Enquanto busca resolver acordos de maior vulto, como a dívida cível com Petkovic que se arrastava desde 2004 e foi quitada no fim de fevereiro, o Flamengo tenta também arrumar a casa. Desde que assumiu, no início de 2013, o número de ações trabalhistas foi reduzido de cerca de 500 para 170 e, atualmente, o clube dispõe de um saldo positivo de mais de R$ 2 milhões no ato do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) que determina o repasse de 15% de todas as receitas do clube para o pagamentos de dívidas dessa natureza. Como o faturamento cresceu, o repasse também aumentou proporcionalmente e a fila andou.
Diretor jurídico do Flamengo, Bernardo Accioly explica que somente no início de 2015 poderá de fato se notar a extinção dos processos, por exemplo, de pagamentos de multa rescisória ou obrigações não recolhidas, como Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS). Isso porque, explica Accioly, o empregado tem um prazo de dois anos para acionar o clube em caso de demissão e, como as questões passaram a ser revistas no início de 2013, apenas em 2015 poderá se ter certeza que não haverá novos processos por este tipo de motivo. Entre os casos trabalhistas resolvidos estão os de jogadores como Ronaldo Angelim, Kléberson, Marcelo Lomba, Juan e Willians, entre outros.
Atualmente, do ponto de vista orçamentário, o Flamengo faz provisões de contingência de R$ 35 milhões para quitar essas 170 rotuladas como "perda provável" - sem considerar a ação de Ronaldinho Gaúcho que o clube estima, de acordo com o montante incluído como provisão de contingência no balanço financeiro, perder R$ 10 milhões. Levando em conta o que o clube conseguiu quitar de dívidas trabalhistas em 2013, o montante não assusta tanto assim: no ano passado, o Flamengo pagou R$ 26,1 milhões de débitos dessa natureza. Somente de janeiro até o dia 13 de março de 2014 foram pagos R$ 2,9 milhões.
- Antes você tinha advogados trabalhando e tinha diretores não remunerados, que obviamente têm de ser remunerados em outro emprego. Então os chefes da máquina que roda no dia a dia vinham para o clube no final do dia, sem o mesmo compromisso de uma pessoa que está aqui o dia todo cobrando com rédea curta. O trabalho era feito, mas era feito sem controle, sem organização, sem meta. Tinha uma gerente, que é muito boa e está lá até hoje, mas agora está achando ótimo porque tem como escalar quando há um problema e ela também é cobrada por essa organização e controle - disse Accioly.
O diretor esclareceu ainda que houve uma mudança de filosofia para acelerar a eliminação de processos de menor valor.
- Como pessoas demitidas na gestão passada têm dois anos para entrar com ação, e como se demitia sem pagar as verbas rescisórias, a tendência é que a partir de 2015 essa curva seja uma decrescente de forma muito acentuada. A multa rescisória não paga a gente sabe que vai perder, os juros trabalhistas são o melhor investimento que existe no país, ou seja é bom para o clube pagar e bom para o reclamante também. Se o cara tem uma expectativa de receber 50 daqui cinco anos e a gente oferece 30 hoje, ele provavelmente aceita. A ordem é para procurar e antecipar a solução dos casos mais baratos, fazer acordo. A expectativa é chegar no fim da gestão com um número de ações inferior a 50.
A organização do departamento passa por uma questão simples, mas que não existia na Gávea: um sistema de gestão de processos, que custa cerca de R$ 200 por mês para ser mantido. O sistema foi doado em parceria pelo escritório que assumiu a missão de conduzir todas as questões trabalhistas rubro-negras, o Tocantins Advogados - à exceção do caso de R10, que está por conta de Marcos Motta e Bichara Neto.
