terça-feira, 16 de novembro de 2021

Hall da Fama do C.R. Flamengo: RAUL


RAUL: o Velho e a Voz da Experiência

Carreira: 1964 Atlético Paranaense; 1965 São Paulo; 1966-1978 Cruzeiro; 1978-1983 Flamengo

O goleiro chegou ao Flamengo em 1978 já veterano, aos 34 anos. Havia sido o dono do gol do Cruzeiro entre 1966 e 1978, defendendo tanto a genial geração cruzeirense da segunda metade dos anos 60, com Dirceu Lopes, Tostão e Natal, quanto o time campeão da Copa Libertadores da América de 1976, com Nelinho e Palhinha. No Flamengo, ele ficou por cinco anos, até o final de 1983, quando se aposentou. De seus companheiros no elenco rubro-negro ganhou o apelido de "o Velho". No seu comçeço em vermelho e preto, ele não foi titular, mas, predestinado, era o titular no período das maiores conquistas da história rubro-negra, entre 1980 e 1983. Sagrou-se Campeão Mundial com o Flamengo já aos 37 anos, em 1981. Aposentou-se às vésperas de cumprir 40 anos com a faixa de Tri-campeão Brasileiro ainda no peito.

Como jogador do Flamengo, ele fez 227 jogos.


Abaixo, texto sobre a carreira do goleiro escrito por José Carlos de Oliveira para o site "Memórias do Esporte":

Raul Guilherme Plassmann nasceu dia 27 de setembro de 1944 na cidade de Antonina, no Paraná. Ele foi um goleiro que marcou época no futebol brasileiro, fazendo parte de dois dos maiores times da história do Brasil e do mundo: o Cruzeiro das décadas de 1960 e 1970 e o Flamengo dos Anos 1980. Pode se dizer que ele foi um predestinado, pois estava na hora certa e no lugar certo, e sempre foi um dos pontos de segurança das duas equipes.

Raul começou no juvenil do Atlético Paranaense, depois teve passagem pelo São Paulo Futebol Clube. Sua estréia como profissional foi num clássico contra o Palmeiras, em 1965, no qual o tricolor foi derrotado por 5 a 0. Mas o destino estava ao seu lado e logo o levaria para Belo Horizonte. Ele disputou apenas 9 partidas com a camisa sãopaulina.

Quando o goleiro Fábio Medeiros, do Cruzeiro - um dos 47 jogadores que Vicente Feola havia convocado para os preparativos com vistas à Copa do Mundo de 1966 - foi negociado ao São Paulo, o presidente do Cruzeiro, que era uma raposa na arte da negociação, telefonou para o dirigente do São Paulo, Henry Aidar, perguntando se não havia algum jogador para ser colocado como contra-peso na negociação de Fábio. O dirigente são-paulino citou alguns nomes, dentre eles o de Raul. Passando-se por mal informado, Felício respondeu: "Pode mandar esse aí, mesmo". No entanto, o que Felício não poderia prever é que estava contratando um dos maiores carismas da história do clube. Em plena década de 60, o jovem goleiro descendente de alemães tornou-se um símbolo sexual em Belo Horizonte e arrastou uma multidão de mulheres para a torcida do Cruzeiro.

Raul chegou ao Barro Preto - nome do estádio do Cruzeiro daquela época - sem qualquer festa, apenas para compor o elenco. Com muita competência e uma ótima colocação, além de saber acionar um contra-ataque como poucos, ele foi ganhando espaço e não saiu mais do time celeste. Foram 9 títulos mineiros em 12 anos no clube. A carreira de Raul também ficou marcada pela camisa amarela que usava, coisa inédita no futebol brasileiro. E a moda que ele lançou, foi num clássico contra o Atlético Mineiro, quando lhe deram uma camisa de goleiro no vestiário que não lhe servia. Pegou emprestado uma blusa de frio amarela, do lateral Neco e improvisou, com fita crepe, o número 1 nas costas.

