terça-feira, 21 de junho de 2022

Maiores Jogos da História do Flamengo: 23/11/19 - Flamengo 2 x 1 River Plate




Jogos Inesquecíveis: 23/11/2019 - Flamengo 2 x 1 River Plate

Certamente é o jogo mais emocionante da história do Flamengo. Com certeza um dos mais, senão o mais, emocionante da história do futebol na América do Sul, e certamente um dos mais da história do futebol mundial! O Flamengo retornava à final da Copa Libertadores da América após 38 anos, e enfrentava o então campeão River Plate em Lima, no Peru, naquela que era a primeira vez na história na qual a final da principal competição sul-americana seria disputada em jogo único. Logo no início da partida, os argentinos saíram em vantagem, e a mantiveram ao longo de toda o jogo. A apreensão crescia à medida que o tempo evoluía e o placar não era mais mexido. Quando parecia que o destino do jogo já estava selado, e que a taça tomaria o rumo de Buenos Aires, aos 43 minutos do 2º tempo, quase 44, o Flamengo conseguiu o gol de empate que levaria a partida para a prorrogação. Por si só, já era um marco histórico e emocionante. Mas a epopeia se fez ainda mais histórica, emocionante, e marcante, porque três minutos depois o Flamengo marcou de novo. Uma virada inacreditável, de êxtase e euforia, uma explosão de emoções coletivas que selaram um jogo histórico e inesquecível para todos que o assistiram. Em especial para os rubro-negros, mas certamente um momento guardado para sempre nas memórias de todos os amantes do futebol.




Ficha Técnica
23/11/2019 - Flamengo 2 x 1 River Plate
Local: Estádio Monumental, Lima, Peru
Gols: Rafael Borré (14'1T), e Gabriel Barbosa (43'2T) e (45+1'2T)
Fla: Diego Alves, Rafinha, Rodrigo Caio, Pablo Marí e Filipe Luís; Willian Arão (Vitinho), Gérson (Diego Ribas), Giorgian De Arrascaeta (Piris da Motta) e Éverton Ribeiro; Bruno Henrique e Gabriel Barbosa.
Téc: Jorge Jesus
River Plate: Franco Armani, Gonzalo Montiel, Lucas Martínez Quarta, Javier Pinola e Milton Casco (Paulo Díaz); Exequiel Palacios, Enzo Pérez, Ignácio "Nacho" Fernández (Julián Álvarez) e Nicolás De la Cruz; Matías Suárez e Rafael Borré (Lucas Pratto).
Téc: Marcelo Gallardo






A História do Jogo

Foi numa tarde de sábado que o Flamengo entrou em campo para voltar a disputar uma final de Copa Libertadores da América no Estádio Monumental, pertencente ao Uiversitário, na cidade de Lima, no Peru. Enquanto na capital peruana a arquibancada, em sua lotação máxima, estava dividida entre rubro-negros e alvi-rubros, naquele momento o Maracanã recebia aproximadamente 50% de sua capacidade para ver a partida transmitida por diversos telões gigantes espalhados à beira do gramado.

Havia sido justamente num dia 23 de novembro, só que de 1981, que o Flamengo havia feito 2 a 0 sobre o Cobreloa, do Chile, no Estádio Centenário, em Montevidéu, no Uruguai, e sido campeão da Libertadores pela primeira vez. Exatos trinta e oito anos depois, em solo peruano, a camisa vermelha e preta entrava para lutar por repetir àquele feito. E enquanto o Flamengo lutava para ser campeão pela segunda vez, o River Plate tentava seu quinto título da Libertadores.

As duas equipes entravam em campo com suas respectivas forças máximas. O Flamengo apostava no esquema 4-3-3 que Jorge Jesus utilizava com perfeição ao longo de toda a temporada, enquanto o River, do técnico Marcelo Gallardo, embora tivesse testado um esquema com três zagueiros, ia a campo com o mesmo 4-4-2 que havia utilizado nas fases anteriores.

Aqueles dois eram indiscutivelmente os dois melhores times de futebol da América do Sul naquele momento. Era o duelo entre a força ofensiva de Gabigol e BH contra a solidez da dupla de zaga formada pelo veterano Pinola (36 anos) e pelo jovem Martínez Quarta (23 anos), a batalha no meio entre a fluidez e a objetividade de Enzo Pérez e Nacho Fernández, contra a agilidade e a criatividade de Arrascaeta e Éverton Ribeiro. Tudo sob um jogo de tabuleiro entre dois treinadores amantes de armações táticas ofensivas, o argentino Marcelo Gallardo e o português Jorge Jesus.

