CARPEGIANI: o Vingador Justiceiro
Carreira como jogador: 1969-1977 Internacional; e 1978-1981 Flamengo
Carreira como técnico: 1981-1983 Flamengo; 1983-1984 Al Nassr (Arábia Saudita); 1985 Internacional; 1986 Náutico (PE); 1986-1987 Bangu (RJ); 1989 Internacional; 1989 Náutico (PE); 1990 Coritiba; 1991 Palmeiras; 1991-1992 Cerro Porteño (Paraguai); 1992 Barcelona de Guayaquil (Equador); 1993-1994 Cerro Porteño (Paraguai); 1995 Coritiba; 1996-1998 Seleção do Paraguai; 1999 São Paulo; 2000 Flamengo; 2001 Atlético Paranaense; 2001 Cruzeiro; 2003-2004 Seleção do Kuwait; 2007 Corinthians; 2009 Vitória (BA); 2010 Atlético Paranaense; 2010-2011 São Paulo; 2012 Vitória (BA); 2013 Ponte Preta (SP); 2016-2017 Coritiba; 2017 Bahia; 2018 Flamengo; e 2018 Vitória (BA).
O meio-campista Paulo César Carpegiani não foi um jogador brilhante, mas foi um líder vencedor, com talento mais do que suficiente para ter vestido por algumas partidas a camisa da Seleção Brasileira. Mas foi como treinador que realmente fez história no Flamengo, e logo em seu primeiro trabalho quando, então recém aposentado, assumiu o lugar de Cláudio Coutinho para ser o técnico daquele que até alguns meses antes eram seus companheiros de equipe. E fez história, dando ao Flamengo o primeiro título da Copa Libertadores da América de sua história, e o Mundial Interclubes em Tóquio, no Japão. Depois do belíssimo início, não repetiu o bom trabalho em outros clubes, os títulos não foram muitos, tendo sido campeão paraguaio com o Cerro Porteño em 1992 e em 1994, e campeão baiano com o Vitória em 2009. Seu trabalho de maior destaque foi com a Seleção Paraguaia na Copa do Mundo de 1998, chegando às oitavas de final do torneio.
Como jogador, vestiu vermelho e preto em 223 partidas, marcando 12 gols. Como treinador do Flamengo, comandou o time em 155 jogos (94 vitórias, 34 empates e 27 derrotas). Na primeira passagem, de 1981 a 1983, foram 116 jogos a frente do Flamengo, com 70 vitórias, 26 empates e 20 derrotas. Saiu ao receber uma proposta financeira vantajosa para treinar ao Al Nassr, da Arábia Saudita. Regressou ao Flamengo em 2000, para uma passagem que acabou sendo curta, tendo feito 22 jogos, com 13 vitórias, 5 empates e 4 derrotas. Foi demitido após ser goleado pelo Vasco por 5 x 1 na final da Taça Guanabara daquele ano. Sua última passagem pelo clube foi em 2018, na qual voltou a fracassar após apenas 17 jogos, com 11 vitórias, 3 empates e 3 derrotas.
Abaixo, a mescla de três textos sobre sua carreira, publicados nos sites "Tardes de Pacaembu", "Memórias do Esporte" (de autoria de José Carlos Luck), e "Trivela" (de autoria de Leandro Stein):
Paulo Cesar Carpegiani nasceu em Erechim, no Rio Grande do Sul, no dia 17 de fevereiro de 1949. Como jogador, foi um armador ágil, habilidoso e de muita classe, tinha um estilo de dribles curtos e objetivos, um bom poder de marcação e principalmente com um passe longo de altíssima precisão.
Em novembro de 1966, boatos sobre um rapazola bom de bola que jogava futebol de salão no famoso "Time do Padre", em Erechim, chegaram a Chiquinho, treinador do juvenil do Grêmio, que convidou ao rapaz para um teste no clube. Para evitar possíveis transtornos, o encontro foi marcado na manhã do dia seguinte, no trevo de Porto Alegre, no conhecido monumento da Estátua do Laçador. No outro dia, conforme o combinado, o carro "Aero-Willys" da família Carpegiani seguiu lotado para o destino acertado. No volante Seu Hermínio, ao lado Dona Leda, e atrás os filhos Celso e Paulo César. Ainda longe do destino o carro enguiçou. Impossibilitados de prosseguir viagem, só restava mesmo aguardar o mecânico e torcer para que o árduo trabalho não demorasse muito. Mas o treinador Chiquinho desistiu completamente de esperar pela chegada do tal garoto bom de bola e foi embora.
