Em 1981, o Flamengo, por ter sido o Campeão Brasileiro de 1980, disputava a Copa Libertadores da América pela primeira vez em sua história. Era o 14º clube brasileiro a vir a participar da competição, da qual o Palmeiras já havia participado 6 vezes, o Santos e o Cruzeiro 4 vezes cada um, o São Paulo e o Internacional 3 vezes cada um, enquanto Bahia, Botafogo, Vasco e Atlético Mineiro tinham 2 participações, e Corinthians, Fluminense, Guarani e Náutico tinham participado 1 vez. Dos clubes mais tradicionais do futebol brasileiro, apenas o Grêmio ainda não havia participado, o que conseguiria na edição seguinte, pois foi o campeão brasileiro em 81. Aquele campeonato nacional do qual o tricolor gaúcho foi o campeão havia aberto a Temporada de 1981, no 1º semestre, e nele o Flamengo tinha terminado com um 6º lugar. Uma campanha que de todo não havia sido tão ruim, mas cujo desempenho custou o cargo do então treinador rubro-negro, o paraguaio Modesto Brio, assim como causou a saída do principal reforço contratado para aquela temporada, o experiente zagueiro Luís Pereira, que havia chegado ao clube após passagem pelo Atlético de Madrid.
Como perduraria como modelo de disputa desde 1960 até 1999 da então chamada "Taça Libertadores da América", que passaria a ser tratada como "copa" só posteriormente, cada país tinha direito a apenas duas vagas na Libertadores, eventualmente só tendo três representantes quando tinha um campeão, já que o vencedor do torneio conservava o direito de participar da edição seguinte, na qual pulava a Fase de Grupos e entrava direto na 2ª Fase, que era composta por dois triangulares semifinais. Os representantes brasileiros em 1981 foram Flamengo e Atlético Mineiro, campeão e vice da edição do Campeonato Brasileiro de 80.
O Brasil só tinha conquistado o título 3 vezes, com o Santos liderado por Pelé tendo sido Bi-campeão em 1962 e 1963, e o Cruzeiro sido o Campeão em 1976. Logo, a conquista era um tabu para os clubes brasileiros, que já tinham chegado à final 8 vezes, tendo os clubes brasileiros, portanto, sido derrotados em 5 finais, duas vezes com o Palmeiras, que perdeu as finais de 1961 para o Peñarol, do Uruguai, e de 1968 para o Estudiantes de La Plata, da Argentina, tendo ainda o São Paulo perdido a final de 1974 para o Independiente de Avellaneda, o Cruzeiro a de 1977 para o Boca Juniors, e o Internacional a de 1979 para o Olimpia, do Paraguai.
Jogar a Libertadores significava enfrentar partidas violentas, com os adversários abusando do antijogo sob conivência das arbitragens, principalmente quando precisavam conter o estilo de jogo mais técnico das equipes brasileiras. Este era um padrão, e as equipes brasileiras tinham enorme dificuldade de superá-lo. Nas 21 primeiras edições, os títulos tinham sido conquistados pela Argentina em 12 oportunidades, pelo Uruguai em 5, o Brasil em 3 e o Paraguai em 1.
O exemplo clássico deste contexto estava explicitado na própria disputa da Copa Intercontinental (no Brasil então chamada de Mundial Interclubes). Até 1979 a disputa entre os campeões da América do Sul e da Europa era em duas partidas, uma em solo europeu e outra em solo sul-americano. Diante da violência e da conivência a ela das arbitragens, os campeões europeus passaram a se negar a fazer a disputa, com algumas das edições ao longo dos Anos 1970 tendo tido a participação dos vice-campeões europeus. O problema não conseguiu ser contornado, e para evitar que a disputa fosse extinta diante da negação dos europeus, já que nem mesmo os vice-campeões queriam mais participar, a saída diplomática, a partir de 1980, foi uma disputa que passou a ser em jogo único em campo neutro, realizada sempre em Tóquio, no Japão.
Também perdurou de 1960 até 1999 o modelo de disputa da Fase de Grupos, que reunia sempre os dois representantes de dois países no mesmo grupo. Assim, os brasileiros sempre caíam no mesmo grupo na 1ª Fase. E com um fator complicador adicional, só o 1º colocado de cada grupo avançava para a 2ª Fase (esta regra de classificação só perdurou até a edição de 1987). Assim, Flamengo e Atlético já sabiam que estariam no mesmo grupo, tendo que aguardar ao sorteio para saber de qual outro país seriam os outros dois representantes, assim como sabiam que no mínimo só um dos dois avançaria de fase. O sorteio colocou a adversários do Paraguai no caminho dos brasileiros. Assim, era o grupo considerado o mais difícil dentre todos: Flamengo, Galo, Olimpia e Cerro Porteño. Simplesmente pela frente, no caminho dos brasileiros, estava o campeão de duas edições antes daquela, o alvinegro Olimpia, que em 79 havia na finalíssima superado ao Internacional, que era então liderado em campo pelo meio-campista Paulo Roberto Falcão. Nos demais 4 grupos se encontraram os representantes de: Argentina e Colômbia; Uruguai e Venezuela; Bolívia e Equador; e Chile e Peru.
Clássico paraguaio entre Olimpia e Cerro Porteño no 1º semestre de 81
A estreia do Flamengo seria o primeiro reencontro com o Atlético Mineiro, disputado em 3 de julho de 81 no Mineirão. A arbitragem era do brasileiro José Roberto Wright (aqui só mencionado porque voltará a ser personagem, desta vez como ator principal, em acontecimentos mais a frente). O estádio na capital mineira recebeu expressivamente mais de 63 mil pagantes. O técnico da equipe rubro-negra naquela estreia era o paulista Dino Sani, enquanto do outro lado os atleticanos eram treinados pelo também paulista Pepe, ambos jogadores da Seleção Brasileira no elenco campeão mundial em 1958. Muito em breve, ambos já não estariam mais ocupando os seus respectivos cargos.
