Quem inventou as torcidas organizadas foi o flamenguista, como bom baiano, amante dois festejos, Jaime de Carvalho, com sua Charanga Rubro-Negra. Foi Jaime o responsável por levar instrumentos rítmicos para as arquibancadas de futebol, casando o samba e o futebol e dando um toque popular e carnavalesco. Mário Filho, dono do Jornal dos Sports, teve um papel fundamental de incentivador da criação de Jaime de Carvalho. O Jornal dos Sports, para estimular a festividade no futebol, criou um concurso de torcidas e marchinhas alusivas ao futebol. Daí oficializou-se no Rio de Janeiro a figura do "chefe de torcida". No Flamengo era Jaime de Carvalho, Tarzã era o do Botafogo, Dulce Rosalina a do Vasco e Paulista o do Fluminense.
O futebol nasceu como esporte da elite, e era comum até os anos quarenta ir ao estádio vestindo terno ou, ao menos, paletó. A Charanga foi quem introduziu as camisas de clube na arquibancada, e isto logo virou costume. No início, a Charanga sofreu muitas críticas, pois a consideravam barulhenta (mescla de fanfarra e batucada) e inapropriada para um espetáculo. Esperava-se um público mais comportado. Mas sempre houve brigas nas arquibancadas. Já em 1924, por exemplo, houve um grande conflito entre torcedores de Flamengo e Vasco durante um jogo nas Larajeiras. Também foi se tornando cada vez mais comum os palavrões. Muito por conta disso, a Charanga aos poucos passou a ser vista com melhores olhos, pois entretenia o público e abafava as grosserias.
Jaime e a Charanga fizeram tanto sucesso que o criador da torcida organizada foi convocado para ser o organizador oficial da festa dos torcedores durante a Copa do Mundo de 1950. Em 1954, acampanhou a delegação brasileira na Copa do Mundo da Suíça. Sua influência foi tanta que, 20 anos depois, estava lá ele na delegação brasileira que foi à Copa do Mundo da Alemanha. Jaime foi um inovador. Baiano e flamenguista.
A segunda torcida organizada no futebol surgiu só em 1967 e também foi rubro-negra, como uma dissidência dentro da Charanga. Naquele ano, Jaime de Carvalho se afastou das arquibancadas por problemas de saúde. No tempo em que esteve afastado surgiu a torcida Poder Jovem. A principal alegação era protestar contra o time quando este estivesse jogando mal, coisa que Jaime de Carvalho não aceitava, pois para ele torcedor tinha só que apoiar, incondicionalmente. A militância jovem dos anos 60, sobretudo européia, foi grande incentivadora. O movimento se repetiu no Fluminense, cuja torcida, em 1968, criou a Young Flu e a Força Flu. Em 1969, a Poder Jovem mudou de nome e passou a se chamar Torcida Jovem do Flamengo. Os Movimentos Estadantis de 1968 foram os grandes incentivadores destas torcidas, agora com um espírito mais de protesto, mas ainda sem perder os ares carnavalescos.
Os anos 70, ápice dos grandes públicos no Maracanã, trouxeram a criação de uma grande quantidade de torcidas organizadas. No Flamengo surgiram a Flamante, a Flaroflafla, a Fla 12, a FlaChopp e a FlaPonte, todas elas criadas entre 1970 e 1976, e que se mantiveram vivas até finais da década de 1980.
Em 1977 é criada a Raça Rubro-Negra, que rapidamente se torna a maior torcida organizada do Flamengo. Depois em 1981 foi criada a Falange Rubro-Negra, que também cresceu rápido. Essa em especial já antecipava as mudanças que vinham ocorrendo por trás das torcidas organizadas, pois fazia apologia a uma das maiores organizações criminosas da cidade, a Falange Vermelha, que disputava com o Comando Vermelho os pontes de vendas de drogas ilícitas na cidade.
Os anos 80 foram marcantes na transformação e no aumento da violência nas arquibancadas de futebol. No Rio de Janeiro, em especial, pela grave crise política e econômica pela qual passava a cidade (assunto tratado em A NAÇÃO). Durante muito tempo Raça Rubro-Negra e Torcida Jovem passam não só a brigar com as principais torcidas rivais (Força Jovem do Vasco, Young Flu e Torcida Jovem do Botafogo) como a se degladiarem entre si.