- Para você ter uma ideia, não existia um sistema de gestão de processos para essas 500 ações, um sistema que custa R$ 200 por mês. É inadmissível uma empresa com essa quantidade de processos não ter. A gente conseguiu em uma parceria. A empresa que está cuidando das nossas ações tributárias doou o sistema e faz o pagamento mensal. Temos funcionado com parcerias. Então, 500 ações eram controladas em uma planilha, isso é impossível. Como os profissionais eram bons, não se perdia prazo, mas não tem como emitir um relatório gerencial com base em uma planilha. O descontrole era tamanho que não existia o que existe em qualquer contabilidade, um cálculo para saber quantas dessas ações são perda provável, que é o que vai para o balanço como provisão de contingência - explicou Accioly.
O diretor jurídico esclareceu também que antes não havia um cálculo preciso para que o clube se planejasse para derrotas prováveis nos tribunais. Isso porque, segundo ele, não pagava em dia o escritório que cuidava dos casos.
- Quem classifica isso é o escritório externo. Como o escritório externo que cuidava disso antes, que é um bom escritório, vale ressaltar, não recebia há um ano, ele dá o atendimento para o cliente que paga, por mais amor que tenha ao Flamengo, não tem jeito. Então não atualizava esse tipo de cálculo, que você pode exigir quando paga em dia. Então a gente não sabia o tamanho do buraco. Hoje temos esse número de 170 ações e a perda provável representa esse montante de R$ 35 milhões - completou Accioly.
Um dos exemplos da nova política do clube é o caso de Luiz Antonio que, insatisfeito por não receber o que gostaria e orientado por seu empresário, do qual já se separou, resolveu não se reapresentar com o elenco no início de janeiro. Partiu para a Justiça do Trabalho e buscou em todas as instâncias, incluindo Brasília, o encerramento do seu vínculo com o clube. Não conseguiu. Em dia com encargos e tributos, além de salários do atleta, o clube impediu a saída do seu ativo que, após dois meses sem trabalhar, retornou aos treinos
O clube entendeu que, apesar de poder aplicar uma demissão por abandono de emprego, perderia dinheiro pois o jogador que pode render dividendos no futuro. Dessa forma, a estratégia foi não permitir que ninguém do clube se pronunciasse de forma contrária ao retorno do jogador para que isso não funcionasse como arma para a defesa caracterizar falta de ambiente. Luiz Antonio foi reintegrado, mas o diretor jurídico Bernardo Accioly confirmou: ele não receberá os salários de janeiro e fevereiro, meses em que não foi ao clube enquanto tentava sua liberação nos tribunais.
Na área cível, segundo Accioly, quase todos os processos de vulto estão extintos com a quitação da dívida com Petkovic no fim de fevereiro e, anteriormente, com Zagallo e Deivid (com este ainda persiste cobrança trabalhista). Resta uma grande ação, que não tem mais como ser revertida, a de Romário. Já existe um acordo feito entre clube e ex-jogador, hoje deputado, para o pagamento de parcelas até 2022. Pelo trato, assinado em 2012 após o Flamengo descumprir o acordo anterior e o ex-jogador chegar a cobrar o valor total da dívida calculada por seus advogados, R$ 48 milhões, estava previsto o pagamento de R$ 19,5 milhões, sendo R$ 18 milhões líquidos para a empresa de Romário e R$ 1,5 milhão para o escritório de advocacia de Jackson Uchôa Vianna (Uchôa Vianna Advogados). Com os reajustes, o diretor jurídico Bernardo Accioly estimou que os pagamentos devem chegar a R$ 23 milhões.
O novo parcelamento foi feito em 2012 da seguinte forma: R$ 3.000.000,00 até o dia 31 de julho de 2012 e mais 120 parcelas de R$ 125.000,00 com a primeira vencendo em 30 de agosto. O acordo prevê reajuste anual das parcelas em 12%. O valor pago aos advogados de Romário tem de ser quitado da seguinte forma: duas parcelas de R$ 750.000,00, sendo a primeira com vencimento em 31 de julho e a segunda estipulada para 31 de outubro de 2012. A inadimplência de qualquer parcela acarreta multa de 20% sobre o valor da mesma. Se atrasar por mais de três meses o pagamento, o Flamengo concorda, no acordo assinado, em pagar os R$ 48.501.454,11 devidamente atualizados.
Nenhum comentário:
Postar um comentário