O time do Flamengo entrou em campo com seu tradicional uniforme rubro-negro escalado com: Cantareli, Leandro, Marinho, Mozer e Júnior; Andrade, Vítor e Zico; Tita, Nunes e Baroninho. O adversário, com sua tradicional camisa alvinegra entrou em campo formado com: João Leite, Orlando, Osmar Guarnelli, Luizinho e Jorge Valença; Chicão, Toninho Cerezo e Rui De Rosis; Vaguinho, Reinaldo e Éder. De ambos os lados, jogadores que já tinham vestido por diversas vezes a camisa da Seleção Brasileira. E o Galo estava desfalcado de seu camisa 10, Palhinha. Aquelas duas equipes tinham entregue ao futebol duas partidas memoráveis na final do Campeonato Brasileiro de 1980, não só tecnicamente muito bem jogadas, como também com histórico de clima quente entre os jogadores dentro de campo. Na disputa do título nacional, o então zagueiro rubro-negro Rondinelli saiu de campo com o maxilar inferior fraturado na primeira partida. Daquela vez, no primeiro jogo no Mineirão o Atlético venceu por 1 a 0. No segundo, no Maracanã, um empate por 2 a 2 perdurou até os 37 minutos do 2º tempo e ia dando o título para os mineiros, quando Nunes marcou e decretou um 3 a 2 definitivo e a conquista do título rubro-negro. Jogos espetaculares e memoráveis!
No reencontro pela estreia na Libertadores, foi uma daquelas estrelas da seleção, o ponta-esquerda Éder Aleixo, quem se postulou a herói da partida, ao marcar dois golaços de falta, um deles em especial num petardo de longo distância no ângulo! Acertou primeiro aos 28 minutos do 1º tempo, e depois aos 18 minutos do 2º tempo, o que colocava o Galo com uma vantagem no marcador muito difícil de ser revertida. Mas o time rubro-negro, heroicamente reverteu. Primeiro com um gol de Nunes logo dois minutos após o segundo tento atleticano, o que foi um fator determinante para manter a equipe rubro-negra emocionalmente viva na partida. O Flamengo seguiu lutando e acabou premiado. Aos 40 minutos do 2º tempo, um escanteio é cobrado para a área e o zagueiro Marinho sobe de cabeça para testar em diagonal e deixar tudo igual no marcador. Eram os números definitivos daquela noite: 2 a 2. Um espetáculo! Um jogaço de futebol!
Na segunda rodada, o Flamengo receberia no Maracanã, como mandante, em 14 de julho, ao adversário que se previa ser o mais fraco do grupo, o vice-campeão paraguaio, o Cerro Porteño. Uma vitória era fundamental para as aspirações rubro-negras de avançar à Segunda Fase. No entanto, na defesa do gol, do outro lado, estava o lendário goleiro paraguaio, titular da seleção do país, Roberto "El Gato" Fernández, como a barreira a ser transposta. A equipe do técnico Robustiano Maciel entrou em campo escalada com Fernández, Figueredo, Dos Santos, Ovelar e Sandoval; Osório, Benítez e Florentín; Pérez, Julián Jiménez e Acosta. Do lado rubro-negro, Dino Sani foi forçado a mexer em duas peças na equipe em relação ao primeiro jogo, pois não poderia contar nem com Andrade nem com o jovem Vítor. Para substituí-los utilizou ao improvisado jovem zagueiro Figueiredo como primeiro volante, junto a Adílio. Assim, a equipe rubro-negra foi a campo formada por: Cantareli, Leandro, Marinho, Mozer e Júnior; Figueiredo, Adílio e Zico; Tita, Nunes e Baroninho. Em tempos que a atratividade de pública da Libertadores era bem baixa, naquela noite de terça-feira o time rubro-negro entrou em campo diante de tão só pouco menos de 26 mil espectadores.
Com 25 minutos do 1º tempo a parada já estava praticamente resolvida: Zico duas vezes, Flamengo 2 a 0. Aos 30 minutos, Benítez fez falta dura e foi expulso, facilitando ainda mais as coisas para o time rubro-negro. No regresso para o 2º tempo, o ponta-esquerda Baroninho, que estava no clube emprestado pelo Palmeiras, marcou o terceiro gol. Julián Jiménez ainda diminui, mas Nunes duas vezes colocou um 5 a 1 impiedoso no placar ainda antes dos 20 minutos da etapa final. Ainda houve tempo para o zagueiro paraguaio Julio Dos Santos diminuir. Resultado final: Flamengo 5 a 2, com tranquilidade.
Ninguém ainda sabia disto, mas aquela era a última partida de Dino Sani a frente do Flamengo naquela Libertadores, pois dali a dez dias, quando entrasse em campo de novo, pela terceira rodada, o comandante da equipe já seria outro. E isto que o time havia acabado de se sagrar Campão da Taça Guanabara, o 1º turno do Campeonato Carioca. O estilo duro de Dino Sani, que havia assumido à equipe tão só três meses antes, estava conflitando com a jovem equipe. Adílio havia perdido a posição e sido afastado por discutir com o treinador. Após um episódio de uma forte repreensão do treinador a Mozer em frente à imprensa, a diretoria decidiu sumariamente por sua demissão. Ele deixava o comando técnico rubro-negro após apenas 24 partidas disputadas, nas quais a sua equipe venceu 13 vezes, empatou em 8 oportunidades e perdeu somente 3 jogos. Saía não pelo desempenho, mas por questões extracampo. Seria possível supor que o ano mais vitorioso do Flamengo no Século XX teria sido um período tranquilo e estável. Mas não foi. Foi um temporada repleta de "crises na Gávea", com o clube seguindo para o seu terceiro técnico no ano. O nome mais cotado para substituí-lo era o do ex-jogador rubro-negro Nelsinho Rosa, que vivia a sua primeira experiência como treinador a frente do Fluminense. Interinamente, assumiu o auxiliar Paulo César Carpegiani, recém aposentado como jogador, e que até dois meses antes era o capitão daquela equipe.
O terceiro jogo foi numa noite de sexta-feira, 24 de julho, que atraiu um público ligeiramente maior do que havia comparecido para ver o duelo contra o Cerro Porteño. A presença do então campeão paraguaio e campeão da Libertadores havia apenas dois anos antes chamou uma maior atenção, tendo pouco menos de 39 mil pessoas comparecido ao estádio para ver o confronto contra o Olimpia no Maracanã. O adversário não havia saído de dois empates sem gols em suas duas primeiras partidas disputadas. Tinha um sistema defensivo bastante sólido, o que fez com que tenha sido uma partida dificílima. Com o desfalque do ainda lesionado Andrade, a escalação colocada em campo por Carpegiani foi composta por: Cantareli, Leandro, Marinho, Figueiredo e Júnior; Vítor, Adilio e Zico; Tita, Nunes e Baroninho. Do outro lado, os paraguaios foram escalados por seu técnico Roque Fernández com: Almeida, Solalinde, Paredes, Delgado e Giudice; Guasch, Gustavo Benítez e Verza; Isasi, Pedro Fernández e Ortiz.
