quinta-feira, 15 de agosto de 2019

Após 6 anos de reestruturação, chegou a hora do FLAMENGO se impor


Hora de fazer a tradicional avaliação financeira sobre a publicação dos Balanços dos clubes do futebol brasileiro. Excepecional mais uma vez o trabalho publicado por Rodrigo Capelo, antes publicando na Revista Época e passando a levar seu blog ao GloboEsporte.com. Abaixo, é feito um resumo dos principais pontos publicados na sequência de artigos do Rodrigo Capelo publicados nos dias 11 e 12 de julho de 2019: EIS ABAIXO A ANÁLISE ESPECÍFICA DOS NÚMEROS DO FLAMENGO, publicada em 19 de julho. 


Rodolfo Landim herdou um clube com receitas em alta, dívidas controladas e R$ 100 milhões para investir – e decidiu ser ainda mais agressivo. Será possível bancar tanto investimento?

Rodolfo Landim se elegeu presidente do Flamengo em dezembro com uma aura, digamos, para lá de arriscada. Em oposição a uma diretoria que ficou marcada por ter feito uma excelente porém pouco vitoriosa administração, a de Eduardo Bandeira de Mello, a chapa de Rodolfo levou a campanha adiante como aquela que finalmente daria títulos ao clube rubro-negro. "Din, din, din, campeão é o Landim" era o canto da torcida pessoal do candidato no dia da eleição. Personificar o dirigente vitorioso antes mesmo de sê-lo representa um risco para qualquer um. Nada garante títulos. A felicidade de Landim, pelo menos, é que dinheiro para aumentar a probabilidade há.

Raridade na história do futebol brasileiro em geral, Bandeira de Mello entregou para Landim um clube com R$ 100 milhões separados para investimentos em jogadores – de acordo com o orçamento feito ainda pela diretoria antiga para a temporada seguinte. A previsão só pôde contar com uma cifra tão expressiva porque, depois de seis anos de reestruturação administrativa e financeira, o endividamento foi controlado e as fontes de receita foram todas ampliadas. Paquetá ainda foi vendido, com a maior parte do valor a receber só em 2019.

A nova diretoria foi ao mercado de transferências com uma agressividade maior do que a anterior, até porque nunca teve tanto dinheiro quanto agora. Landim tirou jovens talentos de adversários diretos, como Arrascaeta, Bruno Henrique e Rodrigo Caio, trouxe Gabigol por empréstimo da Inter de Milão, e mais recentemente comprou da Roma os direitos federativos de Gerson. De modo que a pergunta passa a ser outra, sobre as finanças: não há risco de desarrumar as contas com tantas contratações?

A relação entre receitas e dívidas do Flamengo


A relação entre faturamento e endividamento no Flamengo estava saudável até o ano passado, com mais dinheiro para entrar do que compromissos a pagar. É importante colocar um asterisco na receita, que aparenta ter levado um tropeço, mas na verdade está menor do que o valor arrecadado por uma questão contábil. Paquetá foi vendido para o Milan e terá a sua transferência inteiramente registrada em 2019, mas R$ 21 milhões foram recebidos ainda no segundo semestre de 2018.

Nas outras receitas, o clube carioca leva a melhor na comparação com adversários em quase todas elas. O faturamento com televisão é o maior do país. O departamento comercial também gerou a maior renda – na soma de patrocinadores do futebol, patrocínios incentivados e licenciamentos. Maior até do que o Palmeiras, que ganha na camisa com a Crefisa, mas perde no fornecedor e nos licenciamentos.

Num ano marcado por dificuldades no relacionamento com a Odebrecht, então concessionária do Maracanã, receitas diretamente ligadas aos torcedores caíram em relação ao ano anterior. Ainda que o programa de sócios torcedores tenha melhorado seu desempenho financeiro, e que o quadro social tenha se mantido praticamente no mesmo valor, a redução de quase R$ 20 milhões na renda com bilheterias prejudicou. Mesmo assim, só o Palmeiras faz mais dinheiro do que o Flamengo nesta área. Ambos disputam o topo em quase tudo.


