UM GOL PARA RELEMBRAR 1944
"Curiosamente, para o Fla-Flu, os dirigentes trouxeram Valido de volta da aposentadoria (ele já abandonara os gramados havia mais de um ano). Ele jogou apenas os dois últimos jogos do campeonato. E foi dele, do argentino Valido, o polêmico gol que sacramentou a vitória por 1 a 0 sobre o Vasco. Polêmico porque ele supostamente fez falta no beque vascaíno na disputa, no ar, em que cabeceou para as redes. Estava assim garantido o tricampeonato rubro-negro. O time do Flamengo nesse campeonato era formado por: Jurandir, Nilton Canegal e Quirino; Biguá, Modesto Bria e Jaime de Almeida; Jacy (Valido), Zizinho, Tião, Pirilo e Vevé.
Foi a decisão de 1944 que consagrou de vez o duelo Flamengo e Vasco. O jogo foi na Gávea e o Flamengo se preparou. Os portões foram abertos mais cedo e os torcedores rubro-negros ocuparam as posições mais estratégicas na arquibancada. Havia gente de mapa em punho fazendo a distribuição dos que chegavam. Quando Valido cabeceou para o fundo das redes, no gol que seria o do título e do tricampeonato, todo o Vasco começou a protestar que o argentino teria subido nas costas do zagueiro Argemiro antes de meter a testa na bola. Até filme, o Vasco exibiu, no Capitólio, em sessão especial, para provar que estava com a razão. Quem era Vasco via com precisão, quem não era ficava na dúvida. Ary Barroso foi quem pôs um ponto final na discussão: o ideal de uma vitória sobre o Vasco para decidir campeonato é Flamengo 1 a 0 e gol feito com a mão, todo mundo vendo, inclusive o juiz, porque se o juiz não visse, não tinha graça nenhuma.
Quando acabou o jogo, o campo da Gávea foi tomado. Não havia ninguém no vestiário do Flamengo que não estivesse chorando e rindo ao mesmo tempo. Todos cantavam a música tradicional das arquibancadas, herdada de cânticos ingleses, e que, à época, era cantada por todas as torcidas: “Glória, Glória, Aleluia/ Glória, Glória, Aleluia/ Nós somos campeões.” Lá estavam Galo, Joaquim Guimarães e flamenguistas de outros tempos. Também o escritor paraibano José Lins do Rêgo tinha vontade de cantar. Não cantava, gritava Flamengo e ia abraçar, um a um, todos os jogadores. Se Ary Barroso estivesse lá cantaria “Flamengo que me faz chorar”. E Jaime de Carvalho, da Charanga Rubro-Negra, correndo de um lado a outro para avisar que a torcida iria a pé da Gávea até a sede do Flamengo. Nada de bonde. Os bondes estavam bons para a torcida do Vasco, que ia embora de cabeça baixa. O torcedor do Flamengo tinha que levantar a cabeça e empinar o queixo. Tinha era de se espalhar, sambar, pular, puxar cordão, alegrando todas as ruas, fazendo escancarar todas as janelas, com a gente que vinha para ver toda aquela festa. O bloco tinha de atravessar o Jardim Botânico, a rua São Clemente inteira, a praia de Botafogo, a avenida da Ligação e a praia do Flamengo. Ninguém, porém, achava longe. Parecia que a sede do Flamengo era logo ali. A festa do tricampeonato foi inesquecível". (A NAÇÃO, pgs. 62 e 63)
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