O início no futebol tardaria um pouco mais então. E seu início foi curioso, como ele próprio contou ao Jornal dos Sports em 1981: "Foi a coisa mais engraçada que me aconteceu. Em 1969, eu morava em Erechim e precisei fazer um curso pré-vestibular para ingressar na faculdade. Foi então que um dirigente do Inter ficou sabendo que estava na cidade um rapaz muito bom no futebol de salão e que poderia ser aproveitado nos juvenis do colorado. Fui chamado para um teste e, apesar de poucas vezes ter jogado no campo, agradei no primeiro treino. Imediatamente os dirigentes do Inter me convenceram a assinar a ficha de amador, o tal contrato de gaveta e passaram a me dar casa, comida e algum dinheiro. Para quem chegou a Porto Alegre sem ter onde morar e recebeu todas essas atenções, tive que ficar deslumbrado. Pouco depois o treinador Foguinho me promoveu aos profissionais, o que foi um deslumbramento total".
As regalias no Internacional, porém, não eram garantias suficientes de que Carpegiani viraria jogador de futebol, ele ainda pensava na faculdade de engenharia e, meses após sua chegada ao clube, voltou a Erechim. A desilusão aconteceu após estrear no time principal e sofrer duas derrotas contra adversários bem menores – um deles, o Montenegro, time amador de Porto Alegre. Nos dias seguintes, ao entrar nos vestiários após um treino, ouviu os companheiros mais experientes criticando os "guris" que não rendiam. Então, fez as malas e retornou ao interior. Mas Abílio dos Reis, técnico dos juvenis, convenceu o jovem a retomar sua trajetória no Beira-Rio. De novo nos juvenis, ele foi Campeão Gaúcho Sub-20 em 1969. No ano seguinte, ganharia sequência nos profissionais pelas mãos de Daltro Menezes. A partir de 1972, foi o técnico Dino Sani quem o transformou em titular absoluto. Ao lado de Falcão, também promovido das categorias amadoras, Carpegiani logo encontrou seu companheiro ideal. Ao lado do cerebral Paulo Roberto Falcão e do vigoroso Caçapava, formou no Internacional um trio de meio-campo que entrou para a história do futebol brasileiro. Ele participou de 7 dos 8 títulos de Campeão Gaúcho (1970, 1971, 1972, 1973, 1974, 1975 e 1976) que o Inter conquistou entre 1969 e 1976, e foi Bi-campeão Brasileiro em 1975 e 1976.
As primeiras convocações para a Seleção Brasileira surgiram em 1973, e sua estreia aconteceu em março de 1974, em um amistoso contra o México. Disputou mais quatro partidas e acabou convocado para disputar a Copa do Mundo de 1974, na Alemanha Ocidental. No Internacional era conhecido como Paulo César, mas ao ser convocado para a Seleção Brasileira, para não criar confusão com o outro Paulo César do time, o Caju, passou a ser chamado de Carpegiani. Reserva de início, ganhou a posição durante a competição e se tornou um dos homens de confiança de Zagallo ao longo da campanha, na qual a Seleção Brasileira terminou com a 4ª colocação, eliminada pela Holanda de Johan Cruyff, uma experiência de peso para o jovem de 25 anos.