Aos 22 minutos do 1º tempo, Zico cobrou uma falta pela lado direito de ataque, na quina da grande área. A bola desviou na defesa e foi jogada para o meio da área, sobrando limpa para Adílio empurrar para dentro do gol. Quando o camisa 8, que com Carpegiani - a princípio treinador interino - recuperava a sua titularidade, colocou o Flamengo em vantagem nesta oportunidade, as coisas pareciam já bem encaminhadas, afinal o adversário não prezava por uma grande força ofensiva, já que não havia marcado nenhum gol na competição até então. Até que num lance meio despretensioso, aos 16 minutos do 2º tempo, houve uma falta na intermediária, que Solalinde cobrou cruzado, Cantareli não viu passar, e ela foi parar dentro da rede. Um empate que poderia ter custado muito caro ao Flamengo no fim da 1ª Fase. Ao final da primeira metade da disputa, Flamengo e Atlético lideravam então o grupo com 4 pontos cada um, enquanto o Olimpia os seguia bem de perto com 3 pontos.
O jogo pela quarta rodada era uma decisão. Flamengo e Atlético Mineiro voltavam a se enfrentar, desta vez no Maracanã. Foi novamente numa noite de sexta-feira, desta vez a de 7 de agosto de 1981. As duas equipes chegavam com novos treinadores no banco de reservas em relação à partida inaugural daquele grupo naquela Libertadores. O Flamengo era comandado por Paulo César Carpegiani, e o Atlético por Carlos Alberto Silva. Do lado alvinegra, a equipe estava desfalcada de Jorge Valença, Chicão e Éder. Entrou em campo escalada com: João Leite, Orlando, Osmar Guarnelli, Luizinho e Miranda; Toninho Cerezo, Rui De Rosis e Palhinha; Vaguinho, Reinaldo e Renato Queirós. Do lado rubro-negro, ainda sem Andrade, o time precisou mudar a zaga, contando com a entrada do experiente zagueiro Rondinelli, o "Deus da Raça", que naquele momento amargurava a reserva na equipe. Por outro lado, por opção de Carpegiani, o goleiro Raul começava pela primeira vez entre os titulares, barrando a Cantareli. O Flamengo começou escalado com: Raul, Leandro, Rondinelli, Mozer e Júnior; Vítor, Adilio e Zico; Tita, Nunes e Baroninho.
O Maracanã recebeu um público muito bom, de quase 63 mil espectadores para ver aquele clássico nacional. O 1º tempo de partida foi menos eletrizante do que o Mengo e o Galo vinham fazendo nos seus encontros anteriores, ainda que tenha sido uma boa partida de ser vista. As melhores oportunidades de gol foram rubro-negras, na melhor delas com Júnior cobrando falta pela esquerda de ataque e encontra Rondinelli para uma testada firme que passou rente à trave. As emoções estavam todas guardadas para a etapa final. E que emoções! Primeiro com um susto rubro-negro. Aos 17 minutos, um lançamento para frente e uma falha bisonha de Rondinelli, que errou o tempo de bola o tentar dar o bote, ainda tentou derrubar Palhinha com um agarrão, mas não conseguiu. O atleticano entrou livre, driblou Raul e escorou com o gol vazio.
Mas se há algo que aquele time do Flamengo tinha era brio. Tratou rapidamente não só de reagir, como logo de virar o jogo. Cinco minutos após sofrer o gol, mas também a partir de uma falha bisonha. Júnior lançou Zico no fundo, ele driblou e cruzou, e João Leite saiu mal, soltando a bola nos pés de Nunes, que não perdoou, empatando o jogo. Apenas dois minutos após o empate, e novamente aproveitando uma falha. Os dois zagueiros se enrolaram na saída de bola na intermediária e o camisa 12 Tita roubou, avançando e batendo forte no canto para decretar a virada. Porém, o Atlético também não entregava. E dez minutos depois da virada, após uma boa troca de passes na entrada da área, a bola sobrou para Reinaldo, que deslocou Raul e pôs mais uma vez um 2 a 2 no placar de um duelo entre o Mengo e o Galo. Mais um confronto eletrizante entre aquelas duas magistrais equipes.
Os atleticanos tinham tropeçado em casa justamente na partida que era considerada a mais fácil, tendo empatado por 2 a 2 contra o Cerro Porteño. Assim, precisavam que o Flamengo tropeçasse e perdesse ponto ao menos num dos dois duelos seguidos que faria em Assunção. Como relatou a Revista Placar antes da viagem rubro-negra para o Paraguai, os mineiros trataram de oferecer uma bonificação financeira para incentivar que os paraguaios tirassem pontos do Flamengo.
O Flamengo decidiria a sua vida na Libertadores de 81 na viagem a Assunção. Se vencesse suas duas partidas, fechava em 1º lugar do clube e avançava à 2ª fase, se sofresse ao menos uma derrota estaria matematicamente eliminado. Se obtivesse uma vitória e um empate, como naquela época não havia critérios de desempate estabelecidos, haveria um jogo desempate entre Flamengo e Atlético, em campo neutro, para definir o classificado. Por questão de economizar financeiramente com a logística, na época o padrão era a realização de dois jogos dentro da mesma semana. Assim o time rubro-negro viajou para fazer seus dois jogos no Paraguai, uma na noite de terça-feira, 11 de agosto, e o outro na de sexta-feira, 14 de agosto. Primeiro enfrentava ao Cerro Porteño, depois ao Olimpia.
O primeiro confronto era contra a equipe azul-grená. O Flamengo entrou em campo pela primeira vez naquela edição utilizando o seu uniforme branco. O técnico Carpegiani, que já havia deixado de ser interino, tendo sido oficialmente efetivado, levou a campo uma equipe formada por: Raul, Leandro, Rondinelli, Mozer e Júnior; Vítor, Adilio e Zico; Tita, Nunes e Baroninho. Era a escalação considerada ideal naquele momento, já que havia os desfalques de Marinho e Andrade. O estádio recebia somente 13 mil pessoas naquela noite, a metade do que viria a receber três dias depois, na partida frente ao Olimpia.
Otimista pela imponente vitória por 5 a 2 na partida de ida no Maracanã, todos esperavam uma vitória relativamente tranquila. E foi mais ou menos o que aconteceu. Logo no início da partida, aos 7 minutos, Zico recebeu pelo lado esquerdo da intermediária, fintou o marcador, e deu assistência precisa para o ponta-esquerda Baroninho penetrar livre pela esquerda da grande área e bater cruzado para abrir a contagem. No resto da primeira etapa, a equipe rubro-negra dominava e criava, mas tinha dificuldade para concluir a gol. O time Flamengo só foi matar o jogo no início do 2º tempo. Aos 6 minutos, Leandro avançou ao ataque e centrou para Nunes, que ajeitou para Zico, que entrou pela grande área em meio a três marcadores e, com um toque sutil, encobriu o goleiro: 2 a 0. Dez minutos depois, o camisa 10 brilhou de novo: desta vez foi Tita quem foi ao fundo pela direita e cruzou, encontrando Zico livre no meio da área para emendar de sem-pulo e marcar o terceiro.
