sábado, 7 de maio de 2022

A NAÇÃO (2ª edição) - Apresentação


A NAÇÃO

Como e por que o Flamengo se tornou

o clube com a maior torcida do Brasil



Apresentação


Muito já foi dito e escrito, mas efetivamente pouco se comprovou sobre por que o Clube de Regatas do Flamengo se tornou uma paixão nacional, a maior paixão de massas do país, uma das maiores do mundo. Há várias versões: uns dizem que a razão da força do Flamengo vem do tempo em que a rádio Nacional passou a transmitir futebol para todo o Brasil; outros afirmam que tudo foi consequência das conquistas na era Zico; e ainda há teses conspiratórias a sugerir que a grandeza do clube foi forjada pelas câmeras da Rede Globo de Televisão. Entre muitos e diferentes pontos de vista, há argumentos falsos e equivocados e um monte de meias verdades. Muitas pistas já foram diagnosticadas, mas são peças isoladas de um quebra-cabeça. Sempre houve dúvidas sobre as verdadeiras e concretas razões. Aqui, nesta obra, serão reunidos fatos, em busca da verdade.

Para entender a dimensão do Flamengo, é preciso voltar ao início do século XX e considerar os projetos para construção do Rio de Janeiro, então capital federal, como o alicerce de um projeto de crescimento nacional. Para entender por que o Flamengo, é preciso também vasculhar o espírito da cidade e de seu povo. Mas, acima de tudo, é impossível correlacionar todos os fatos sem entender a história do clube e suas raízes nos tempos de amadorismo.

O Flamengo foi montado por um grupo de jovens ousados que desafiavam o poder da aristocracia e do espírito ainda vivo dos colonizadores na sociedade brasileira, remexendo nos traumas desta sociedade colonizada. Para entender como e por que o Flamengo ficou tão grande, é preciso uma profunda averiguação histórica. Só assim é possível compreender a mística popular que as cores de sua camisa representam.

Esta obra revisita o passado. Busca elementos na literatura deixada pelo jornalista Mário Filho, o primeiro que, ainda durante os anos de 1940, tentou explicar de onde vinha a força por trás do vermelho e do preto daquela camisa de futebol. Na introdução de seu livro “Histórias do Flamengo”, o jornalista Mário Filho escreveu, ainda em fins dos anos 1940: Ninguém discute que o Flamengo seja o clube mais popular do Brasil. Quem é Flamengo prefere dizer o mais querido. Está certo: escolhe-se um clube como se escolhe um cônjuge. Para toda a vida ou até que Deus separe. É mais difícil deixar de amar a um clube do que a um cônjuge. Qualquer um de nós conhece mais bígamos ou polígamos do que torcedores que mudaram de clube. Ou que o traíram, mesmo que em pensamento. Talvez porque um clube nunca se entrega a um torcedor. O torcedor é que se entrega ao clube ou ao amor por ele. Também pode ser porque o sex appeal do clube não se desgasta com os anos. Daí que exista um amor como de lua de mel: violento, absorvente, exaustivo.

O que se oferece nestas páginas é uma viagem pelo tempo para entender como esta mística se formou. O ponto de partida para esta busca é a descrição do espírito de juventude que fundou a República Paz e Amor, na praia do Flamengo, um ato imerso em um sentimento jovial de uma república recém-proclamada no Brasil. Aquele espírito malandro e disruptivo ganhou a simpatia dos cariocas e ali fincou a sinergia com a multidão, já nos primórdios do clube. O Rio de Janeiro, que naqueles tempos era forjado como espelho da brasilidade, projetou essa paixão para todos os cantos do território brasileiro e o fez de uma forma que nenhuma outra paixão nacional até os dias de hoje experimentou. O rádio difundiu o sonho. Mas nada teria causado tamanho impacto em tantos corações brasileiros se não houvesse vitórias, glórias e heróis, e aí é preciso se aprofundar nas entranhas históricas deste clube, procurando entender e juntar as peças nas idas e vindas que moldaram sua trajetória.

O livro se divide em onze capítulos, distribuídos em três grandes blocos que o pavimentam. No primeiro bloco, o objetivo é demonstrar como o Flamengo se tornou o Mais Querido do Brasil. Para tal, é preciso penetrar na história do país e do Rio de Janeiro, mostrar os porquês e levar o leitor a tirar suas conclusões.

O segundo bloco narra a montagem do melhor time que já vestiu a camisa rubro-negra, buscando diagnosticar o que é preciso para ser grande. No terceiro e último bloco, aprofunda-se a discussão sobre como se manter grande no futuro, uma vez que a realidade do mundo e do esporte – mais globalizados – mudou completamente, impondo desafios inteiramente novos.

O primeiro capítulo é “A raiz vermelha e preta”. Nele estuda-se o contexto histórico no qual nasceu aquele clube de remo na praia do Flamengo, imerso no contexto social de um Rio de Janeiro completamente distinto do atual. A análise remonta à história e às conquistas do remo rubro-negro e as dificuldades daqueles jovens que fundaram o clube em se firmar frente a seus concorrentes, sob uma completa escassez de recursos. É nesse momento que se forma o espírito desbravador que conquistará a multidão dali para a frente. Com um espírito vanguardista, força de vontade e superação, o vermelho e preto foi se impondo sobre os clubes mais ricos da cidade. As barreiras do capital e a falta de um estádio próprio nas mesmas proporções dos que tinham seus rivais nunca foram um impeditivo.