"Desde a construção do estádio já foi estabelecida a divisão das torcidas. À esquerda das cabines de rádio, a área era cativa para as torcidas do Flamengo e do Fluminense, sendo que em dia de Fla-Flu, os tricolores ficavam ao lado direito das cabines, área cativa para as torcidas de Vasco e Botafogo. Este último, assim como os tricolores que mudavam de lado nos Fla-Flus, nos dias de confronto contra o time cruzmaltino passava para o lado esquerdo das cabines. Desde os primórdios do estádio, isto funcionou assim.
No lado oposto ao das cadeiras especiais ficava a área onde as torcidas se encontravam. Até os anos 70, ali sequer tinha divisão, sendo comum ser uma área mista, na qual torcedores com as camisas de clubes rivais assistiam aos jogos lado a lado. Brigas eram coisas pontuais, entre dois torcedores que se haviam desentendido por qualquer razão, muitas vezes entre os que vestiam camisa de mesmo time, mas não haviam gostado de um comentário ou outro, ou por qualquer razão estúpida que levasse um a desferir um tapa em outro.
Nos anos 80, começaram a aumentar os conflitos entre torcidas rivais, então se forçou a colocação de uma divisória humana composta por policiais enfileirados verticalmente desde a parte superior da arquibancada até a inferior. Porém, o clima ainda era bastante pacífico nos jogos de futebol. As tardes de domingo rumo ao Maracanã ainda eram mágicas para a criançada que começava a curtir as idas ao estádio. Havia dois corredores principais pelos quais escoavam os veículos levando torcedores para ver jogos de futebol. A rua Marechal Rondon trazia carros e ônibus com torcida vinda da Zona Norte e do subúrbio. O elevado Paulo de Frontin, sobreposto desde a saída do túnel Rebouças, levava a torcida oriunda da Zona Sul. Por estes dois corredores eram vistas bandeiras estiradas nas janelas de edifícios. Os carros, em grande quantidade, exibiam bandeiras pelas janelas. Os ônibus iam lotados de torcedores rivais, todos devidamente uniformizados. Era uma festa de cores e alegria. Todos seguiam para o templo do futebol. Os carros com gente vestida com a camisa do clube de coração trocavam buzinadas provocativas e piadas com outros, guiados por quem usava camisa do rival. As provocações também fluíam alegremente entre carros e ônibus. Não havia ódio ao torcedor rival, muito menos clima de guerra. Não havia o espírito de humilhar o adversário. Eram minoria absoluta as manifestações que não esbanjassem alegria e confraternização. O problema é que o que era exceção foi aumentando e se tornando rotina. Isto gerou grandes mudanças para o futebol, e a principal delas foi o efeito de esvaziamento nos estádios. Se bastava uma fileira de policiais para separar as torcidas rivais e minimizar conflitos dentro do estádio, na saída dos grandes clássicos a preocupação costumava ser ainda menor. O escoamento das torcidas pela rampa externa era conjunto. Os torcedores se encontravam na saída dos anéis, no alto da rampa. A torcida derrotada, naturalmente, mais cabisbaixa, e a vencedora ecoando cantos de vitória. A preocupação dos policiais do lado de fora do estádio se limitava a conter os batedores de carteiras, que aproveitavam para agir em meio ao grande aglomerado de gente. Com o passar dos anos, a fileira de guardas já se fazia insuficiente para evitar os conflitos. Deu-se para atirar coisas de uma torcida à outra. Criaram-se duas fileiras, com um espaço vazio no meio. Depois de mais alguns anos, já não se podia sair do estádio civilizadamente. A prática imbecil de se atacar os rivais se impôs e a polícia foi obrigada a fazer com que cada torcida saísse por um dos lados do estádio, em rampas diferentes. Durante todo este processo de brutalização, famílias no estádio foram se tornando fato raro. Era mais prudente deixar as crianças para torcer pela televisão ou pelo rádio. No final dos anos 80, se deu o caldeirão de onde emergiram as primeiras mudanças do clima do estádio que marcariam para sempre a ida a um jogo de futebol e as formas de torcer pelo clube do coração". (A NAÇÃO, pgs. 150-152)
No lado oposto ao das cadeiras especiais ficava a área onde as torcidas se encontravam. Até os anos 70, ali sequer tinha divisão, sendo comum ser uma área mista, na qual torcedores com as camisas de clubes rivais assistiam aos jogos lado a lado. Brigas eram coisas pontuais, entre dois torcedores que se haviam desentendido por qualquer razão, muitas vezes entre os que vestiam camisa de mesmo time, mas não haviam gostado de um comentário ou outro, ou por qualquer razão estúpida que levasse um a desferir um tapa em outro.
