desarmava adversários como poucos. Batia na bola com extrema precisão. Atacava tão bem quanto tarimbados atacantes. Enxergava o jogo como poucos, descobrindo "atalhos" em campo. E percorria os cantos do campo como só ele sabia.
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