ADÍLIO: o Muleque Bom de Bola
Carreira: 1975-1987 Flamengo; 1987-1988 Coritiba; 1989-1990 Barcelona de Guayaquil (Equador); 1991 Itumbiara (GO); 1992-1993 Alianza Lima (Peru); 1994 América de Três Rios (RJ); 1995 Serrano (RJ); 1996 Barreira (RJ); 1997 Friburguense (RJ)
O craque da camisa 8. Fiel escudeiro de Zico na condução do meio de campo no apogeu da história do futebol do Flamengo. Jogador de rara habilidade, muita velocidade, dribles desconcertantes, e muito decisivo. Um homem e ser humano com uma história de superação na vida fantástica. E um jogador leal: em mais de 600 jogos pelo Flamengo, nunca foi expulso, e só em três oportunidades recebeu cartão amarelo.
Como jogador do Flamengo, ele fez 617 jogos, e marcou 129 gols.
Abaixo, a combinação de trechos de diferentes textos sobre a carreira do jogador, escritos por Jill Muricy para o site "Meu Nome é Superação", por José Carlos de Oliveira, para o site "Memórias do Esporte", e por um artigo do site "Redação Rubro-Negra":
Adílio de Oliveira Gonçalves nasceu dia 15 de maio de 1956, na cidade do Rio de Janeiro. Nascido e criado na comunidade da Cruzada São Sebastião, uma comunidade de baixa renda situada a uma quadra da sede do Flamengo. A Cruzada é uma "favela vertical" criada em 1955 para moradores da Favela da Praia do Pinto, que ficava localizada onde posteriormente foi construído o conjunto de edifícios chamado de "Selva de Pedra", de cujas janelas é possível ver o campo do Estádio da Gávea. A Cruzada São Sebastião fica localizada à margem oeste do Jardim de Alá, que separa os bairros do Leblon do de Ipanema, a poucas quadras da Lagoa Rodrigo de Freitas. É uma comunidade de baixa rena entranhada no coração da região de maior poder aquisitivo da cidade, na Zona Sul do Rio de Janeiro.
Adílio era o caçula entre três filhos homens do primeiro casamento de Dona Alaíde, uma mulher batalhadora, que sempre trabalhou pesado para dar o melhor aos filhos. A vida começou a provar a resistência emocional de Adílio desde muito cedo. Aos quatro anos ele perdeu o pai, e a partir daí Dona Alaíde começou a trabalhar em dois empregos: às 5 horas da manhã limpava um salão de beleza e logo após ia trabalhar como empregada doméstica na casa de um casal de médicos. Ambos os empregos eram no Leblon. Ela sempre levava Adílio para o serviço, e por isso o garoto sonhou ser médico. Os patrões desenvolveram um afeto tão grande, que se tornaram padrinhos de batismo dele.
Depois que ficou viúva, Dona Alaíde se casou novamente e teve mais três filhos homens. Adílio era um menino dócil e ajudava a mãe com as tarefas do lar. Além do sonho de ser doutor, o menino Adílio também alimentava outra paixão: jogar bola. O garoto teve uma infância simples e feliz na comunidade onde morava. Foi lá onde, com seis anos, ele conheceu e fez amizade com o garotinho Júlio César da Silva Gurjol, o Julinho, que mais tarde seria o ponta-esquerda camisa 11 do Flamengo "Júlio César, o Urigeller", titular do time campeão brasileiro de 1980. Entre os amigos, o menino Adílio ganhou o apelido de "Pelézinho". Foi o amigo Julinho quem chamou Adílio para ir fazer um teste no Flamengo, porém ele teria que pular o muro, pois não tinha carteirinha para entrar no clube. Foi fugindo dos seguranças do clube que ele foi testado, aprovado, e nunca mais saiu do Flamengo.
Mas a vida foi sempre cercada de muita dificuldade: Paulo Roberto, seu irmão mais velho, foi ao cinema com a namorada e na saída um homem os assaltou e levou a bolsa da jovem. Seu irmão correu atrás do assaltante para impedir o furto, porém levou três tiros na Praia do Leblon e morreu no local. A tragédia fez o garoto faltar por diversas vezes aos treinos, sem ânimo de jogar, quase abandonando ao futebol. Pouco depois, quando estava com 14 anos, sua mãe faleceu. Órfão de pai e de mãe, e sem o irmão mais velho... as circunstâncias estavam levando tudo que ele tinha de mais precioso na vida. Seu padrasto se foi e levou os três irmãos mais novos. O guerreiro Adílio encontrava-se então apenas com seu irmão do meio Adílson. A difícil história de vida levou a TV Globo, anos depois quando Adílio já era um craque vencedor com a camisa do Flamengo, a contar sua história num dos episódios da série "Caso Verdade". Batalhador, o rapaz foi adiante, formou-se em Educação Física, casou-se e foi pai de três filhos. Uma história que sem qualquer título ou taça, já seria a de um vencedor. E falta narrar, no entanto, tudo que ele conquistou no futebol.
A rara habilidade do drible e da condução de bola marcaram a carreira de Adílio. Um jogador também de muita criatividade e dono de um passe perfeito. Consagrou a camisa 8 do Flamengo! Foi titular no time profissional de 1977 até 1986 quase que ininterruptamente. Foram 24 anos como jogador do Flamengo com a conquista de 24 títulos, ou seja, um para cada ano. Foi 6 vezes Campeão da Taça Guanabara (1978, 1979, 1980, 1981, 1982 e 1984), 3 vezes Campeão da Taça Rio (1983, 1985 e 1986), 5 vezes Campeão Carioca (1978, 1979.I, 1979.II, 1981 e 1986), 3 vezes Campeão Brasileiro (1980, 1982 e 1983), e foi Campeão da Copa Libertadores da América e do Mundial Interclubes em 1981. Foi ainda Campeão do Troféu Palma de Mallorca, duas vezes do Troféu Ramon de Carranza, do Troféu Ciudad de Santander e do Torneio de Nápoles. Jogar no Flamengo foi o maior orgulho da sua vida!