Naquele dia, Raul fechou o gol e, supersticioso, creditou a sorte à camisa, que passou a ser a sua marca registrada. Assim, de maneira espontânea, Raul lançou a moda dos uniformes com cores para os goleiros numa época em que eram cinzas ou pretas. Passou a ser conhecido como o "goleiro da camisa amarela" e a torcida adotou a cor nas bandeiras azuis e brancas. A vida de Raul começou a ser mudada no ano de 1966, quando o Cruzeiro sagrou-se Campeão da Taça Brasil daquele ano. Este foi sem dúvida alguma, o título que projetou o Cruzeiro para o mundo, pois conquistou o título em cima do poderoso Santos, que tinha na época um time sensacional, com Gilmar, Zito, Mengalvio, Edu, Pelé e cia. Até então somente se falava nos clubes do Rio e São Paulo, principalmente, no time de Pelé.

Indiferente à descrença geral, Raul e seus companheiros, preocuparam-se apenas em impor aos adversários o ritmo de jogo do Cruzeiro naquela Taça Brasil. Aquela competição teve duas partidas para decidir o título. A primeira aconteceu em Belo Horizonte, com vitória do Cruzeiro por 6 a 2. A segunda foi no Pacaembu, e o time mineiro venceu novamente por 3 a 2, com gols de Tostão, Dirceu Lopes e Natal. Neste dia, o Cruzeiro jogou com: Raul, Pedro Paulo, William, Procópio e Neco; Wilson Piazza e Dirceu Lopes; Natal, Tostão, Edvaldo e Hilton Oliveira. Com grandes atuações e um ótimo senso de colocação, Raul conquistou um recorde nacional de 1.101 minutos sem levar gols em 1969, com mais de 10 partidas invictas. Ele também sempre recordava com orgulho que defendeu todos os pênaltis do rival Atlético no tempo normal de jogo. Foram 5 ao todo! Ídolo da massa, Raul também chamava a atenção pelas suas declarações causando e até polêmicas, tendo chegado a dizer que não estava relacionado para a Copa do Mundo de 1970 porque o sucesso com as mulheres incomodava os invejosos.

Sua principal conquista com o Cruzeiro aconteceu em 1976, quando a equipe mineira levantou a Taça Libertadores da América, que, até então só tinha sido conquistada por uma equipe brasileira: o Santos de Pelé. Como acontece sempre na competição sul-americana, foi uma campanha sofrida até a final contra o River Plate, da Argentina, em três partidas. No 1º jogo, uma goleada histórica e implacável no Mineirão por 4 a 1, seguida por uma derrota por 2 x 1 em Buenos Aires. No jogo desempate, em Santiago, no Chile, o Cruzeiro venceu por 3 a 2 e conquistou a América. O time celeste: Raul, Nelinho, Morais, Darci Menezes e Vanderlei; Wilson Piazza, Zé Carlos e Eduardo; Jairzinho, Palhinha e Joãozinho.

Aquela geração fantástica do Cruzeiro foi então parando e o time sendo desmontado. Raul chegou a pensar em voltar para o Paraná e se aposentar, mas foi convencido pelo técnico Cláudio Coutinho a se mudar para o Flamengo em 1978 e ser a voz da experiência em um time jovem formado por Zico, Júnior, Leandro e cia. E jogando pelo Flamengo, os títulos foram se sucedendo com os estaduais logo de cara em 78 e 79. Não demorou muito para Raul se tornar ídolo também da torcida rubro-negra.

Mesmo não sendo um goleiro que dava espetáculo, era muito inteligente, disciplinado e eficiente. Raul ainda garantiu mais três títulos brasileiros (80, 82 e 83) e venceu a sua segunda Taça Libertadores em 81, em outra final em três partidas contra o Cobreloa, do Chile. No Mundial Interclubes, o goleiro não foi vazado pelos ingleses do Liverpool e contando com o talento no ataque de Zico, Adílio e Nunes, juntou mais um troféu para a sua grande coleção. Com a camisa do Flamengo, Raul atuou em 227 jogos (131 vitórias, 57 empates e 39 derrotas). Pela Seleção Brasileira, foram 11 partidas: 9 vitórias e 2 derrotas; e 7 gols sofridos. Poderia ter sido o goleiro da Copa do Mundo de 1982, mas pesou contra ele os 38 anos que já carregava naquele momento da carreira.