Cinco depois após ter a impressão de que tinha liquidado a partida, um cruzamento na área que Raul vai acompanhando. A bola decai na segunda trave, aonde Acosta aparece para tocar e diminuir. Falha do goleiro rubro-negro. Mas o jogo estava fácil, mais cinco minutos se passam e Zico rouba uma bola na intermediária, tabela com Adílio, entra pela grande área e toca na saída do goleiro. Hat trick do camisa 10 da Gávea naquela noite em Assunção: 4 a 1. A cinco minutos do fim, Jiménez ainda diminui, ao aproveitar cruzamento para a área e testar firme. Após um 5 a 2 no Maracanã, o Flamengo aplicou 4 a 2 no Defensores Del Chaco, confirmando sua superioridade técnica e o seu favoritismo sobre o Cerro Porteño. A decisão definitiva era contra o "rei dos empates", o Olimpia.
Partida decisiva. Se vencesse, o Flamengo estaria classificado. Mas todos sabiam que do outro lado havia um adversário tradicional e encardido, e cujo sistema defensivo era bastante sólido. O time entrou em campo de camisas listradas de mangas compridas, indicando que o frio local seria uma adversário desconfortável a mais. Só uma modificação na escalação frente à equipe que havia começado o jogo três dias antes, com Figueiredo começando na vaga de Rondinelli, que havia saído lesionado durante a partida contra o Cerro. Assim, a zaga seria formado por dois jovens recém promovidos da equipe Sub-20: Figueiredo e Mozer. Nas laterais, no meio de campo e no ataque, jogavam as linhas consideradas as titulares do Flamengo naquela 1ª Fase da Libertadores de 81, com Leandro e Júnior pelos flancos, Vítor, Adílio e Zico no meio, e Tita, Nunes e Baroninho fazendo a linha de frente naquela clássica formação em 4-3-3.
Como era esperado, foi uma partida amarrada e de poucas chances reais de gol. O time do Olimpia era aguerrido, e defensivamente bem fechado. Nas cinco partidas feitas até ali, tinha empatado três, incluindo o duelo no Maracanã. O jogo se arrastou numa empate sem gols até o final, não teve jeito. Assim, Flamengo e Atlético terminavam empatados com 8 pontos, tendo o time rubro-negro um saldo de gols positivo de 5 tentos a seu favor, enquanto a equipe de Belo Horizonte tinha saldo positivo de 2 gols, três a menos. Não havia critérios de desempate, o regulamento previa uma partida extra em campo neutro para definir o classificado, com uma vantagem de empate para a equipe com melhor saldo de gols.
O jogo desempate aconteceu uma semana exata após a partida derradeira em Assunção, também numa noite de sexta-feira, em 21 de agosto. O local da partida foi escolhido: Estádio Serra Dourada, em Goiânia. O Flamengo entrava em campo com a vantagem de poder garantir um empate para assegurar a sua classificação à Fase Semifinal. O estádio recebeu o segundo maior público daquela edição da Libertadores, mais de 71 mil presentes para ver o clássico brasileiro daquele momento (somente o primeiro jogo da final, no Maracanã, teve um público maior). O Atlético, de Carlos Alberto Silva, só tinha um desfalque, não podendo contar com o quarto-zagueiro da Seleção Brasileira, Luizinho. A equipe foi a campo com: João Leite, Orlando, Osmar Guarnelli, Alexandre e Jorge Valença; Chicão, Toninho Cerezo e Palhinha; Vaguinho, Reinaldo e Éder. O Flamengo era o mesmo que havia entrado em campo uma semana antes diante do Olimpia, com a sua dupla de zaga formada por dois novatos, Figueiredo e Mozer. Tinha tudo para ser um grande jogo e uma grande festa, mas não foi.
A falta de Reinaldo em Zico que foi o estopim dos acontecimentos
A confusão começou aos 33 minutos do 1º tempo, quando Reinaldo fez falta por trás em Zico e foi expulso pelo árbitro José Roberto Wright. Até aquele momento já tinham sido dados cinco cartões amarelos na partida, quatro para o Atlético e um para o Flamengo. Toninho Cerezo, Palhinha, Vaguinho e Mozer receberam por faltas duras cometidas, e Éder por reclamação. O árbitro entendeu que a falta cometida pelo centroavante atleticano havia sido dura o suficiente para aplicar o cartão vermelho direto, sem sequer dar um amarelo a ele. Os jogadores do Galo cercaram então o árbitro reclamando. Após alguma demora, a partida foi reiniciada. Um minuto depois, há uma falta a favor do Atlético no meio de campo, enquanto se abaixava para pegar a bola, Éder esbarra com o corpo em Wright, que interpreta o lance como agressão e lhe aplica outro cartão vermelho (o ponta já estava amarelado naquele momento). Dirigentes do Atlético então invadiram o campo, com os jogadores alvinegros cercando o juiz. No meio da confusão foram levantados cartões vermelhos para Palhinha e Chicão (segundo a súmula por xingamentos proferidos). Os dirigentes retiraram o time de campo e a partida ficou paralisada por mais de 20 minutos. Quando o jogo recomeçou havia 11 contra 7 dentro de campo. Para repor taticamente as expulsões, o técnico atleticano fez as duas substituições que eram permitidas pela regra naquele tempo. Foi o jogo recomeçar, e o goleiro João Leite caiu no chão e alegou contusão muscular. Negando-se a levantar, o goleiro acabou também recebendo o cartão vermelho. Uma vez que a regra de jogo não permitia a continuidade da partida com apenas 6 em campo de um lado, o jogo foi dado por encerrado. Assim que recebeu o cartão, o goleiro do Galo se levantou e saiu caminhando normalmente.