Carpegiani fez uma operação no menisco do joelho em 1975. Combinado ao avanço da idade, que ia aos poucos minando sua condição física, a diretoria do Internacional decidiu que era o momento de avaliar sua permanência no clube. Em 5 de março de 1977, ele foi negociado com o Flamengo, naquela que foi a maior transação do futebol brasileiro de até então, vendido por 5,7 milhões de cruzeiros. Experiente, passou a ser um dos líderes do jovem grupo rubro-negro, ao lado de Zico e Júnior, caindo rapidamente nas graças da torcida pela raça e o vigor apresentados em campo. Fez sua estreia com a camisa do Flamengo em 26 de março de 1977 num empate em 1 x 1 contra o Olaria, e seu primeiro gol foi marcado em 26 de maio, na goleada por 7 x 1 diante do Volta Redonda. Titular do meio de campo no time treinado por Cláudio Coutinho, foi Tri-Campeão Carioca e Campeão Brasileiro de 1980. Era tão importante que usava a braçadeira de capitão rubro-negro. Na faixa central, o gaúcho geralmente tinha a companhia de Adílio e Zico, depois com a participação mais frequente de Andrade. No emblemático Carioca de 1978, Paulo César terminou eleito o melhor jogador da campanha, selada pelo inesquecível gol de Rondinelli.
Cláudio Coutinho era o técnico da Seleção Brasileira e possuía seus motivos, cabe dizer. Antes do Mundial da Argentina, Carpegiani passara longos meses se recuperando de lesão. Além disso, em abril, pegara uma toxoplasmose e o tratamento, que durou dois meses, afetou diretamente o seu fôlego. Por isso, o treinador preferiu não o chamar para a Copa do Mundo de 1978. Acabou se arrependendo, como declarou em 1979 à Revista Placar. Sem vestir a camisa da Seleção Brasileira desde 1974, a boa forma no Flamengo levou Carpegiani de volta às convocações, tendo ele participado da Copa América de 1979, titular e ainda capitão da equipe que parou nas semi-finais.
A despedida do Flamengo, como jogador, aconteceu em 15 de setembro de 1981 no Maracanã, com uma vitória por 2 x 0 contra o Boca Juniors, da Argentina, com direito a duelo de camisas 10 entre Zico e Diego Armando Maradona. A aposentadoria dos gramados, aos 32 anos, foi provocada pelo agravamento das contusões nos joelhos. Consciente de que não entregaria o nível de desempenho que almejava, não lamentou, embora houvesse um pingo de desilusão.
A liderança em campo já indicava uma potencial carreira como treinador. Dois anos antes de assumir a prancheta, em entrevista à Revista Placar em fevereiro de 1979, demonstrava a mentalidade que continuaria garantindo seu sucesso no futebol: "Se eu fosse treinador, teria muito a ensinar. Uma: futebol é 50% bola e 50% personalidade. Mostraria, principalmente, como enfrentar os momentos adversos, que são muito mais constantes que as horas de alegria. Ensinaria aos novos e até mesmo a alguns veteranos como resistir sozinho às horas de amargura". O processo de formação do treinador já estava em formação.
Assim que se aposentou dos campos, foi integrado como assistente à Comissão Técnica de Dino Sani, o mesmo que havia sido seu técnico em seu início no Internaciomnal e que era então o treinador do Flamengo. Não tardou muito e Dino Sani foi demitido, no final de julho. Fortemente especulado para assumir como técnico ou do Sport Recife ou do América, o gaúcho deveria ser apenas o interino, enquanto Nelsinho Rosa era dado como nome certo pela imprensa para assumir à equipe. Em 24 de julho, horas depois de assumir a bronca, o ex-volante já estreava no novo cargo e empatava contra o Olimpia pela Copa Libertadores de 81. Só que a chegada de Nelsinho nunca aconteceu, com uma proposta tentadora de um clube do Qatar, que selou sua mudança para o Oriente Médio. Três dias depois da erupção na Gávea, o antigo capitão posava apertando a mão do presidente, efetivado como novo técnico do Flamengo.
Sua ascensão na nova jornada como técnico foi meteórica, não tardando a sacramentar seu sucesso meses depois pelas vitórias sobre Cobreloa e Liverpool. A cumplicidade entre Paulo César Carpegiani e o time do Flamengo fizeram com que aquela incontestável equipe galgasse degraus muito altos. Em poucos meses, levou o Flamengo ao título de Campeão Carioca, Campeão da Taça Libertadores da América e do Mundial Interclubes em 1981. Embalado, o fantástico time rubro-negro comandado por Carpegiani foi Campeão Brasileiro de 1982 no semestre seguinte. Nos 12 primeiros meses de sua carreira de técnico, foi campeão estadual, nacional, sul-americano e mundial, erguendo todos os troféus que estavam a seu alcance para ser conquistados.