Raul também tinha a sinceridade como ponto forte, apontava falhas de sua equipe em entrevistas e dizem que foi por falar demais que ficou de fora da Seleção Brasileira de 82. Em certa oportunidade, ele admitiu: "prefiro treinar pouco e jogar muito". Para Telê Santana, foi o suficiente para não convocá-lo para o time de estrelas do Brasil. Raul admitiu em sua despedida que não disputar uma Copa do Mundo foi a maior tristeza de sua carreira.

Em sua despedida do futebol, em 20 de dezembro de 1983, num amistoso entre o Flamengo e a Seleção de Amigos do Raul, formada por vários craques da época, aos 39 anos, o goleiro vestiu a camisa amarela pela última vez. Ao sair de campo, Raul a tirou e a devolveu ao mesmo Neco.

Depois da aposentadoria nos gramados, Raul trabalhou como comentarista esportivo na Rede Globo, no canal de TV fechada SporTV, na Rede Record e na Rádio CBN de Curitiba.

Ele chegou a tentar a carreira de treinador. Em 2003, foi auxiliar de Marinho Peres no Juventude, de Caxias do Sul, e depois da saída do técnico, assumiu a função, mas deixou o clube gaúcho antes do fim da temporada.

Mesmo tendo brilhado tanto tempo e vivido grandes experiências, Raul conta qual sua passagem mais inesquecível: "estávamos em 1971. O jogo era Palmeiras e Cruzeiro no Parque Antárctica, chovia uma barbaridade, era noite, difícil para o goleiro. Lembro muito bem. O árbitro era o Armando Marques. 21:15h e bola rolando, 35 minutos, escanteio contra nós. Edu Bala vai cobrar e o César está na área. Cobrança feita e a bola partiu, veio mais ou menos na altura da marca do pênalti. Parti também, cheguei nela lá em cima, bola pesada, não deu prá segurar, ela escapa das mãos. Atrás de mim estava o César, grande goleador; ele domina a bola e vai girar pra fazer o gol. Ajo rápido, puxo a atacante pela camisa e ele vai caindo. Pego a bola, dou uma olhadinha para o lado e vejo o árbitro Armando Marques junto ao gol. Pensei, ele vai marcar pênalti. Preocupado jogo a bola a meia altura e dou um chutão pra frente, e o Armando nada. Vinte anos depois, durante um vôo São Paulo–Rio de Janeiro, encontrei-me com Armando Marques, então resolvi tirar com ele uma dúvida que me encasquetava há tantos anos. Nós dois aposentados há anos. Quis saber do Armando por que ele não deu aquele pênalti escandaloso que cometi no César Maluco, naquele Palmeiras e Cruzeiro, com muita chuva, em São Paulo. Lembrei-lhe que agarrei a perna do César na pequena área e ele, Armando, estava muito perto, viu tudo e nada marcou. César, então livre, ia fazer o gol após superar o Piazza. Então perguntei o por quê? Aí, ele (homossexual assumido desde o tempo de arbitragem) respondeu: 'Tolinho, não marquei porque o César era muito feio, barbudo, chato, cabeludo, reclamão, e você, sob a chuva, de camisa amarela molhada, cabelos loiros e o corpo maravilhoso torneado com tecido a moldá-lo parecendo um Deus grego, você acha que eu teria coragem de cometer tal barbaridade?' Ouvi calado e pensativo, agradeci muito e voltei para minha poltrona".

Uma carreira abençoada, repleta de títulos: Campeão Mundial Interclubes em 1981; Bi-Campeão da Copa Libertadores da América em 1976 e 1981; Campeão Brasileiro em 1980, 1982 e 1983; Campeão da Taça Brasil em 1966; Campeão Mineiro em 1966, 1967, 1968, 1969, 1972, 1973, 1974, 1975 e 1977; e Campeão Carioca em 1978, 1979.I, 1979.II e 1981. É incrível: entre 1966 e 1983, Raul só não levantou taça em 1970 e 1971!



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