A bola então enfim rolou. Nos primeiros minutos da decisão, o Flamengo buscou impor seu estilo de jogo, de muita posse de bola e muita intensidade, marcando alto a saída de bola, e pressionando a defesa adversária. Aos nove minutos, Bruno Henrique arriscou de longe, mas apenas mandou a bola à direita do gol de Armani, sem perigo. Foi um início de partida com as duas equipes se estudando muito. Mas o time do River Plate marcava em cima e não deixava o meio de campo rubro-negro trabalhar. Gabigol e Bruno Henrique eram marcados muito de perto e não tinham liberdade. Era esperado, já que em entrevista à véspera do jogo, o zagueiro Pinola havia declarado: "O Flamengo tem um grande jogo coletivo ofensivo, com dois atacantes muito bons, de muita mobilidade. Não podemos lhes dar nem um centímetro, porque sabemos o quanto são perigosos". O sistema defensivo do time argentino estava seguindo este pensamento à risca.

O River Plate jogava com muita objetividade, explorando principalmente as laterais do campo e o posicionamento em "linha alta" da defesa rubro-negra. Em cada recuperação de bola, o time chegava próximo à área do Flamengo em poucos segundos. Era um time bastante objetivo e muito aplicado taticamente. Quando o cronômetro marcava quatorze minutos do primeiro tempo, Enzo Pérez abriu para Nacho Fernández, que recebeu pela direita e cruzou rasteiro antes que Filipe Luís pudesse interceptar. Willian Arão e Gérson vacilaram, não cortando e deixando um para que o outro metesse o pé; com a indecisão dos dois, a bola passou e chegou aos pés do atacante colombiano Borré, perto da marca do pênalti, ele chutou colocado e rasteiro no canto esquerdo, longe do alcance de Diego Alves: River 1 a 0. Pesadelo rubro-negro em Lima!

Depois do gol, se havia a expectativa de que o Flamengo cresceria ofensivamente, em busca do empate, não foi o que aconteceu, pois foi o River quem incorporou uma postura mais intensa e não deu espaços para que Gérson, Arrascaeta, Éverton Ribeiro, Bruno Henrique e Gabigol conseguissem reter a posse de bola por muito tempo. Assim, o controle do jogo passou a ser da equipe portenha, que tomava conta das principais ações. O quinteto rubro-negro foi engolido pela marcação rival e não finalizou mais com perigo ao gol de Armani até o fim do primeiro tempo.

Foi o time argentino quem teve as melhores oportunidades até o intervalo. Aos vinte minutos, após uma bola recuperada no grande círculo, Suárez foi acionado nas costas de Rafinha pela esquerda, avançou ao fundo, marcado por Rodrigo Caio, e cruzou rasteiro e De La Cruz furou, perdendo grande oportunidade para fazer o segundo. Aos trinta e seis, Montiel puxou um contra-ataque em velocidade pela direita e tocou para Borré, que rolou para trás para que Palacios soltasse uma bomba, com a bola passando muito perto da trave de Diego Alves. Definitivamente, a superioridade tática na primeira etapa foi do River Plate.

Na volta para o segundo tempo, pouca coisa de diferente pôde ser percebida nos dez primeiros minutos. O primeiro grande momento da etapa final aconteceu aos onze minutos: Bruno Henrique enfim conseguiu uma escapada em liberdade para descer pela esquerda de ataque, invadindo a área e cruzando rasteiro. Arrascaeta tentou a finalização, mas furou. A bola passou por ele e chegou a Gabigol, que chutou forte para o gol. A bola acertou às costas de De La Cruz e voltou rebatida para Éverton Ribeiro, livre de marcação, tendo seu chute saído fraco. Caído, Armani segurou a bola e não largou.

O árbitro chileno Roberto Tobar levou a mão ao ouvido, onde estava o comunicador de áudio, dando sinal de que o lance estava sob revisão da arbitragem de vídeo, sobre um possível toque no braço do uruguaio De La Cruz após o chute de Gabriel. Apreensão em todos os corações rubro-negros! Mas enquanto o juiz caminhava em direção ao meio de campo, sob alguma pressão dos jogadores das duas equipes, que aguardavam um veredicto, ele fez sinalização com a mão para que o jogo seguisse, porque não havia nada a ser marcado.

Tenso, o Flamengo seguia envolvido na marcação executada com perfeição pelo River Plate, que também gastava o tempo com muita eficiência. O relógio corria, e o nervosismo - em campo, nas arquibancadas e em frente aos monitores - crescia. Aos vinte minutos, Gérson levantou a mão, sinalizando para o banco de reservas que havia sentido um desconforto muscular. E o Flamengo mexeu no meio de campo, com Jorge Jesus lançando Diego em seu lugar. Uma substituição que viria a ser crucial para o desenrolar das ações naquele fim de tarde de sábado.