Mesmo tendo os seus primeiros grandes investimentos em 2018, como a compra de Vitinho por um valor que até aquele momento era recorde na história rubro-negra, o Flamengo manteve custos muito abaixo de suas receitas durante a temporada. Basta ver que a folha salarial do futebol profissional era apenas a quarta maior do país. A diretoria vinha operando com cuidado pois ainda tinha de gerar sobras para pagar dívidas do passado. Entre 2014 e 2018 foram registrados mais de meio bilhão de reais em superavit, sinal mais claro de que a relação receitas-despesas esteve ajustada durante esse tempo todo.

O resultado mais claro desta filosofia está na redução do endividamento flamenguista. O valor bruto ficou estável na casa dos R$ 450 milhões devidos, e na realidade ele nem precisaria baixar mais do que isso para ser considerado saudável. Mais de 65% deste valor correspondem a impostos não pagos no passado e estão equacionados pelo Profut, de modo que basta manter os pagamentos de suas parcelas em dia para não ter de se preocupar com eles. Empréstimos bancários foram reduzidos, dívidas trabalhistas baixaram muito. Nada grave sobrou.

O Flamengo chegou àquele momento tão aguardado desta década em que fará dívidas, sim, com as contratações de jogadores para reforçar seu futebol. É preciso lembrar que jogadores comprados nunca são pagos à vista. Os desembolsos para a compra de seus direitos federativos e econômicos são parcelados, portanto representam dívidas no sentido mais literal da palavra. Eles estão classificados nos gráficos abaixo como "outros", junto de dívidas com fornecedores e agentes.


A esta altura do campeonato, precisamos extrapolar um pouco a base que temos como referência para todo o estudo sobre as finanças dos clubes. Uma vez que o Flamengo publica demonstrações financeiras trimestrais, e a referente ao primeiro trimestre de 2019 já está disponível, temos dados suficientes para ter uma noção do risco assumido pela nova direção nesta temporada em andamento.

A linha do endividamento que interessa neste caso é a das "contas a pagar na transferência de jogadores". Em 31 de dezembro de 2018, havia R$ 43 milhões a pagar por jogadores contratados até aquela data, sendo Vitinho o responsável pela maior parte. Esta dívida aumentou consideravelmente após as primeiras contratações da nova temporada. Com Arrascaeta, Bruno Henrique e Rodrigo Caio, esta linha passou para R$ 114 milhões em 31 de março de 2019. Gabigol não está incluído nesta dívida porque, emprestado, não houve compra de seus direitos.

Se o torcedor considerar que recentemente o Flamengo também comprou Gerson por R$ 50 milhões, da Roma, e ainda o zagueiro espanhol Pablo Marí por quantia não divulgada oficialmente, o investimento em atletas com certeza passou dos R$ 160 milhões.

A pergunta é: dá para bancar esse investimento? E a resposta, para alguém que não trabalha no departamento financeiro rubro-negro e se baseia em balanços, provavelmente é "sim". O orçamento projetava R$ 100 milhões para investimentos em jogadores, então, desde que se cumpra a previsão, receitas cobrirão a maior parte. O restante pode ser pago de dois modos. Se o Flamengo fizera alguma receita não prevista, como a venda de um jogador, ou se pegar dinheiro emprestado com instituições financeiras. Hoje o clube tem credibilidade para conseguir crédito com taxas mais baixas e condições facilitadas.

Depois de seis anos de reestruturação, nas mãos dos aliados de Eduardo Bandeira de Mello, o Flamengo começou a impor a sua capacidade financeira pelas mãos de Rodolfo Landim. Ao mesmo tempo em que a nova diretoria precisa ter a cabeça no lugar para não por o legado em risco, não há sinal de que esteja assumindo compromissos impagáveis.

Coisas que pareciam impossíveis há seis anos hoje têm sido feitas pelo Flamengo: a contratação de um técnico estrangeiro de primeira linha, a chegada por um zagueiro europeu, a competição financeira com clubes de porte intermediário da Europa por jogadores. Só faltará a Landim conquistar, enfim, os títulos que a sua campanha prometeu.


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