O julgamento que definiu o destino final dos acontecimentos foi realizado na sede da Confederação Sul-Americana, a qual naquela época ficava em Lima, no Peru. Foi uma goleada em favor da manutenção do resultado: por 5 votos a 0, a decisão de campo foi mantida, e a classificação do Flamengo para participar da fase de triangulares semifinais foi confirmada. A 2ª Fase estava definida e eram dois triangulares, dos quais os vencedores avançavam para disputar a final, no modelo de disputa que perdurou igual de 1960 a 1987. Participariam o Nacional de Montevidéu, campeão da Libertadores de 1980, junto ao Flamengo, o classificado no grupo que reuniu os clubes de Brasil e Paraguai, o Deportivo Cáli, o classificado no grupo que reuniu os clubes de Argentina e Colômbia, o Peñarol, o classificado no grupo que reuniu os clubes de Uruguai e Venezuela, o Jorge Wilstermann, o classificado no grupo que reuniu os clubes de Bolívia e Equador, e o Cobreloa, o classificado no grupo que reuniu os clubes de Chile e Peru.
Curiosamente o Flamengo buscou politicamente a participação num grupo mais difícil. Para evitar a logística de deslocamento com viagens à Colômbia e à Bolívia, onde ainda mais teria que enfrentar a altitude do estádio em Cochabamba, casa do Jorge Wilstermann, além de entender que enfrentar a Nacional e Peñarol proporcionaria maior apelo de público e uma maior arrecadação de bilheteria, a diretoria rubro-negra entrou em consenso com os dois clubes uruguaios para que os três formassem um grupo, enquanto os outros três clubes, geograficamente mais próximos entre si pela Cordilheira dos Andes formassem o outro. A CSF não aceitou, entendendo que haveria um desequilíbrio técnico neste ordenamento que ela não desejava que houvesse. Os grupos acabaram definidos com Nacional, Peñarol e Cobreloa de um lado (amplo favoritismo para algum dos uruguaios), e Flamengo, Deportivo Cáli e Jorge Wilstermann do outro (todos consideravam quase unanimemente ao time do Rio de Janeiro como o favorito).
A maior dificuldade para enfrentar ao Jorge Wilstermann seria a altitude de quase 2.600 metros da cidade de Cochabamba quando o Flamengo fosse jogar como visitante. Era uma altitude bem mais suave do que as enfrentadas em Quito, La Paz, Cusco ou Potosí, mais próxima à verificada na Cidade do México, mas seus efeitos perceptíveis. O Wilster tinha sido o campeão boliviano de 1981 com o veterano brasileiro Jairzinho brilhando no seu ataque. Mas o mitológico artilheiro da Copa do Mundo de 1970 já não estava mais no elenco. Na Fase de Grupos, o time boliviano tinha vencido o grupo tecnicamente mais fraco. Venceu seus três jogos como mandante, e como visitante venceu ao adversário mais fraco, o Universitario de Ambato, do Equador, e foi derrotado por The Strongest e Barcelona de Guayaquil. Terminou empatado com o outro boliviano do grupo, o Strongest, a quem goleou por 4 a 1 no jogo desempate.
O principal adversário no caminho até a inédita final era o Deportivo Cáli. A equipe colombiana tinha eliminado aos argentinos, fazendo uma respeitável campanha. Como mandante também tinha vencido as suas três partidas, passando pelo Atlético Junior de Barranquilla (4-1), pelo Rosario Central (1-0) e pelo favorito River Plate (2-1). Como visitante, venceu ao River Plate novamente por 2 a 1, desta vez dentro de Buenos Aires, jogo que lhe garantiu a classificação. A equipe argentina tinha Fillol, Passarella, Tarantini, Mario Kempes e Ramon Díaz. Era um baita de um time! Nos outros dois duelos como visitante, no entanto, o Deportivo perdeu para Atlético Junior (0-1) e Rosario Central (1-2), o que indicava que provavelmente não seria tão forte a ponto de superar ao Flamengo de Zico.
A fase decisiva para definir o finalista já começou com uma decisão. O Flamengo faria os seus dois primeiros jogos fora de casa, largando contra o Deportivo Cáli na Colômbia, a equipe que havia vencido duas vezes ao River Plate. Era uma sexta-feira, dia 2 de outubro. O estádio Pascual Guerrero estava lotado, com 50 mil pessoas torcendo pela equipe local. O time colombiano entrou em campo com uniforme todo branco, escalado pelo técnico Ediberto Righi com: Valencia, Pachón, Romero, Capiello e Solarte; Cesar Arce, Álvarez e Moreno; Ortiz, Ángel Torres e Alberto Benítez. O Flamengo, com eu uniforme tradicional, entrava escalado com: Raul, Leandro, Figueiredo, Mozer e Júnior; Andrade, Adilio e Zico; Tita, Nunes e Baroninho. Era o time titular naquela Libertadores, sem nenhum desfalque. Detalhe que no segundo tempo daquela partida, o reserva Lico entraria em campo pela primeira vez naquela campanha da Libertadores, mas não para substituir a Baroninho, e sim a Nunes, numa substituição que visava justamente povoar e fortalecer ao meio de campo, para conter a pressão e o domínio da equipe de Cali. Para esta 2ª Fase, Andrade estava de volta ao time titular, entrando no lugar de Vítor com o meio de campo pela primeira vez no torneio assumindo a sua formação histórica com Andrade, Adílio e Zico.
O Deportivo deu a saída e pressionou muito nos momentos iniciais. A bola não saía da intermediária rubro-negra. O time mal conseguia passar do meio de campo. Até que logo aos 10 minutos conseguiu fazer um gol numa jogada meio despretensiosa. Lançamento para Júnior pela esquerda, ele avançou até a metade da intermediária e lançou para Nunes, encontrando-o entre três marcadores na meia-lua. O camisa 9 fintou para a esquerda e bateu cruzado, sem que o goleiro Valencia tivesse reação. A bola entrou mansa rente à trave: Mengo 1 a 0!
O restante da partida foi duro e muito difícil, os colombianos tiveram domínio durante a maior parte do tempo, mas o sistema defensivo rubro-negro aguentou a pressão, não sendo vazado. Uma vitória magra mas importantíssima para a trilha rumo à finalíssima. Os pontos conquistados valeram demais, mesmo com o futebol apresentado não tendo sido bom, bastante aquém do que aquela equipe costumava produzir.
A parada seguinte foi na altitude do Cochabamba contra o Wilster. Era noite de 13 de outubro, uma terça-feira. O estádio Felix Caprilles recebia um bom público de 32 mil pessoas. Os bolivianos entraram em campo, escalados pelo técnico Carlos Sanabria, formando com: Issa, Bengolea, Navarro, Villalón e Trigo; Enríquez, Aveiro e Villaroel; o brasileiro Bendelack, Taborga e Salguero. O Flamengo entrou em campo de uniforme branco, e estava desfalcado de Tita, escalado com: Raul, Leandro, Figueiredo, Mozer e Júnior; Andrade, Adílio e Zico; Chiquinho, Nunes e Baroninho. No segundo tempo, pela segunda vez consecutiva, Lico foi a escolha para entrar em campo e dar mais consistência entre o meio e o ataque, desta vez entrando na vaga de Chiquinho, que tinha sido escolhido como o substituto de Tita.