O segundo capítulo, “A era amadora”, conta a história do nascimento do futebol do Flamengo, promovida por um grupo de jovens boêmios, rebeldes e descompromissados. Pouco depois, surgiu o Vasco, clube bancado pela colônia portuguesa, com muito dinheiro e um desempenho inicial avassalador. Aquilo mexeu com os brios dos brasileiros. O Brasil, como república nascente, vivia os anseios de romper as correntes que o amarravam a Portugal, virando a página de seu passado como país colonizado. E será exatamente o Flamengo – aqueles moleques malandros da República Paz e Amor – que vai derrubar os colonizadores de sua égide de vitórias. Ali, o clube começa a crescer no conceito popular. O espírito de juventude desbravadora dos alicerces rubro-negros se equiparava bravamente às oligarquias que davam as ordens nas Laranjeiras e aos abastados portugueses que se esforçavam para se mostrar mais fortes e evoluídos que as coisas das terras brasileiras.

Mas não foi fácil se impor. Entre 1928 e 1931, o clube teve seus primeiros dias de martírio, com resultados vexatórios. Parecia que o Flamengo estava ficando para trás: Vasco, Fluminense, Botafogo e América despontavam como os grandes clubes da cidade. A raiz vermelha e preta, entretanto, foi buscar seu reerguimento em meio à multidão. Os dois primeiros capítulos, em especial, vão reviver e procurar respostas na obra de Mário Filho, resgatando preciosidades esquecidas pelo tempo.

O título do capítulo 3 fala por si só: “Nasce o mais querido do Brasil”. Entre 1936 e 1955, o clube solidifica seu apelo popular e mexe com as paixões em nível nacional. Inicialmente, por conta de um bem arquitetado plano estratégico para se tornar o maior do Brasil. Eram tempos em que os jogadores argentinos constituíam figurinhas repetidas dentro de campo no Flamengo, e havia treinador europeu no banco de reservas. O espírito rubro-negro fervia desde o Café Rio Branco até a Confeitaria Colombo. O Flamengo não era a elite rica, nem classe média, nem a camada mais pobre. O Flamengo não representava a Zona Sul, apesar de estar nela, e jamais foi Zona Norte. Mas o Flamengo tocava no espírito do Rio de Janeiro – carnavalesco, malandro, descarado, libertino – e com isto penetrou a elite rica, a classe média, a massa, o povão, da Zona Sul à Zona Norte. Conquistou o Rio inteiro. A cidade que era a capital federal, que era onde se encontravam os representantes de todos os estados do país, que era o berço do samba, a pérola do Atlântico, onde Hollywood vinha passar suas férias. A alegria festiva das arquibancadas, que a torcida rubro-negra, desde os primórdios, fazia como ninguém, correu o Brasil pelas ondas do rádio, fazendo brasileiros de todos os cantos fantasiarem aquela festa que não era tão comum em seu cotidiano. O Flamengo não só tocava a identidade carioca como tocava a identidade nacional, e, assim, conquistou o país inteiro. Fechando o primeiro bloco, no quarto capítulo, viaja-se pelos “Anos românticos” do futebol carioca. O samba e a bossa nova se firmam como expressão máxima de brasilidade. O Maracanã é o palco que atrai as multidões. Nélson Rodrigues traz poesia ao futebol. O Rio de Janeiro vive, social e culturalmente, seu apogeu.

Os dois capítulos seguintes compõem o segundo bloco, no qual se busca entender como se produziram as grandes equipes. O capítulo 5, “Anos dourados”, narra, passo a passo, todos os detalhes que levaram à formação do time que mais deu glórias ao Flamengo em toda sua história. E o capítulo 6, “Anos de sombra”, tem como pano de fundo a eterna esperança de se reviver um período de tantas glórias. Nestes anos, o clube viveu à sombra daquele time que ganhou tudo que estava ao seu alcance.

Já no capítulo 7, “O centenário do clube”, é aberto um parêntese entre o segundo e o terceiro blocos para exaltar as grandes glórias dos esportes olímpicos do clube e a importância que isso teve no processo de conquistar o coração das multidões.

O último bloco, formado pelos capítulos 8, 9 e 10 – “Anos de extremos” (1996-2001), “Anos de martírio” (2002-2006) e “Anos de reconstrução” (2007-2012) – propõe reflexões a respeito do que é necessário para se perpetuar toda essa grandeza. A estrutura do futebol mudou radicalmente, com os custos se multiplicando dramaticamente. Mais do que nunca, manter-se grande iria requerer escolhas certas e estratégicas. O futebol se tornou o maior negócio do mundo e não havia como escapar às consequências desse fenômeno. Porém, são fundamentais as lições do passado. O livro termina com um bônus: o capítulo XI, “Heróis da nação multidão”, só recomendado para os verdadeiros amantes da história do futebol.




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