Nos anos 80, começaram a aumentar os conflitos entre torcidas rivais, então se forçou a colocação de uma divisória humana composta por policiais enfileirados verticalmente desde a parte superior da arquibancada até a inferior. Porém, o clima ainda era bastante pacífico nos jogos de futebol. As tardes de domingo rumo ao Maracanã ainda eram mágicas para a criançada que começava a curtir as idas ao estádio. Havia dois corredores principais pelos quais escoavam os veículos levando torcedores para ver jogos de futebol. A rua Marechal Rondon trazia carros e ônibus com torcida vinda da Zona Norte e do subúrbio. O elevado Paulo de Frontin, sobreposto desde a saída do túnel Rebouças, levava a torcida oriunda da Zona Sul. Por estes dois corredores eram vistas bandeiras estiradas nas janelas de edifícios. Os carros, em grande quantidade, exibiam bandeiras pelas janelas. Os ônibus iam lotados de torcedores rivais, todos devidamente uniformizados. Era uma festa de cores e alegria. Todos seguiam para o templo do futebol. Os carros com gente vestida com a camisa do clube de coração trocavam buzinadas provocativas e piadas com outros, guiados por quem usava camisa do rival. As provocações também fluíam alegremente entre carros e ônibus. Não havia ódio ao torcedor rival, muito menos clima de guerra. Não havia o espírito de humilhar o adversário. Eram minoria absoluta as manifestações que não esbanjassem alegria e confraternização. O problema é que o que era exceção foi aumentando e se tornando rotina. Isto gerou grandes mudanças para o futebol, e a principal delas foi o efeito de esvaziamento nos estádios. Se bastava uma fileira de policiais para separar as torcidas rivais e minimizar conflitos dentro do estádio, na saída dos grandes clássicos a preocupação costumava ser ainda menor. O escoamento das torcidas pela rampa externa era conjunto. Os torcedores se encontravam na saída dos anéis, no alto da rampa. A torcida derrotada, naturalmente, mais cabisbaixa, e a vencedora ecoando cantos de vitória. A preocupação dos policiais do lado de fora do estádio se limitava a conter os batedores de carteiras, que aproveitavam para agir em meio ao grande aglomerado de gente. Com o passar dos anos, a fileira de guardas já se fazia insuficiente para evitar os conflitos. Deu-se para atirar coisas de uma torcida à outra. Criaram-se duas fileiras, com um espaço vazio no meio. Depois de mais alguns anos, já não se podia sair do estádio civilizadamente. A prática imbecil de se atacar os rivais se impôs e a polícia foi obrigada a fazer com que cada torcida saísse por um dos lados do estádio, em rampas diferentes. Durante todo este processo de brutalização, famílias no estádio foram se tornando fato raro. Era mais prudente deixar as crianças para torcer pela televisão ou pelo rádio. No final dos anos 80, se deu o caldeirão de onde emergiram as primeiras mudanças do clima do estádio que marcariam para sempre a ida a um jogo de futebol e as formas de torcer pelo clube do coração". (A NAÇÃO, pgs. 150-152)
Depois surgiram a FlaManguaça e a Paixão Rubro-Negra, mas o que se transformaria num marco na tentativa de mudar o cenário de violência nos estádio foi a criação da Urubuzada, em 2006. Um novo movimento que tenta voltar a trazer uma melodia mais sofisticada para o estádio de futebol, e ainda adotando uma filosofia mais alinhada à das torcidas da Argentina, numa linha de apoio incondicional ao time (como era defendido por Jaime de Carvalho).
...... sem comentário ......
ResponderExcluirmuito bom
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