Mas o River ainda assustou em dois lances em sequência. Aos vinte e um minutos, Matías Suárez recebeu livre na área e tentou cruzar, mas o zagueiro espanhol Pablo Marí conseguiu afastar, acabando com o perigo. Mas sempre que os alvi-rubros conseguiam chegar à área rubro-negro, os corações flamenguistas apertavam. No minuto seguinte, aos vinte e dois, a bola foi lançada na área pelo alto, a zaga rubro-negra rebateu e a sobra ficou com Nacho Fernández, que chutou de fora da área, com a bola mais uma vez passando perto da trave de Diego Alves.

O segundo tempo passava de sua metade quando a partida começou a mudar. Claramente o River Plate a partir dali, até o final da partida, sentiu fisicamente o cansaço imposto pelo intenso volume de jogo imposto pelo time do Flamengo. O domínio do meio de campo passou a ser rubro-negro, com o time passando a reter por mais tempo a posse de bola, enfim conseguindo impor a forte característica que marcava aquela equipe treinada por Jorge Jesus. Rafinha e Filipe Luís também conseguiam evoluir com mais intensidade pelas laterais, com as características da partida mudando completamente de figura.

Aos vinte e sete, Filipe Luís arriscou de longe e isolou. Aos trinta, a bola girou no ataque, passando de pé em pé por vários jogadores de vermelho e preto, Bruno Henrique avançou na diagonal pela esquerda e tocou para Diego, o camisa 10 tocou para Gabigol na direita, e este rolou para Éverton Ribeiro, que levantou para a área; o meia uruguaio Giorgian De Arrascaeta errou uma tentativa de mandar ao gol de bicicleta. Na sobra, Diego emendou de primeira, encobrindo a meta de Armani.

Era visível que o time argentino estava cansando. Marcelo Gallardo percebeu e tirou dois dos destaques de sua equipe, substituindo a Nacho Fernández e Rafael Borré por Julián Álvarez e o ex-jogador de Atlético Mineiro e São Paulo, Lucas Pratto. Jorge Jesus, do outro lado, lançava o time a frente, colocando Vitinho no lugar de Arão, desprotegendo assim a defesa e aumentando o poderio ofensivo da equipe.

Tudo que o River Plate buscava, àquela altura, era um contra-ataque que lhe desse a oportunidade de matar o jogo e sacramentar em definitivo sua vitória. E com o Flamengo mais aberto, as chances apareceram. Aos trinta e dois minutos, o contra-golpe foi três contra três, mas Pratto preferiu chutar de longe e errou. Aos trinta e cinco, Suárez roubou de Filipe Luís na área e ajeitou para o jovem Exequiel Palacios, que também concluiu errado.

O relógio já marcava 43 minutos do 2º tempo. Muitos já dariam o título como perdido. Mas sempre há quem acredite até o final. E aquele time do Flamengo acreditava! Gabriel Barbosa estava completamente apagado no jogo, o time argentino não tinha deixado Gabigol acertar uma boa jogada sequer. O River estava no ataque, a bola estava com Lucas Pratto na intermediária de defesa rubro-negra quando ele adiantou um pouco a bola e a perdeu, Diego e Arrascaeta tinham dado o combate, e foi o uruguaio quem interceptou, avançou, acionou Bruno Henrique pela lateral direita da intermediária e correu em direção à área. BH avançou, cortou Montiel para trás, teve calma e levantou a cabeça... Um momento crucial! Depois do jogo, em entrevista à emissora de TV argentina TYC Sports, o ex-camisa 10 da Seleção Argentina, Juan Román Riquelme, ídolo do Boca Juniors, assim descreveu: "No final do jogo, todos pensam em cruzar a bola para a área. E quando pensaram que Bruno Henrique iria cruzar, ele tocou no meio de todos e deu um passe para o gol. O que ele fez foi maravilhoso, não tem como marcar. Eu teria cruzado, por exemplo"... BH foi cercado por quatro, e neste momento percebeu a movimentação de Arrascaeta por trás da defesa, penetrando em diagonal na área, e fez um lançamento com precisão. A bola ficou um pouco longa, mas "Arrasca" se esticou e tocou para o meio. A bola atravessou a pequena área cruzando em diagonal e encontrou Gabriel entrando com total liberdade no segundo poste. Ele só teve o trabalho de empurrar para o gol vazio. O relógio indicava 43 minutos e 15 segundos. Explosão de emoção no Estádio Monumental, no Maracanã, nas ruas do Rio de Janeiro, no Brasil inteiro! No rádio, na épica narração de Luiz Penido na Rádio Globo: "Esse time não morre nunca! É o Flamengo das vitórias, na raça, amor e paixão!". Na transmissão televisiva da Fox Sports, o narrador João Guilherme se esgoelava: "Pelos poderes de Gabigol! Nada é impossível! Isso aqui é Flamengo! É o 'ai Jesus'! Vibra a maior torcida do mundo! Uma página épica começa a ser escrita na história do Flamengo!". Palavras que pareciam uma premunição. O narrador parecia antever o que viria a acontecer três minutos depois.