Repetindo o roteiro da partida anterior, numa escapada em contra-ataque o Flamengo abriu a contagem logo no início de jogo, desta vez com gol marcado por Baroninho, camisa 11, aos 13 minutos do 1º tempo, cobrando falta com um chutaço de longe que foi rasteiro no canto, uma bola defensável que o goleiro Jose Issa aceitou. O ponta-esquerda vinha cumprindo um importante papel na campanha até ali. Aquele era o 16º gol rubro-negro na Libertadores de 81, tendo Zico e Nunes marcado cinco vezes cada e Baroninho três, com os demais três tentos tendo sido de três outros jogadores.
O primeiro tempo seguiu arrastado, num jogo extremamente equilibrado. O time do Jorge Wilstermann também conseguia escapadas rápidas ao ataque, numa dinâmica de jogo que mostrou que aquele mítico time do Flamengo também sabia fazer falta e das as suas bordoadas quando entendia que se fazia necessário. Aos 8 minutos da etapa final, o ataque do Wilster furou a defesa rubro-negra: René Melgar recebeu assistência ao entrar em diagonal pela área e bateu cruzado, com a bola atravessando em sentido contrário, tocando na trave e indo morrer no funda da rede. O camisa 16 boliviano tinha acabado de entrar em campo no intervalo. Estardalhaço nas arquibancadas de Cochabamba, um barulho ensurdecedor para o comemorar o tento de empate. Mas aquela equipe rubro-negra sempre provava ter os brios de um time vencedor. Não se abateu e reagiu rápido, desempatando onze minutos depois. Escanteio pelo lado direito de ataque que Lico colocou na área, encontrando a cabeça de Adílio, que testou firme para o fundo do gol. Dali em diante foi aguentar a pressão, e assegurar a volta para casa com mais dois pontos conquistados. Com duas vitórias nos jogos como visitante, a classificação à final estava super bem encaminhada.
A partida em numa noite de sexta-feira, 23 de outubro, valia a classificação matemática à final. O Deportivo havia vencido ao Wilster por 1 a 0 em Cochabamba, logo no fim de turno do triangular, o Flamengo liderava com 4 pontos e o Deportivo tinha 2 pontos. Vencendo e, assim, indo a 6 pontos, a fatura estava liquidada e o Flamengo estava na final. Isto não motivou o suficiente o público, apenas pouco menos de 29 mil torcedores compareceram ao Maracanã. O técnico Carpegiani, ainda sem poder contar com o lesionado Tita, repetiu exatamente a mesma escalação que havia iniciado a partida em Cochabamba: Raul, Leandro, Figueiredo, Mozer e Júnior; Andrade, Adílio e Zico; Chiquinho, Nunes e Baroninho. O Deportivo Cali entrou em campo no Maracanã com uma equipe completamente modificada frente à da partida na Colômbia, inclusive sem a presença do treinador, tendo sido comandada pelo seu auxiliar-técnico.
Logo aos 10 minutos do 1º tempo Zico fez 1 a 0. Na volta para a segunda etapa, Chiquinho marcou o segundo com 12 minutos, praticando liquidando o jogo. No fim, aos 37 minutos, ainda houve tempo para Zico marcar de novo e decretar o 3 a 0 definitivo que classificava o Flamengo para fazer a final da Taça Libertadores da América de 1981.
Do time que havia atuado na estreia - Cantareli, Leandro, Marinho, Mozer e Júnior; Andrade, Vítor e Zico; Tita, Nunes e Baroninho - somente três peças mudaram durante a caminhada que assegurou a classificação à final. O goleiro Cantareli, após três partidas como titular, perdeu a posição para Raul. Na zaga central, Marinho se lesionou e acabou substituído por Rondinelli, que acabou também se lesionando, com a posição passando a ser ocupada pelo jovem Figueiredo, que a não perdeu mais até o fim. No meio, inicialmente jogavam Andrade e Vítor, depois passaram a jogar Vítor e Adílio, até por fim se chegar à formação definitiva com Andrade e Adílio. Somente estas três peças mudaram até ali. Para a final, uma mais viria ser modificada.
Cumprindo tabela, em 28 de outubro, uma quarta-feira, a partida derradeira no Maracanã. Era um amistoso de luxo. Apenas 7.520 torcedores compareceram. O Flamengo entrou com um time misto em campo. Raul, Leandro, Mozer e Zico foram poupados, preservados para a maratona de jogos que a equipe tinha pela frente. O time foi escalado com Cantareli, Nei Dias, Marinho, Figueiredo e Júnior; Andrade, Adílio e Tita; Chiquinho, Nunes e Baroninho. Os bolivianos ainda saíram na frente, com um gol marcado logo aos 2 minutos. Mas o time rubro-negro não teve dificuldade em virar, com gols de Nunes, Adílio, Anselmo e Chiquinho, goleando por 4 a 1. Agora era jogar a final!
O adversário chegava à final com grandes méritos. Era o Cobreloa, do Chile. Era um clube super jovem, que havia sido fundado apenas quatro anos antes, em 1977. Foi formado, e daí herdou o nome, pelo conglomerado da indústria do cobre, principal produto de exportação da economia chilena. Era da cidade de Calama, na província de Loa, região de Antofagasta, extremo norte do Chile. O nome do clube juntava o do produto que alimentava a atividade extrativista ao nome da província.
O clube empresa rapidamente cresceu no cenário futebolístico chileno, rico pelo capital do cobre. No seu segundo ano de existência, 1978, foi campeão da Copa Norte, chegando à 1ª divisão do futebol chileno. Em 1980 já conquistou o seu primeiro título nacional. Uma ascensão meteórica, facilitada pelos recursos empresariais que conseguiram viabilizar a contratação de alguns nomes importantes do cenário de futebol do país.
O Cobreloa fez uma campanha brilhante na Libertadores de 81. Na 1ª Fase venceu o grupo superando a Universidad de Chile, e os peruanos Sporting Cristal e Atlético Torino. Na 2º Fase, todos consideravam que seria o "patinho feio" num grupo contra os gigantes uruguaios, já que o Peñarol era até então 3 vezes campeão da Libertadores, e o Nacional era 2 vezes campeão, além de ser o detentor do título naquele momento, pois havia vencido o torneio em 1980.