Na final da Libertadores de 81, contra o Cobreloa, do Chile, aconteceu um episódio que marcaria a condição de técnico justiceiro atribuída a Carpegiani. Na última partida, em Montevidéu, irritado com a maldade do zagueiro chileno Mário Soto, Carpegiani substituiu Nunes por Anselmo nos momentos finais da partida. A recomendação a Anselmo foi curta e grossa: acertar um soco em Mário Soto. O atacante suplente atendeu ao pedido do treinador e acabou expulso. O Flamengo já vencia o jogo por 2 a 0, placar final.
Ainda a frente do Flamengo, perdeu o título do Carioca de 1982, derrotado na final pelo Vasco, e iniciou a frente do time na campanha do Campeonato Brasileiro de 1983. Porém, em março daquele ano, deixou o Rio de Janeiro ao aceitar uma proposta milionária irrecusável do futebol árabe, indo treinar ao Al Nassr, da Arábia Saudita. Regressou ao Brasil dois anos depois para trabalhar no Internacional, onde não obteve bons resultados. No ano seguinte, em 1986, treinou ao Náutico na Série B do Campeonato Brasileiro. Sem brilhar, passou por Bangu, Coritiba e Palmeiras, além de ter tido segundas passagens por Internacional e Náutico. Sem bons resultados, acabou seguindo para tentar a sorte como treinador no futebol paraguaio. Conseguiu dois títulos nacionais com o Cerro Porteño, passou pelo futebol equatoriano, e voltou a ter destaque na imprensa brasileira quando foi técnico da Seleção do Paraguai entre 1996 e 1998. Montou um time que ganhou respeito na América do Sul, principalmente pelo setor defensivo, que contava com o polêmico goleiro Chilavert, o lateral-direito Arce, e uma dupla de zaga com Ayala e Gamarra. Na Copa do Mundo de 1998, na França, na 1ª Fase empatou sem gols com Bulgária e Espanha, classificando-se às oitavas de final após uma vitória por 3 x 1 sobre a Nigéria, com gols de Celso Ayala, Miguel Ángel Benítez e José Cardozo. Nas oitavas, lutou muito, mas acabou derrotado pela França por 1 x 0, com gol marcado por Laurent Blanc a seis minutos do fim da prorrogação. A anfitriã Seleção Francesa acabaria vindo a ser a campeã.
O trabalho de destaque lhe levou a ser contratado em 1999 sob bastante badalação pelo São Paulo, mas após um bom início, acabou demitido no fim do Brasileirão de 1999. Foi a vez então do Flamengo recontratá-lo. Mas a passagem pela Gávea foi um retumbante fracasso, durando apenas durante a Taça Guanabara, e sendo encerrada após uma vexatória goleada sofrida de 5 x 1 para o Vasco no Maracanã.
Ele ainda passaria por Atlético Paranaense e Cruzeiro, sem conseguir fazer grandes trabalhos. Regressou em 2003 ao Oriente Médio, desta vez para assumir como treinador da Seleção do Kuwait. Em 2007 voltou ao futebol brasileiro, assumindo o time do Corinthians. Nos anos seguintes teve três passagens pelo Vitória, além de ter voltado a trabalhar em Atlético Paranaense e São Paulo, e a treinar Ponte Preta, Coritiba e Bahia. Em 2018 foi contratado para ser Supervisor Técnico do Flamengo, mas com a saída de Reinaldo Rueda, que aceitou convite para treinar à Seleção do Chile, acabou se tornando o treinador da equipe, numa passagem mais uma vez sem sucesso, que durou apenas durante o Campeonato Carioca daquele ano. Seu brilhantismo como treinador na carreira ficou resumido aos trabalhos na primeira passagem no Flamengo e à sua trajetória no futebol paraguaio. Mas deixou seu nome marcado na história do Flamengo.
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