Aos 46 minutos, o River Plate pressionava em seu campo de ataque quando Diego Ribas recuperou a posse de bola, levantou a cabeça, e decidiu fazer um lançamento longo para Gabigol, que próximo à entrada da área, era vigiado pelo lateral chileno Paulo Díaz e pelo zagueiro Pinola. Ele disputou fisicamente, escorando no corpo, e Pinola, ao tentar cortar, raspou de cabeça um pouco para frente. Serviu como uma ajeitada para Gabi, que arrumou o corpo e fuzilou com o pé esquerdo, enchendo o pé e pegando na bola de cima para baixo. A bola quicou embaixo de Armani e estufou a rede! O relógio indicava 46 minutos e 23 segundos. Virada majestosa! Gol do título do Flamengo! A narração de João Guilherme na Fox Sports ficou eternizada: "Olha a virada, Gabriel! Incrível! Incrível! Gol do Mengão! Épico! Memorável! O maior momento da história do Flamengo! Eu só acredito porque estou narrando! Quem foi que disse um dia que o Flamengo não tem tradição na Libertadores da América? Se não tinha, tem a partir de agora! Um dos roteiros mais incríveis da história do futebol!". O êxtase rubro-negro foi incontido! O Flamengo havia concluído com louvor o árduo processo de reestruturação financeira vivido entre 2013 e 2019, e coroava o trabalho com uma glória espetacular!





A partir do gol, nos minutos finais, a bola praticamente não rolou mais. Já nada mais tiraria o título do Flamengo! O time do River buscava forças para quebrar o impacto e tentar um milagroso empate. Seus torcedores, com olhares atônitos nas arquibancadas, não cantavam mais. Tudo que se podia escutar era o êxtase rubro-negro em Lima. Mas ainda houve tempo para os argentinos apelarem para o anti-jogo, e fazerem o que sempre costumam fazer quando estão perdendo: apelar para a violência. Numa disputa de bola quase na marca de escanteio, Bruno Henrique caiu, e Montiel o chutou nas costas enquanto BH estava no chão. O árbitro chileno aplicou o cartão vermelho, enquanto instaurava-se um princípio de de confusão, logo contornada. Gabigol se afastou para a linha do meio de campo, e de lá provocou o banco de reservas argentino; foi flagrado pela arbitragem de vídeo, e também recebeu o cartão vermelho. Reiniciada a partida, só houve tempo para o apito final. A América era vermelha e preta de novo!

Sem sombra de dúvida, era o segundo maior jogo de futebol da história rubro-negra. Atrás apenas dos 3 a 0 sobre o Liverpool em 1981. Assim como Raul, Leandro, Marinho, Mozer e Júnior, Andrade, Adílio e Zico, Tita, Nunes e Lico, tornaram-se uma escalação guardada de memória para sempre pelo Clube de Regatas do Flamengo e seus amantes, a escalação com Diego Alves, Rafinha, Rodrigo Caio, Pablo Marí e Filipe Luís, Willian Arão, Gérson, Arrascaeta e Éverton Ribeiro, Bruno Henrique e Gabigol, também entrava para o olimpo vermelho e preto.

Era o segundo título de Libertadores da história do Flamengo. Com a conquista, o clube voltava a se habilitar para jogar um Mundial Interclubes. E por obra do destino, assim como em 1981, para voltar a encontrar ao Liverpool. Entre os brasileiros, naquele momento, São Paulo, Santos e Grêmio tinham três títulos sul-americanos, o Flamengo passava a ter dois, assim como tinham Internacional e Cruzeiro. Corinthians, Palmeiras, Vasco e Atlético Mineiro tinham um.

E o destino ainda escreveu mais um marco histórico naquele fim de semana. Menos de 24 horas após conquistar a América, o Flamengo se sagrou campeão brasileiro, mesmo sem entrar em campo pela rodada daquele fim de semana. O Flamengo era o líder, com 13 pontos de vantagem para o segundo colocado, o Palmeiras. No domingo, o alvi-verde paulista foi derrotado em São Paulo pelo Grêmio, e já não podia mais, matematicamente, ultrapassar ao Flamengo na tabela de classificação.

O elenco rubro-negro voltou ao Rio de Janeiro no domingo e foi recepcionado por uma multidão num desfile num Trio Elétrico. Estavam em meio à festa quando souberam que também eram oficialmente os campeões nacionais. Um fim de semana mágico! Apoteótico!







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