O Cobreloa fez uma viagem brilhante a Montevidéu e mudou todas as expectativas já nesta passagem válida pelas duas primeiras rodadas do triangular semifinal. Venceu primeiro ao Nacional por 2 a 1, com seus gols marcados por Pueblo e Olivera, e depois ao Peñarol por 1 a 0, gol de Olivera. Depois, no Estádio Municipal de Calama, meteu 4 a 2 no Peñarol, com dois gols de Merello, e assegurou matematicamente a sua classificação à final. Grandes atuações que mostravam ser uma equipe aguerrida, taticamente bem organizada, e com jogadores que sabiam jogar um bom futebol. No último jogo, um amistoso de luxo, empatou por 2 a 2 com o Nacional.
Os jogadores do Flamengo se assustaram porque encontraram na final um clima de guerra. E foi mesmo. Aquela conquista representaria muito para o futebol do Chile. Era tão só a 3ª vez que uma equipe chilena chegava à final da Copa Libertadores. Em 1973, o Colo Colo havia perdido o título para o Independiente, da Argentina, mesmo adversário que havia superado ao Unión Española em 1975. Já atrás futebolisticamente na história perante Argentina, Uruguai e Brasil, o Chile ainda havia visto ao Peru, em 1975, e ao Paraguai, em 1979, serem campeões da Copa América. O país queria a todo custo lutar por seu espaço no futebol. Se o clima encontrado pelo Flamengo em 1981 quando foi jogar em Santiago foi bélico, foi até modesto perante o encontrado pelo Boca Juniors na semifinal de 1991, dez anos depois quando os chilenos enfim conquistariam a Libertadores pela primeira vez, com o Colo Colo. Na partida que ficou eternizada como a "Batalha de Macul", considerado um dos duelos mais sangrentos da história da Libertadores, oportunidade na qual, para intimidar os argentinos, o Colo Colo infiltrou torcedores disfarçados de fotógrafos e jornalistas dentro do campo de jogo. Quando a equipe chilena fez o terceiro gol, que lhe garantiria a classificação após uma derrota por 1 a 0 em Buenos Aires na primeira partida, estes torcedores disfarçados invadiram o campo e houve uma pancadaria generalizada. O goleiro colombiano do Boca Juniors, Navarro Montoya, que havia feito cera o jogo inteiro, partiu para a briga contra os invasores de campo, foi uma verdadeira batalha campal, na qual um cachorro da polícia, da raça pastor alemão, mordeu o glúteo direito de Montoya. O técnico argentino também foi agredido no meio da confusão. O quadro a ser enfrentado era verdadeiramente de guerra. A ordem era vencer ao preço que fosse. A equipe chilena tanto tinha qualidade que no ano seguinte voltou a chegar à final, tendo em 1982 perdido o título para o Peñarol. Foi a única equipe do Chile em todo o Século XX a ter chegado a duas finais consecutivas de Copa Libertadores.
No primeiro jogo, no Maracanã, o time chileno provou que sabia jogar futebol bem, vendendo caro a derrota. O primeiro jogo da final foi em 13 de novembro, uma sexta-feira. O mítico estádio no Rio de Janeiro recebeu mais de 94 mil pessoas, um público até considerado relativamente baixo frente ao que recebeu nas finais tanto de Campeonato Carioca como de Campeonato Brasileiro nos anos anteriores, mas foi o maior público da edição de 1981 da Libertadores. O time chileno era comandado pelo argentino Vicente Cantatore, e entrou em campo, no Maracanã, vestindo camisa branca, calção laranja e meias brancas. Estava escalado com: Wirth, Tabilo, Rojas, Soto e Escobar; Jiménez, Alarcón e Merello; Puebla, Siviero e Muñoz, estando desfalcado de seu principal atacante, o ponta-esquerda uruguaio Washington Olivera. Já o Flamengo, trajado com seu primeiro uniforme tradicional, tinha uma alteração frente à equipe que vinha atuando como titular na competição. Nas semanas anteriores à partida, Carpegiani havia efetivado Lico na ponta esquerda na vaga de Baroninho. Assim, a equipe rubro-negra entrou com a formação: Raul, Leandro, Figueiredo, Mozer e Júnior; Andrade, Adílio e Zico; Tita, Nunes e Lico. O time chileno nunca havia visto tanta gente junta ao mesmo tempo num estádio de futebol.
Como vinha fazendo em todos os jogos na reta final daquela campanha, o Flamengo não tardou em abrir a contagem. Logo com 12 minutos do 1º tempo, Zico marcou: Mengão 1 a 0! Aos 30 minutos, o time aumentou, novamente com Zico, desta vez cobrando pênalti. Um bom primeiro tempo do time flamenguista, com uma bela vantagem de 2 a 0 no placar na ida para o intervalo.
No segundo tempo o time tratou de administrar a vantagem, e viu os chilenos diminuírem logo aos 20 minutos, também convertendo um pênalti assinalado a seu favor. Foi um jogo duro, mas o Cobreloa não demonstrou força suficiente para uma reação que ameaçasse com a obtenção de um empate. Como não havia critérios de desempate, uma vitória chilena por qualquer placar na segunda partida, que seria disputada no Estádio Nacional, em Santiago, na capital chilena, já que o seu estádio em Calama havia sido vetado para a final, por não ter as dimensões mínimas estabelecidas pelo regulamento para a realização de uma final. O único impacto de um placar magro de 2 a 1, é que uma derrota na segunda partida implicaria numa vantagem do empate para o adversário no jogo desempate, mas ninguém no Brasil acreditava que o Flamengo perderia o segundo jogo.
A segunda partida, em Santiago, foi exatamente uma semana após a primeira, em 20 de novembro, outra sexta-feira. O treinador Vicente Cantatore mandou sua equipe a campo com duas modificações em relação à primeira partida, sacando Carlos Rojas da zaga e recuando Eduardo Jiménez, que havia atuado como primeiro volante de contenção no Maracanã, para atuar como zagueiro, e lançando Rubén Gómez, um jogador com maior poder de criação, no meio de campo. A outra foi o regresso do titular da posição, Olivera, no lado esquerdo de ataque. O Flamengo, que entrava em campo com seu segundo uniforme, com camisa e calção brancos, repetia exatamente a mesma equipe que havia iniciado a partida uma semana antes no Rio de Janeiro. O estádio estava lotado, recebendo 62 mil torcedores. Estava tudo pronto para o início daquela que foi uma verdadeira batalha.