Nas categorias de base usava a camisa 10, numa geração na qual também subiram para o profissional Andrade, Tita e seu amigo Júlio César. Quando chegou ao profissional, porém, a camisa 10 já tinha dono: Zico. Adílio então passou a usar a 8.
Em mais de 600 jogos com a camisa rubro-negra, Adílio nunca foi expulso, e só levou 3 cartões amarelos, motivo de orgulho pro jogador. Mas ele mesmo contou a única vez na carreira em que foi violento em campo: "certa vez numa partida realizada na Espanha, tinha um jogador argentino que me deu uma cotovelada e me xingou". Malandro nascido e criado em comunidade, Adílio esperou o momento certo para se vingar: "num escanteio, na hora que o jogador bateu na bola e fez barulho, foi a hora de dar um soco que ninguém viu, só ficou o argentino caído na área".
Gols importantes foram uma marca na carreira de Adílio. Na campanha da Libertadores de 81, ele esteve em campo em todas as 13 partidas do Flamengo na competição, tendo convertido 3 gols, o primeiro contra o Olímpia, do Paraguai, ainda na primeira fase, numa partida difícil realizada no Maracanã, na qual seu gol selou o placar final da partida num empate por 1 x 1. O segundo gol dele naquela competição foi em Cochabamba, no altiplano boliviano, numa vitória por 2 x 1 contra o Jorge Wilsterman pela segunda fase. Seu terceiro gol foi no jogo de volta contra os mesmos bolivianos, onde no Maracanã o Flamengo garantiu sua vaga como finalista do principal torneio sul-americano ao vencer por 4 x 1 ao Jorge Wilsterman. Ainda naquele inesquecível ano de 1981, Adílio continuou mostrando sua sorte e competência em marcar gols importantes: marcou um dos gols do Flamengo numa goleada de 6 x 0 sobre o Botafogo e em dezembro de 81, botou os ingleses na roda, fazendo um dos gols do três a zero no Liverpool que ficou marcado na história, e tendo uma de suas maiores atuações com a camisa rubro-negra. Teve outra atuação fenomenal, na qual também marcou um gol, na final do Campeonato Brasileiro de 1983, o terceiro gol do Flamengo na goleada por 3 x 0 no Maracanã que sacramentou o título.
Adílio fez apenas dois jogos na Seleção Brasileira: tinha disputado uma partida em 1979, e em 1982, em um amistoso contra a Alemanha, foi muito bem na partida, dando o passe para que Júnior marcasse o gol, e recebendo nota 10 dos jornais como o melhor jogador em campo. Estava tudo a seu favor, muita gente acreditou que ele estava praticamente garantido na Copa da Espanha, e ele mesmo achou que estava a um passo de realizar o sonho, mas no momento final ele não foi chamado.
Depois de sair do Flamengo, em 1987, foi disputar a Copa União pelo Coritiba. Jogou em seguida pelo Barcelona de Guayaquil, onde se sagrou Campeão Equatoriano de 1989. Quando jogava pelo Itumbiara, de Goiás, foi fazer um amistoso no Peru, e "acabou com o jogo", marcando um gol e dando o passe para outro. Quando a partida acabou, um dirigente do Alianza Lima o chamou e disse que ele não iria embora, de jeito nenhum. Eles encerraram seu contrato no Brasil e ele ficou jogando por lá. Já em fim de carreira, disputou alguns Campeonatos Cariocas por times do interior do estado do Rio de Janeiro. Com o Friburguense, conquistou o título de Campeão da Segunda Divisão do Campeonato Carioca de 1994, tendo participado de 14 partidas e feito 1 gol, já com 38 anos.
Após pendurar as chuteiras, preparou-se para a carreira de treinador. Em 2003 aceitou ao convite do Flamengo para assumir o comando da categoria de juniores (sub-20) do clube. Tendo a ele como técnico, a garotada rubro-negra foi Tri-Campeã Carioca de Juniores em 2005, 2006 e 2007, foi Campeã da Copa TV Cultura Rio-São Paulo Sub-20 em 2005, foi Bi-Campeã do Torneio Octávio Pinto Guimarães em 2006 e 2007, segunda competição mais importante da categoria no Rio de Janeiro, e pela terceira vez na história do clube foi Campeã da Taça Belo Horizonte de Juniores, em 2007. No Campeonato Carioca de 2006, o Flamengo iniciou nos dois primeiros jogos com um time alternativo, em sua maioria formado por jogadores da base, e Adílio foi o treinador nestas duas partidas, das quais o time saiu com duas derrotas. Talvez esta experiência ruim tenha comprometido seu futuro como técnico de futebol. Mas ele nunca se desligou do clube, e durante os Anos 2010 trabalhou como Gerente de Projetos Especiais do Flamengo.
De forma um tanto prematura, aos 68 anos de idade, Adílio faleceu em 5 de agosto de 2024 em decorrência de um câncer de pâncreas. O número 8 que o imortalizou no Flamengo caiu de lado, e de lado na terra tornou-se símbolo do infinito, do tamanho que Adílio teve dentro da história rubro-negra!
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