O jogo era truncado e brigado. Logo aos 19 minutos do 1º tempo a primeira polêmica com aquele que se tornaria o personagem icônico daquele confronto. O capitão e camisa 4 do Cobreloa, Mario Soto, era um quarto-zagueiro que tinha tido uma passagem sem sucesso pelo futebol brasileiro, tendo defendido ao Palmeiras quatro anos antes, em 1977. O tempo de jogo marcava 19 minutos quando Adílio é lançado na área e Soto corre para disputar a bola com ele, deixando o braço levantado e aberto, com seu cotovelo acertando o supercílio direito do camisa 8 rubro-negro, que fica caído no chão enquanto o jogo segue. O jogador rubro-negro se levanta com o supercílio cortado, sangrando, e precisa sair de campo para tomar pontos e continuar em campo. Aos 26 minutos, o lance mais mítico daquela noite. Numa dividida no meio de campo, Mario Soto, novamente ele, vai com o cotovelo a frente do corpo e acerta o olho de Lico, que dali em diante jogaria com o olho roxo. Estes dois lances, em Adílio e Lico, geraram o folclore de um objeto pontiagudo sendo usado por Soto para as agressões. Ele sempre negou o uso de qual objeto, pedra ou anel. Pelas imagens da televisão, de fato, a impressão é que em ambas as oportunidades a "arma" utilizada foi o cotovelo. Desta vez, tanto Soto quanto Lico receberam cartão amarelo.
De futebol, as três oportunidades claras de gol na primeira etapa foram todas dos chilenos, em lances dentro da área salvos no último instante duas vezes por Mozer e uma por Júnior. No segundo tempo, sem que um gol saísse, os nervos foram se acirrando cada vez mais. O cenário seguia o mesmo. Pressão total do Cobreloa. Na única vez que conseguiu escapar ao ataque, Zico entraria frente a frente ao goleiro Wirth, mas o assistente marcou um impedimento absurdo e absolutamente inexistente!
O impedimento absurdamente assinalado, há três jogadores a frente de Zico
Aos 29 minutos do 2º tempo, mais agressões. Júnior sofre falta e cai no chão, e ao passar por ele Puebla pisa propositalmente em sua perna. Muita discussão. Neste momento Baroninho entra no lugar de Lico, que jogava com o olho roxo e inchado pela agressão sofrida por Mario Soto. Muita discussão à beira de campo, policiais com cachorros latindo, muito barulho nas arquibancadas. Era uma pressão extracampo imensa! O capítulo final daquela noite seria selado aos 34 minutos do 2º tempo: falta para o Cobreloa, que o camisa 8 Victor Merello cobra com força em direção ao gol, Leandro tenta tirar de cabeça, a bola resvala nele e se desvia das mãos de Raul, estufando a rede. Enquanto os jogadores comemoravam, um jornalista invade o campo e agride um jogador rubro-negro dentro da pequena área, que revisa com um soco, deixando o chileno estirado no chão. O clima de guerra perdurou até o fim, até o árbitro uruguaio apitar encerrando o confronto com um ' a 0 a favor do Cobreloa. A decisão seria em campo neutro, a ser jogada três dias depois em solo uruguaio, e o Cobreloa tinha a vantagem do empate na partida desempate para se sagrar campeão.
A decisão definitiva foi em 23 de novembro, uma segunda-feira. Para a partida decisiva, no Estádio Centenário, em Montevidéu, o técnico da equipe chilena fez uma substituição frente aos onze que tinha iniciado em Santiago, tirando seu camisa 10 Rubén Gómez, voltando a deslocar Jiménez para fazer a contenção do meio de campo, e entrando com o zagueiro Juan Páez, que ainda não havia entrado em campo naquela série final, para fazer a dupla com Mário Soto. O Flamengo também foi forçado a fazer uma substituição, em função do edema no olho pela agressão sofrida em Santiago, Lico não pode ir a campo, com Carpegiani improvisando: lançou o lateral-direito reserva Nei Dias, avançou Leandro para fazer a contenção pelo lado direito no meio de campo, e moveu Adílio para jogar pela ponta-esquerda. Assim, o time entrou em campo com: Raul, Nei Dias, Figueiredo, Mozer e Júnior; Andrade, Leandro e Zico; Tita, Nunes e Adílio. Era um 4-3-3 que praticamente funcionava como um 4-4-2, e em alguns momentos até como um 4-5-1.
Não houve combinação de uniformes em nenhuma das três partidas da final. Para o jogo derradeiro, o Flamengo entrou com suas cores tradicionais, uniforme que havia utilizado na primeira partida da decisão, e o Cobreloa jogou todo de laranja, uniforme que utilizou no segundo jogo. De repetitivo, apenas, o hábito rubro-negro na reta final daquela Libertadores de sempre decidir rápido. Na 2ª fase, havia aberto o marcador aos 10 minutos contra o Deportivo Cali na Colômbia, aos contra o Jorge Wilstermann na Bolívia, e novamente aos 10 contra o Deportivo no Maracanã. No primeiro jogo da final, no Rio de Janeiro, fez seu primeiro gol aos 12 minutos. Em Montevidéu, para o desempate, abriu o marcador com Zico aos 18 minutos, quanto o camisa 10 da Gávea aproveitou sobra de bola após troca de passes dentro da grande área.
Melhor em campo, sem dar muitas margens de reação ao rival, o gol que sacramentou definitivamente o título saiu com Zico cobrando falta na entrada da área com perfeição, sem chance de reação para Wirth, aos 32 minutos do 2º tempo. Flamengo 2 a 0! Flamengo Campeã da América! Sem margens para qualquer contestação! E para fechar, o capítulo final, não honroso, o ato de vingança. Atravessado com as agressões de Mario Soto na partida disputada em Santiago, Paulo César Carpegiani chamou o jovem Anselmo, garoto recém promovido da base, cuja única participação até então naquela Libertadores tinha sido entrando no segundo tempo no amistoso de luxo contra o Wilstermann no Maracanã. Aos 42 minutos do 2º tempo, ao camisa 25 só lhe foi dada uma ordem: soco no Mario Soto! Ele entrou no lugar de Nunes, deu o soco, foi expulso, ficou apenas trinta segundos em campo, teve que correr dos jogadores chilenos enquanto deixava o campo de jogo para não ser agredido. Acabou saindo escoltado pelos braços por dois policiais uruguaios. A parada estava sacramentada. No agregado da finalíssima, 4 a 2 em favor do time rubro-negro, com Zico tendo sido o autor dos quatro gols da final! Flamengo, Campeão da Copa Libertadores da América de 1981!






























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